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O NAe São Paulo chegou ao Brasil em 2001; o navio foi construído na França entre 1957 e 1960 (Marinha do Brasil)
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sexta-feira 4 de novembro de 2022 às 17:35h

Um mês depois, ‘navio fantasma’ ainda vaga sem destino no mar do Nordeste

CURIOSIDADES, NOTÍCIAS


Segundo o UOL, no dia 4 de agosto, um rebocador holandês de grande porte partiu do porto do Rio de Janeiro levando a reboque aquele que já foi o maior navio militar brasileiro: o ex-porta-aviões São Paulo, que estava parado havia cinco anos. O destino seria um estaleiro na Turquia, onde o grande navio, de 266 metros de comprimento, seria desmontado e transformado em sucata, após ter sido comprado pela empresa turca Sok Denizcilikve Tic, através de um leilão promovido pela Marinha do Brasil, já que a reforma do velho porta-aviões, orçada em cerca de R$ 1 bilhão, fora considerada inviável. Mas deu tudo errado.

Voltou para o Brasil

Após ser impedido de entrar na Turquia, por não se saber ao certo quanto de material tóxico ainda existe a bordo do ex-porta-aviões (sobretudo amianto, material cancerígeno mundialmente condenado, que, de acordo com convenções internacionais, não pode ser transportado, muito menos exportado), o comboio teve que dar meia volta e retornar ao Brasil, quando já estava do outro lado do Atlântico.

Protesto contra a entrada do ex-porta-aviões na Turquia

A epopeia, de cerca de 7.000 quilômetros no mar — e outro tanto desses para voltar —, durou dois meses e acabou trazendo o navio de volta ao mesmo local de onde ele havia partido: o litoral do Rio de Janeiro.

Mas lá ele também não pode ficar, e teve que seguir para Pernambuco, onde tampouco pode atracar.

Aqui, também não!

Uma vez de volta ao Brasil, o ex-porta-aviões não recebeu autorização para atracar em porto algum, pelo mesmo motivo da negativa turca: a quantidade desconhecida de material tóxico existente a bordo. Começava, então, no mar de Pernambuco, na altura do porto de Suape, a segunda parte de uma sucessão de absurdos que tem transformando o destino do ex-porta-aviões em um típico pastelão.

Agora, ninguém sabe o que fazer com o gigantesco navio desativado, que virou uma espécie de fantasma, que ninguém quer por perto.

Um mês navegando em círculos

Desde que retornou ao Brasil, um mês atrás, o comboio formado pelo rebocador holandês e pelo ex-(único)porta-aviões brasileiro passa dias e noites perambulando pra lá e pra cá no mar pernambucano, a cerca de 20 quilômetros da costa, à espera de uma decisão sobre o que fazer com o navio, que nenhum porto quer aceitar – nem mesmo o do Rio de Janeiro, de onde ele partiu, três meses atrás.

Como o enorme porta-aviões não pode ser ancorado, por questões de segurança, já que não possui mais motores nem meios próprios de mobilidade para o caso de necessidade, cabe aos 16 membros da tripulação do rebocador holandês, a maioria filipinos, agora sob o comando do capitão russo Dmitry Nefedov (que substituiu o comandante anterior, após a volta da Europa), passar dias e noites arrastando aquele pesado casco de 30 000 toneladas em intermináveis percursos de ida e volta no mar, nas proximidades do porto de Suape.

Há um mês, os tripulantes do rebocador aguardam uma resposta que nunca chega: para onde levar o navio que se arrasta dia e noite sem nenhum destino?

Ninguém sabe responder.

Navio vira espécie de “fantasma” e ninguém sabe o que fazer

Interminável vai e vem

Dia após dia — e lá se vão 30 deles… —, o patético comboio que não segue para lugar algum navega em círculos no litoral sul de Pernambuco.

Na maior parte do tempo, as duas embarcações ficam à deriva, mas unidas por grossos cabos de aço, com a tripulação do rebocador monitorando constantemente os ventos e as correntezas.

Quando estes dois elementos passam a empurrar o comboio para longe, o rebocador entra em ação e traz novamente o navio para a posição original.

