O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, disse neste domingo (23) que estava disposto a renunciar se isso significasse paz na Ucrânia. O comentário foi feito dias depois que o presidente Trump questionou sua legitimidade e o chamou de “ditador sem eleições”, repetindo um argumento do Kremlin.
Ao mesmo tempo, ele continuou a se opor à insistência de Trump para que ele assinasse um acordo sobre minerais que a Ucrânia diz ser desagradável. Além disso, anunciou uma reunião na segunda-feira com mais de 30 países, pessoalmente e virtualmente, como uma espécie de coalizão de apoio ao empenho da Ucrânia na guerra.
Não ficou imediatamente claro se Zelensky havia considerado seriamente a opção de renunciar ou se estava apenas respondendo aos últimos ataques de Washington e Moscou. Ele também afirmou que poderia trocar sua saída pela entrada da Ucrânia na OTAN — um cenário altamente improvável, dada a oposição de Trump à entrada da Ucrânia na aliança militar.
— Se isso trouxer paz à Ucrânia e se precisarem que eu renuncie, estou pronto — afirmou Zelensky em uma coletiva de imprensa no domingo, na véspera do terceiro aniversário da guerra.
— Em segundo lugar, posso trocar isso pela OTAN.
Por enquanto, afirma Zelensky, a Ucrânia e os Estados Unidos permanecem presos em negociações sobre um acordo para trocar os minerais e outros recursos naturais do país por ajuda americana. Zelensky sinalizou que ainda não estava pronto para assinar a última proposta dos Estados Unidos, que exigiria que a Ucrânia pagasse à maior economia do mundo US$ 500 bilhões usando as receitas de seus recursos naturais.
— Não assinarei algo que será pago por dez gerações de ucranianos — disse Zelensky, observando que as negociações continuariam.
As conversas já haviam se estendido até a noite de sábado, de acordo com duas autoridades ucranianas informadas sobre as negociações, e coincidiram com um grande ataque de drones russos às cidades ucranianas durante a noite. A Força Aérea Ucraniana apontou que a Rússia havia lançado 267 drones, o que considerou um recorde desde o início da guerra, há três anos. Essa afirmação não pôde ser confirmada de forma independente.
O zumbido de drones de ataque sobrevoando edifícios ecoou durante a noite no centro de Kiev, a capital, seguido pelo som de metralhadoras pesadas tentando abatê-los. A Ucrânia declarou que a maioria dos drones foi abatida ou desativada por interferência eletrônica, mas que os destroços dos drones danificaram casas e provocaram incêndios em partes da capital.
Na noite de sábado, o presidente Trump aumentou a pressão sobre a Ucrânia para assinar o acordo, que está sendo negociado há mais de 10 dias. Várias minutas de acordos já foram rejeitadas pelo lado ucraniano porque não continham garantias específicas de segurança dos EUA que protegeriam Kiev contra novas agressões russas.
— Acho que estamos bem perto de um acordo, e é melhor que estejamos perto de um acordo — afirmou Trump à Conferência de Ação Política Conservadora na noite de sábado, observando que ele queria uma retribuição pela assistência militar e financeira americana anterior ao país devastado pela guerra.
— Estamos pedindo terras raras e petróleo. Tudo o que pudermos conseguir.
A frustração com as negociações prolongadas alimentou uma disputa crescente entre Zelensky e Trump. O líder ucraniano disse que o republicano estava vivendo em uma “teia de desinformação”.
Nesta sexta-feira, os Estados Unidos propuseram um novo esboço de acordo, obtido pelo The New York Times, que ainda carecia de garantias de segurança para a Ucrânia e incluía termos financeiros ainda mais rígidos. As duas autoridades ucranianas, que falaram sob condição de anonimato para discutir as negociações, alegaram que o país europeu enviou de volta as emendas na noite de sábado.
A nova minuta do acordo reiterou a exigência dos EUA de que a Ucrânia abrisse mão de metade de suas receitas provenientes da extração de recursos naturais, incluindo minerais, gás e petróleo, bem como os ganhos provenientes de portos e outras infraestruturas.
De acordo com o acordo proposto, essas receitas seriam direcionadas a um fundo no qual os Estados Unidos teriam 100% de participação financeira, e a Ucrânia deveria contribuir para o fundo até que ele atingisse US$ 500 bilhões. Essa soma é mais de quatro vezes maior do que o valor da ajuda dos EUA comprometida com a Ucrânia até o momento e mais de duas vezes o valor da produção econômica da Ucrânia em 2021, antes da guerra.
“É astronômico para nós, e não entendo por que impor tal ônus” a uma economia que já está sofrendo com a guerra, declarou Victoria Voytsitska, ex-legisladora ucraniana e especialista em energia.
— Parece que as próximas duas gerações terão que pagar reparações de acordo com esse esquema.
O acordo não compromete os Estados Unidos com garantias de segurança para a Ucrânia, nem promete mais apoio militar para Kiev. A palavra “segurança” foi até mesmo excluída de uma formulação contida em uma versão anterior do acordo, datada de 14 de fevereiro e analisada pelo The New York Times, que afirmava que ambos os países tinham como objetivo alcançar “paz e segurança duradouras na Ucrânia”.
Em vez disso, o acordo diz que uma parte das receitas coletadas pelo fundo será reinvestida na reconstrução da Ucrânia. Ele também afirma que os Estados Unidos pretendem fornecer apoio financeiro de longo prazo para o desenvolvimento econômico da Ucrânia, embora nenhum valor seja especificado.
Esse possível compromisso está alinhado com o argumento da Casa Branca de que a mera presença de interesses econômicos americanos na Ucrânia impedirá futuras agressões russas.
— Essa parceria econômica estabeleceria as bases para uma paz duradoura, enviando um sinal claro ao povo americano, ao povo da Ucrânia e ao governo da Rússia sobre a importância da futura soberania e do sucesso da Ucrânia para os EUA — escreveu Scott Bessent, secretário do Tesouro dos EUA, em um artigo de opinião no sábado para o Financial Times.