Sem conseguir uma base coesa no Congresso após dois anos de mandato, o presidente Lula da Silva (PT) deverá enfrentar um cenário de ainda mais obstáculos em 2025 caso acordos costurados para a eleição de novos líderes partidários se confirmem. Siglas que fazem parte do governo, como União Brasil, Republicanos e PP, caminham segundo Lauriberto Pompeu, do O Globo, para escolher na Câmara dos Deputados nomes com histórico de embates com o Palácio do Planalto a partir do ano que vem. Além disso, ainda de acordo com o colunista, duas das principais bancadas da Casa, a ruralista e a evangélica, devem ter opositores à frente.
Essas trocas nas lideranças têm o potencial para atrapalhar a articulação política do governo. No União Brasil, por exemplo, a saída de Elmar Nascimento da liderança da bancada, a partir de fevereiro, deve levar o partido a adotar um tom mais duro contra o Palácio do Planalto. Apesar de a sigla ter três integrantes da legenda com ministérios, o têm visto com insatisfação a aproximação do atual líder com o governo. Os deputados Mendonça Filho (PE), Pedro Lucas Fernandes (MA) e Damião Feliciano (PB) disputam a preferência dos colegas para assumir o posto.
O União tentou eleger o novo líder na semana passada, mas a disputa envolvendo a ala oposicionista e a que prega algum nível de diálogo com o governo fez com que a definição fosse adiada para fevereiro.
Mendonça é crítico do governo e já causou dor de cabeça ao Planalto em pelo menos duas ocasiões. Com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita a atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), da qual é autor, e na tramitação do projeto que muda o novo Ensino Médio. O parlamentar, que foi ministro da Educação no governo Temer, chegou a discutir aos gritos com o atual titular da pasta, Camilo Santana, sobre o texto.
Pragmatismo
Já Pedro Lucas é considerado da ala mais pragmática, sem um alinhamento automático com qualquer um dos lados. O deputado é próximo do presidente do União, Antonio Rueda, que tem pregado um afastamento do governo e pretende lançar uma candidatura de oposição a Lula em 2026. Ao lado de Damião Feliciano, porém, Lucas sofre resistências na bancada por ser da ala que tem mais diálogo com o governo.
Diante da possibilidade de Mendonça ser escolhido líder, visto que o deputado passou a acumular apoios significativos dentro da bancada, o governo acionou os ministros indicados pela legenda para atuar pelo adiamento da eleição. O ministro do Turismo, Celso Sabino, e o das Comunicações, Juscelino Filho, participaram da reunião do partido marcada para escolher o novo líder e fizeram parte da articulação para postergar a escolha.
— Pode ser qualquer um, tem que sentar e organizar o jogo, não estou restringindo ninguém. A minha única preocupação é deixar o partido unido. Se é direita, se é esquerda, para mim não importa. Tenho preferência por um perfil de consenso — disse Rueda.
O cenário é parecido no Republicanos, cujo atual líder, Hugo Motta (PB), deve ser alçado ao comando da Câmara em fevereiro. Dois nomes despontam como candidatos a assumir a liderança da sigla: Luciano Vieira (RJ) e Gilberto Abramo (MG).
Abramo é considerado favorito. O deputado, que evita se definir como oposição, é rival do PT em Minas e aliado do governador Romeu Zema (Novo), cotado como potencial adversário de Lula em 2026. Ele preside o Grupo Parlamentar Brasil-Israel e tem feito críticas ao governo pela postura do país em relação aos conflitos no Oriente Médio.
Também na disputa, Vieira é outro a ter como aliado um governador de oposição, o do Rio, Cláudio Castro (PL). O deputado foi eleito em 2022 pelo PL de Jair Bolsonaro, mas trocou de partido após divergências nas eleições municipais deste ano. Pesa contra ele ser um neófito na bancada.
O presidente do Republicanos, deputado Marcos Pereira (SP), é quem tem conduzido o processo. A interlocutores, o dirigente partidário avalia que a prioridade para a escolha do novo líder será algum deputado que tenha sido eleito pela legenda em 2022, o que descartaria Vieira.
Em outro indicativo de distanciamento de um partido da base em relação a Lula, o PP decidiu por unanimidade manter o deputado Doutor Luizinho (RJ) como líder do partido por mais um ano. O parlamentar foi secretário de Castro no Rio e é do mesmo grupo político de Jair Bolsonaro e do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no estado.
Novo perfil
Até mesmo a mudança no PL indica um cenário de mais dificuldades para Lula. Altineu Côrtes (RJ), o atual líder, é considerado um deputado pragmático, com bom trânsito entre petistas e outros partidos da base. Ele deve ser substituído por Sóstenes Cavalcante (RJ), que é da ala mais estridente da legenda e com perfil mais combativo de oposição.
— Não é só discurso. É montar uma equipe técnica para colocar uma lupa em tudo o que o governo está fazendo, em especial na Petrobras, Correios, fundo de pensão — afirmou Sóstenes sobre seus planos na liderança do maior partido de oposição.
Da mesma forma, a saída de Silas Câmara (Republicanos-AM) do comando da bancada evangélica deverá dificultar a relação do governo com o grupo, que já não é boa. Os principais cotados para sucedê-lo são Otoni de Paula (MDB-RJ) e Gilberto Nascimento (PSD-SP).
A falta de consenso deve empurrar a definição para o ano que vem. Integrantes mais ligados à oposição acusam o governo de tentar interferir na eleição em favor de Otoni, que era um aliado fiel de Bolsonaro, mas mudou de lado e se aproximou dos petistas.
— O governo está querendo se intrometer nisso. Isso é questão dos deputados — disse o pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, próximo de Bolsonaro e considerado padrinho político de Sóstenes.
Responsável pela articulação política do Planalto, o ministro Alexandre Padilha, das Relações Institucionais, nega que o governo tente interferir nas bancadas e diz que manterá o diálogo com os líderes, independentemente de quem seja o escolhido.
— Nunca interferimos e nem fizemos qualquer sugestão de calendário para esta ou qualquer outra frente. O calendário é de autonomia das frentes — disse Padilha.
O governo, contudo, já havia falhado em emplacar o deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) no comando da bancada ruralista e o bolsonarista Pedro Lupion (PP-RS) ficará mais um ano no comando da frente. O parlamentar é considerado um dos principais opositores ao governo na Câmara e tem articulado o avanço de propostas que sofrem resistência no Planalto, como projetos que miram o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).