É um interminável vai e vem.

Emaranhado de voltas no mar

Na Internet, os sites que rastreiam embarcações no mar mostram um incompreensível emaranhado de linhas superpostas, que vão e voltam, quando o navio pesquisado é o rebocador Alp Centre (clique aqui, para ver em tempo real). Neles, também aparece a mensagem de que o rebocador está “aguardando instruções”, informação que não muda há um mês.

Estima-se que, diariamente, dependendo da intensidade dos ventos e da correnteza, o peculiar comboio dê duas ou três voltas na região, sem, porém, sair das proximidades do porto de Suape, onde espera, um dia, poder atracar, seja para se livrar do incômodo navio, ou para, no mínimo, reabastecer o rebocador com combustível, antes de seguir viagem — ainda que não se saiba para onde.

“O rebocador parece ainda ter combustível, mas o seu comandante já pediu reforço de alimentos e suprimentos para a tripulação, que também foi parcialmente substituída, porque já estava no mar há bastante tempo”, diz um agente marítimo do porto pernambucano encarregado de atender ao comboio, mas que tampouco arrisca dizer como deve terminar este caso, inédito na história da navegação marítima brasileira, por sinal.

Como resolver o problema?

A rigor, há três possibilidades.

A primeira é que a empresa turca que arrematou o navio devolva o porta-aviões à Marinha do Brasil, apesar do que já gastou com o fracassado transporte dele para a Europa (o custo estimado do rebocador é de cerca de 30 000 dólares por dia, o que já representaria uma conta superior a R$ 15 milhões), abrindo mão, também, do que pagou pelo navio no leilão: R$ 10,5 milhões — menos do que custou o seu inútil transporte até agora, e, segundo especialistas, valor bem abaixo do que ex-porta-aviões São Paulo valeria, mesmo como simples sucata.

Neste caso, um novo leilão da embarcação seria feito no futuro, mas até isso traria alguns problemas imediatos, porque, neste instante, nenhum porto quer recebê-lo.

Muito menos para ser feita a remoção do material tóxico que existe a bordo.

Hipótese mais provável

A segunda alternativa para a encrenca do tamanho do próprio navio na qual se transformou o ex-porta-aviões, seria a revenda dele para outra empresa de desmanche no estado em que encontra (ou seja, vagando no mar, sem destino), como forma de o atual proprietário se livrar do problema — o que, no entanto, dada a repercussão do caso no Brasil e na Europa, parece pouco viável.

Já a terceira — e mais provável — hipótese seria conseguir vencer de alguma maneira as restrições ambientalistas (sobretudo das secretarias estaduais de meio ambiente, como a de Pernambuco, que já foi contra a parada do comboio em Suape), e atracar o comboio em algum porto brasileiro, para a retirada do amianto que ainda existe a bordo do velho navio fantasma, que vaga no mar há três meses, sem ninguém a bordo — 9,6 toneladas, segundo a inspeção feita no Brasil, antes da partida, ou muito mais que isso, além de outras substâncias, também de acordo com especialistas.

Encouraçado brasileiro sumiu no meio do Atlântico, igualmente durante um comboio

Para conhecer a história inteira

A questão é que, além da inevitável reação contrária dos órgãos ambientais (mesma razão pela qual o comboio foi impedido de entrar na Turquia), a remoção do amianto, presente especialmente em tubulações da embarcação, é um procedimento lento, complexo e caro, o que tornaria ainda mais extensa a novela na qual se transformou à venda do ex-porta-aviões brasileiro — clique aqui para conhecer esta história completa.

Vistoria recomendou reparos

Contribui, no entanto, para esta alternativa uma das conclusões apontadas pela vistoria que foi feita no porta-aviões, quando da sua chegada a Pernambuco — e após ter sido rebocado, à toa, até o Rio de Janeiro, no seu retorno da Europa, em mais uma trapalhada de um caso repleto delas.

