O sucessor de Paulo Pimenta terá pela frente uma tarefa hercúlea quando assumir o posto do ministro: estabelecer um comando único na Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) e dar uma cara para a comunicação do governo. Segundo fontes ouvidas por Fabio Murakawa e Renan Truffi, do jornal Valor, a pouca ascendência do titular da pasta sobre seus secretários está no cerne dos problemas na comunicação do governo. Mas há também críticas à condução de Pimenta. E a percepção de que o presidente Lula da Silva (PT) tem dado pouca prioridade à comunicação, concentrando-se em temas de gestão e articulação política – o que também afetou o desempenho do governo nesta área.
Dos sete secretários da Secom, quatro têm fortes vínculos com Lula ou a primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, com acesso direto aos gabinetes de ambos. Dentro do Palácio do Planalto, onde funciona a Secretaria Especial, a força desses integrantes do segundo escalão é argumento usado tanto para isentar Pimenta de culpa pela falta de articulação na comunicação do governo como para criticá-lo.
De um lado, fontes afirmam que alguns desses secretários, ao mesmo tempo em que atuam como funcionários da Secom, acabam exercendo tarefas que deveriam ser atribuições de integrantes do gabinete de Lula. Essa confusão acaba, muitas vezes, atrapalhando o fluxo de trabalho no órgão.
Por outro lado, críticos afirmam que Pimenta evitou demasiadamente entrar em “bolas divididas” com seus subordinados. E que, por ser tão próximo a Lula quanto eles, poderia, sim, ter tentado colocar ordem na casa, tomado as rédeas e dado um rumo para a pasta.
Alguns atribuem isso ao histórico de Pimenta, um político de carreira sem vinculação direta com a comunicação. Assim, ganha força a hipótese de ele ser substituído por um profissional da área. O fato de Lula ser considerado um “comunicador nato”, dizem aliados, já não basta para garantir uma comunicação efetiva para sua gestão.
Pimenta foi responsável direto pela nomeação de apenas dois de seus secretários: Roberto Zamora, seu secretário-executivo, e Fabrício Carbonel, secretário de Publicidade e Patrocínios.
O ministro atua muitas vezes como um interlocutor do presidente junto à imprensa, concedendo entrevistas ou externando posicionamentos do Planalto sobre variadas questões. Mas tem pouco ou nenhum poder para opinar sobre as contas pessoais de Lula nas redes sociais, por exemplo. Tampouco tem influência sobre as redes institucionais do Planalto e a articulação entre a Secom e as assessorias de comunicação dos demais 37 ministérios do governo Lula 3.
Um caso extraordinário nesse imbróglio é o do secretário de Políticas Digitais da Secom. Responsável pela interlocução com o Congresso na elaboração de legislações de Comunicações, João Brant deveria estar vinculado ao Ministério das Comunicações. Mas acabou abrigado na Secom, segundo fontes, para poder desenvolver seu trabalho livre da influência de Juscelino Filho – um deputado licenciado do União Brasil – no Ministério das Comunicações, onde a pasta deveria, de fato, funcionar.
Pouca influência do titular da pasta sobre secretários está no cerne dos problemas
Benquisto e elogiado por todos, ele é o único dos sete subordinados diretos de Pimenta que está alheio à disputa que ocorre atualmente na Secom. Com os demais secretários, o quadro é outro.
O jornalista José Chrispiniano comanda a Secretaria de Imprensa (SIP) e acompanha Lula desde 2011, quando o petista deixou o poder. À frente da comunicação do Instituto Lula, Chrispiniano esteve ao lado dele em todos os seus altos e baixos nos últimos 13 anos – da prisão em Curitiba, em 2018, à subida da rampa do Planalto, em 2023. Além do atendimento à imprensa, controla o Twitter de Lula, que na prática substitui a extinta figura do porta-voz do presidente.
Também jornalista, Laércio Portela está à frente da Secretaria de Comunicação Institucional (Secoi). Foi colocado no posto por Lula, depois de ter substituído Pimenta na Secom enquanto o ministro estava à frente da Secretaria Extraordinária para o Rio Grande do Sul. É o responsável pela articulação entre a Secom e as assessorias de comunicação dos ministérios.
Portela foi secretário de Imprensa da Secom no governo Lula 2, na equipe de Franklin Martins. Seu trabalho em substituição a Pimenta ganhou elogios pela capacidade de organização e, segundo relatos, agradou ao presidente. Ele é tido como um dos cotados para suceder Pimenta, desta vez de maneira efetiva.
