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quarta-feira 23 de setembro de 2020 às 11:48h

TSE usa solução processual para anular votos comprados sem ferir jurisprudência

JUSTIÇA, NOTÍCIAS


Para não ferir a segurança jurídica nem afrontar uma resolução publicada em 2017, o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral usou uma solução processual para anular totalmente os votos comprados nas eleições para deputado no Acre, em 2018.

Na noite de terça-feira (22), a corte analisou a condenação do Tribunal Regional Eleitoral acreano à cassação dos mandatos dos deputados Pastor Manuel Marcos (federal) e Doutora Juliana (estadual), eleitos pelo PRB, por desvio de recursos partidários, abuso do poder econômico e compra de votos.

Ao condená-los, a corte estadual aplicou o artigo 222 do Código Eleitoral e declarou nulos, para todos os efeitos, os votos nominais a eles conferidos. Na prática, isso significa que essa votação não pode ser aproveitada pelo partido ou coligação, gerando recálculo do quociente eleitoral.

Se a cassação fosse mantida pelo TRE-AC, mas os votos pudessem ser contados pelo partido ou coligação, os beneficiados seriam seus suplentes, Railson Correia (federal) e André da Droga Vale (estadual). Por isso, eles pediram ingresso nos autos sucessivas vezes na condição de assistentes simples do Ministério Público Eleitoral

Como o pedido do MP poderia prejudicar a pretensão dos dois, a corte estadual indeferiu o ingresso como assistentes simples. Quando a ação chegou ao TSE, o relator, ministro Luiz Edson Fachin, entendeu pela legitimidade ativa deles, bem como a existência de interesse jurídico legítimo no oferecimento, na qualidade de terceiros prejudicados, de recurso ordinário.

O objetivo da dupla era pleitear a aplicação não do artigo 222, mas do parágrafo 4º do artigo 175 do Código Eleitoral. Ele trata de votos nulos, mas determina que serão aproveitados pelo partido “quando a decisão ocorrer após a realização da eleição a que concorreu o candidato alcançado pela sentença”. Assim, assumiriam as vagas.

Jurisprudencialmente, eles tinham razão.

As eleições de 2018 foram disciplinadas pela Resolução 23.554/2017, que diz expressamente no inciso IV do artigo 219 que são nulos para todos os efeitos, inclusive para a legenda, os votos dados a candidato que, na data do pleito, esteja com o registro deferido, porém posteriormente cassado por decisão em ação autônoma, se a decisão condenatória for publicada antes das eleições.

O contexto normativo colocou o ministro Luiz Edson Fachin em situação complicada. Assim, construiu voto definido pelos colegas de TSE como “Hercúleo” no sentido de reconhecer a incongruência em aceitar o aproveitamento de votos que, comprados, são ilegítimos e não exprimem a vontade popular.

Mas ressalvou. “É preciso, mesmo assim, em homenagem ao princípio da segurança jurídica”, reconhecer que esse entendimento não pode ser aplicável no caso julgado porque, graças à Resolução 23.554/2017, a nulidade total dos votos não vale para decisão condenatória publicada depois das eleições em que houve o ilícito.

Solução processual

A solução processual que salvou a noite foi proposta pelo presidente, ministro Luís Roberto Barroso, após divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes. “Se for pra anular (os votos) sem frustrar a jurisprudência, aí seria melhor não conhecer (do recurso). Aí mantém-se a decisão do TRE do Acre”, sugeriu.

A ideia é baseada no fato de que o Ministério Público eleitoral não recorreu da anulação total e da aplicação do artigo 222 do Código Eleitoral na decisão do TRE-AC. Como assistentes simples do MP, não poderiam os dois suplentes recorrer de forma autônoma, pois submetidos à decisão da parte à qual assistem, que não quis o recurso.

Imediatamente, os advogados dos suplentes, Soraia da Rosa Mendes e Lucas Vieira Carvalho, pediram a palavra para esclarecer: atuaram como terceiro prejudicado, não como assistente simples, inclusive como reconhecido pelo relator. Não conseguiram convencer a maioria.

“É uma maneira engenhosa para se fazer justiça no caso concreto. Efetivamente, não desce bem na goela o fato de, ainda que seja uma coligação, ela se beneficiar do autor da fraude. É contraindicado. Não é possível prestigiar a segurança jurídica com essa incongruência tão acachapante nesse caso”, apontou o ministro Luís Felipe Salomão.

“Tenho um relevante desconforto de ver esses votos serem aproveitados pela coligação da qual o presidente de um dos partidos foi responsável pela infração. Acho que temos uma solução processual legítima e que parece correto. Eles não foram admitidos como assistentes simples na origem. E o assistente simples, ainda quando admitido aqui em cima, não poderia ter recorrido, na medida em que o Ministério Público não recorreu”, concluiu o ministro Luís Roberto Barroso.

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