Na vistoria, realizada no próprio mar, longe do porto pernambucano, 15 dias atrás, técnicos de uma empresa especializada constataram que, embora certa quantidade de água tenha penetrado no casco do navio (algo já esperado, especialmente após tanto tempo sendo rebocado), a estabilidade do ex-porta-aviões não está comprometida, o que, pelo menos por enquanto, afasta o risco de naufrágio, acidente que já aconteceu no passado com outro grande navio da Marinha do Brasil, coincidentemente também chamado “São Paulo”, quando também era rebocado rumo ao desmanche, na Europa.

A vistoria, no entanto, recomendou que o navio seja levado para um estaleiro, “para reparos”.

Mas onde, se nenhum porto quer recebê-lo?

ONG mundial se manifestou

“É hora de as autoridades brasileiras assumirem coletivamente a responsabilidade pela situação perigosa que representa o ex-porta-aviões São Paulo”, disse, esta semana, Nicola Mulinaris, porta-voz da Shipbreaking Platform, ONG mundial dedicada às questões ambientais que envolvem o desmanche de navios. “Agora, cabe ao Ibama e à Marinha do Brasil darem uma solução para este problema”.

O sonho de virar museu

Diante de tantos contratempos e trapalhadas, a quase utópica proposta de um entusiasta do ex-porta-aviões São Paulo, o paulista e ex-soldado da aeronáutica Emerson Miura, de transformá-lo em museu flutuante, em vez de ser desmanchado e virar sucata, ganhou uma inesperada sobrevida.

“Enquanto o navio existir, há esperanças de salvá-lo”, diz Miura, que, com a improvável volta do comboio ao Brasil, no mês passado, conseguiu, ao menos, uma vitória difícil de se imaginar: a de ver o avanço do porta-aviões rumo ao desmanche retroceder.

Ganhamos mais tempo para agir”, comemora Miura, que criou um instituto para tentar preservar o maior navio militar que o Brasil já teve.

Mas, por enquanto, ele está longe de conseguir o objetivo de transformar o navio condenado em museu, a exemplo do que já ocorreu com outros ex-porta-aviões, mundo afora.

O porta-aviões que acabou em uma lagoa

Um dos casos mais famosos do gênero foi o lendário ex-porta-aviões russo Minsk, que atuou fortemente na época da União Soviética, que, ao ser aposentado, foi transformado em parque temático de diversões, na China.

Mas o negócio não deu tão certo quanto os compradores chineses imaginavam, e, após um tempo, ele foi vendido para outro empresário, que, na falta de melhor local para atracar o imenso navio (mesmo problema do porta-aviões brasileiro), o enfiou dentro de uma lagoa, no interior da China, à espera de nova serventia.

E ele está lá até hoje, desativado e abandonado, em uma lagoa de onde nunca mais poderá sair, nem mesmo para ser desmontado.

Porta-aviões acaba em lagoa no interior da China

Uma história conturbada

O ex-porta-aviões brasileiro São Paulo foi vendido aos turcos através de um conturbado leilão, que chegou a ser adiado algumas vezes.

Mas, conturbada também foi a própria história deste porta-aviões no país.

Comprado, usado, da França, no ano de 2000, o São Paulo substituiu o lendário porta-aviões Minas Gerais, primeiro navio-aeródromo que o Brasil teve, mas sua vida útil foi tão curta quanto problemática.

Com uma intermitente série de problemas mecânicos (entre eles, o trágico rompimento de um duto de vapor, em 2004, que resultou na morte de três tripulantes), ele nunca conseguiu navegar por muito tempo, sem exigir reparos.

Ao longo dos 17 anos que passou na Marinha do Brasil, o São Paulo navegou pouco mais de 200 dias, o que o tornou um incômodo na frota e acelerou seu processo de descomissionamento.

Surgiu, então, outro problema: o que fazer com ele?

E esse problema permanece, três meses depois de o navio ter partido do Brasil para o que parecia ser uma viagem sem volta, e um mês após estar zanzando e círculos no mar nordestino.

A novela do ex-porta-aviões brasileiro que não tem onde parar ainda não terminou.

E os próximos capítulos podem ser ainda mais surpreendentes

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