O fotógrafo Ricardo Stuckert, por sua vez, está à frente da Secretaria de Produção e Divulgação de Conteúdo
Audiovisual. De todos, é o mais antigo parceiro de Lula, a quem acompanha desde 2003. Assim como Chrispiniano, Stuckert está sempre presente nas viagens oficiais de Lula e se equilibra entre as iniciativas audiovisuais da Secom e a tarefa de ser fotógrafo pessoal do petista. Ele tem a senha do Instagram pessoal do presidente.
Já Brunna Rosa, na Secretaria de Estratégias e Redes, controla as contas institucionais do governo, como a SecomVc, além de fazer o monitoramento das redes sociais para o Planalto. Chegou ao cargo após coordenar as redes na campanha de Lula em 2022, quando estabeleceu forte vínculo com Janja.
A exemplo de Laércio Portela, Brunna integrou a equipe de Franklin Martins no Lula 2. E esteve com o hoje companheiro de Secom na campanha que reelegeu Hugo Chávez em 2012, meses antes de o líder venezuelano morrer. Aliados da secretária rechaçam os rumores de que foi colocada no posto pela primeira-dama, apesar de admitirem que as duas hoje são muito próximas.
Nenhum desses quatro secretários se reporta diretamente a Pimenta, embora tampouco tenham problemas graves de relacionamento com o ministro, segundo as fontes que o Valor ouviu. Mesmo assim, a falta de coordenação e diálogo entre os diversos órgãos da Secom é vista como um problema sério dentro e fora do Planalto.
Lula tem dado pouca prioridade à comunicação, focando na gestão e articulação
Ela dificulta, por exemplo, a tarefa do governo de imprimir uma marca própria ou divulgar seus feitos de maneira sincronizada e estratégica. Existe ainda a avaliação de que a fala de Lula em um seminário do PT no qual fez um mea culpa pelos problemas de comunicação do governo tenha se referido, ao menos em parte, a isso. Foi após essa fala que os rumores de que Pimenta cairia aumentaram.
Outras fontes dizem acreditar que o pano de fundo da fritura de Pimenta é a disputa pelo controle do Orçamento da Secom, que é de pouco mais de R$ 626 milhões, além do controle da EBC – estatal com um orçamento de R$ 889,7 milhões. Também há a percepção de que as críticas partem de setores do PT, no sentido de que a comunicação do governo deveria reproduzir estratégias da campanha de 2022. Mas fontes da Secom alegam que, no governo, há limitações legais que tornam isso impossível.
Tido como um ministro com os dias contados na Secom, Pimenta sobrevive no cargo enquanto o petista se recupera em São Paulo, depois de passar por uma cirurgia na cabeça para drenar um sangramento entre o cérebro e o crânio, decorrente de uma queda no banheiro do Palácio da Alvorada em outubro.
O mais cotado para assumir a Secom é o publicitário Sidônio Palmeira, que teria que se desvencilhar de negócios particulares para atender ao chamado do presidente. Interlocutores de Lula creem que, apesar dos entraves, Sidônio não terá como recusar o convite.
Fontes petistas afirmam ainda que pessoas ligadas a Sidônio têm conflitos com Chrispiniano, Stuckert e Brunna que vêm desde a campanha presidencial, por desavenças na condução da comunicação. Esse é um nó que ele terá que desatar, caso efetivamente assuma o posto de Pimenta.
Porém há dúvidas se o novo ministro terá carta branca para montar a própria equipe e, assim, se livrar dos “problemas de origem” da montagem de Secom, que surgiram ainda na época da transição de governo.
O entorno de Pimenta, por sua vez, ainda nutre remotas esperanças de que o ministro possa permanecer no posto. Ele é cotado para ocupar a Secretaria-Geral, cujo titular hoje é Márcio Macêdo, o que significaria sua permanência no Palácio do Planalto e no círculo mais próximo de Lula.
Outra alternativa aventada é a liderança do governo na Câmara, já que é deputado licenciado pelo Rio Grande do Sul. Essa última possibilidade, porém, representaria um rebaixamento para um ministro, que até hoje vem sendo considerado como um dos mais próximos do presidente.
Janja negou, em nota ao Valor, ter qualquer ingerência sobre a comunicação do governo. Procurados, os demais citados não quiseram se pronunciar oficialmente.