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quarta-feira 3 de agosto de 2022 às 05:26h

TSE reduz transparência sobre bens de candidatos; entidades criticam decisão

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O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) parou de divulgar parte das informações sobre os bens dos candidatos das eleições de 2022 em seu site. Entre os dados retirados, estão nomes de empresas e detalhes sobre imóveis e outras propriedades.

O TSE informou conforme Victor Farias, do g1, que retirou as informações com base na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). A decisão da remoção não é final e espera o julgamento de uma ação, que está em andamento no tribunal e não tem previsão de ser encerrado.

Um grupo de cinco entidades ligadas à transparência enviou carta ao TSE na segunda-feira (1º) criticando a retirada das informações. Elas pedem “retomada imediata da divulgação”.

“Consideramos tratar-se de um grave retrocesso na transparência das candidaturas e do processo eleitoral – que, se já seria crítico em um contexto de normalidade, é inadmissível na conjuntura atual, quando pode servir de argumento a questionamentos da lisura das eleições no país”, escreve a nota.

Assinam a carta: Associação Data Privacy Brasil de Pesquisa, Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, InternetLab – Pesquisa em Direito e Tecnologia, Open Knowledge Brasil e Transparência Brasil.

Até o último pleito, em 2020, o TSE divulgava três informações sobre bens de postulantes a cargos públicos: tipo de bem (veículo automotor, terreno, cota em empresa etc), descrição do bem (chácara de 2 hectares, cabeças de gado etc) e o valor do bem. Agora, a descrição do bem aparece como “não disponível”.

Segundo o TSE, “a não divulgação dessas informações está em conformidade à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)”.

A LGPD foi sancionada em 2018, mas entrou em vigor somente em setembro de 2020, dois meses antes da eleição daquele ano. Segundo o TSE, a lei teve impacto sob os dados eleitorais apenas no pleito de 2022.

A nota enviada ao TSE critica o uso da lei para a remoção das informações. As entidades, que participaram de uma audiência pública do TSE no começo de junho para tratar do tema, afirmam que, na ocasião, foi demonstrada “a importância da divulgação completa dos dados de declarações de bens, ao possibilitar o controle social sobre a evolução patrimonial de candidatos(as) recorrentes e de pessoas que mantêm relações com a administração pública, ainda que não eleitas”.

“O Ministério Público Eleitoral, também na referida audiência, reconheceu a relevância de contar com o apoio da sociedade em sua atividade-fim, viabilizado pela transparência nas declarações”, acrescentam.

Para o pesquisador do Centro de Estudos em Política e Economia do Setor Publico (Cepesp) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Arthur Fisch, a não disponibilização desses dados é negativa e pode deixar o processo eleitoral menos transparente.

“É um prejuízo, não colabora para o processo eleitoral, é um retrocesso.”

Na mesma linha, a diretora-executiva da Open Knowledge Brasil, Fernanda Campagnucci, diz que foi pega de surpresa com a retirada dos dados.

“Nós defendemos a manutenção da divulgação desses dados, falamos de toda a importância que esses dados têm para a transparência eleitoral, não só das eleições, mas de todo o ambiente político”, afirma.
Fisch cita como exemplo da importância desses dados um possível candidato que tem vários terrenos em uma região específica de uma cidade e, quando eleito, passa a priorizar essa área, em detrimento das demais. Sem as informações detalhadas, não seria possível identificar esse possível conflito de interesses.

Campagnucci, por sua vez, lembra que esses dados ajudam a contrastar a declaração com a realidade. “Várias investigações jornalísticas foram feitas com base no endereço, você contrastar aquele dado com a realidade. Por exemplo uma mansão que está sendo declarada como uma casa humilde”, comenta.

O pesquisador do Cepesp pondera que os dados são preenchidos pelos próprios candidatos, não tem padrão e podem conter erros. Mesmo assim, diz que as informações ajudavam até mesmo na identificação de possíveis erros em outras seções da base. “Por exemplo um homem que declarou ter uma fazenda de bilhões de reais e você via que era um erro”, afirma.

Fisch defende que candidatos a cargos públicos precisam divulgar alguns dados que, em uma situação normal, não seriam publicizados, de modo a permitir que o eleitor perceba possíveis conflitos de interesse.

“A LGPD precisa avançar e entender esses casos que não são dados gerais, não posso tratar dados eleitorais como trato outros tipos de dados, dados de pessoas particulares. São dados privados, mas o representante público precisa abrir os dados para a gente entender quem ele é”, explica.

Especialista em LGPD e professor do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), o advogado Danilo Doneda lembra que a Lei Geral de Proteção de Dados é uma legislação nova. “Falta jurisprudência, falta assentar o entendimento de como será aplicada, não é surpreendente que haja tantas oscilações”, comenta.

Ele afirma que a LGPD foi criada para “reestabelecer o equilíbrio no uso de dados”, favorecendo quem está numa posição desfavorável, como o cidadão comum que acessa a internet, mas sem provocar privilégios.

“Usar a norma para diminuir a transparência é contraproducente e vai contra o espírito da lei. Ela não foi feita para estabelecer privilegio, mas para equilibrar poderes”, diz.
Doneda acredita que, no caso de informações patrimoniais, é a transparência, e não a privacidade, que traz o equilíbrio proposto pela LGPD.

Ele defende, no entanto, que ajustes sejam feitos, principalmente nos dados de pessoas que eram candidatos em eleições passadas, mas não estão concorrendo mais.

“Alguns ajustes, algumas coisas vão ter que ser feitos. Por exemplo: imagine uma situação em que o cara foi candidato em 2018, abriu o imposto de renda, declaração de bens e tudo. Só que o cara não é mais candidato hoje. Faz sentido manter todos esses dados abertos? Talvez não. Não existe mais motivo para continuar expondo aqueles dados”, afirma.

Campagnucci concorda que é necessário fazer “refinamentos” na aplicação da lei, removendo, por exemplo, os dados da placa de um carro. Ela defende, no entanto, a manutenção de dados históricos, alegando que a janela de interesse público desses dados é mais ampla que a eleição atual.

“A janela de interesse não é só das pessoas que estão disputando cargos, porque a vida pública das pessoas que tiveram cargos públicos, que foram eleitas em anos anteriores, ela tem um impacto depois. A gente poder olhar para o histórico é tão importante quanto a gente olhar para o presente” diz.
“Pode não ser candidato, mas ela pode ter influência, ocupar cargos no executivo, sem necessariamente ser um mandato eletivo. A nossa posição é que ela tenha essa janela de interesse ampliada”, acrescenta.

Candidato pediu retirada de dados

De acordo com o TSE, o tribunal espera o julgamento do caso do candidato à prefeitura de Três Barras do Paraná (PR), Jhonatan Felipe Laurindo (PP), em 2020, para definir se retoma ou não a divulgação dos dados.

Na ação protocolada na Justiça Eleitoral, Laurindo pediu que o TSE oculte do sistema DivulgaCandContas dados que, segundo ele, seriam informações não divulgáveis por serem de cunho pessoal e patrimonial.

A solicitação foi analisada em junho deste ano, mas o ministro Edson Fachin pediu vista. Na ocasião, o magistrado disse que o caso “projeta a matéria num dos horizontes mais sensíveis à análise que está sendo feita para propor de maneira abrangente uma regulamentação de todas essas questões no âmbito da Justiça Eleitoral”.

Não há prazo para o julgamento ser encerrado.

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