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sexta-feira 30 de junho de 2023 às 08:53h

Tribunais e Promotorias ignoram STF e Assembleias para obter reajuste salarial

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Os principais Tribunais de Justiça e Ministérios Públicos estaduais vincularam de forma inconstitucional os reajustes salariais de seus membros com o aumento dos vencimentos de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), conforme reportagem de Italo Nogueira e João Pedro Pitombo, do jornal Folha de S. Paulo.

Juízes e promotores de ao menos 16 estados receberam em abril reajuste de 6% sem o envio de projeto de lei para as respectivas Assembleias Legislativas. O percentual acompanha o aumento nos salários dos ministros do STF aprovado pelo Congresso e aplicado no mesmo mês.

Ao menos desde 2020, o STF considera inconstitucional o “reajuste automático” nos estados a partir do aumento para ministros da corte ou de outras autoridades federais.

Os tribunais e Promotorias que adotaram a prática usaram como justificativa decisões do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) que a autorizam.

Após questionamento da Folha, a ministra Rosa Weber, presidente do STF e do CNJ, suspendeu na terça-feira (27) a resolução que previa a norma.

Dos 5 tribunais considerados de grande porte pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), 4 (SP, RJ, MG e PR) fizeram o reajuste sem envio de projeto de lei para a Assembleia Legislativa, prática acompanhada pelos Ministérios Públicos dos mesmos estados. O aumento foi formalizado por meio de portarias e resoluções internas.

Neste grupo, apenas no Rio Grande do Sul houve respeito ao entendimento do Supremo. Os projetos de lei enviados pelo TJ e Promotoria para o reajuste continham um artigo no qual tornavam regra a vinculação salarial. Contudo, emendas da Assembleia retiraram esse texto das leis aprovadas.

O aumento sancionado pelo presidente Lula em janeiro elevou o salário dos ministros do STF de R$ 39,3 mil para R$ 41,6 mil em abril. A lei federal prevê um reajuste escalonado até 2025, quando o subsídio chegará a R$ 46,4 mil (alta de 18%, no total).

O último reajuste salarial feito a ministros do STF aconteceu em 2015. Desde então, a inflação acumulada foi de 44,5%, segundo o Banco Central.

Os desembargadores e procuradores estaduais podem, pela Constituição, receber até 90,25% dos salários dos ministros do STF. Desta forma, o teto para os vencimentos dessas categorias subiu de R$ 35,5 mil para R$ 37,6 mil. Caso acompanhe o reajuste escalonado definido pela lei federal, chegará a R$ 41,8 mil em 2025.

A Procuradoria-Geral da República ofereceu desde 2020 um total de 27 ações para anular leis estaduais que estabelecem reajustes automáticos vinculados, entre outros gatilhos, a aumentos dos ministros do STF.

A primeira decisão sobre o tema foi dada em novembro de 2020. Os ministros consideraram inconstitucional a vinculação do reajuste salarial de procuradores da Assembleia Legislativa de Mato Grosso ao mesmo percentual dado aos membros do STF.

A corte também apontou irregularidades em gatilhos semelhantes dados aos vencimentos de deputados estaduais de Sergipe, procuradores de Roraima e membros do Ministério Público em Rondônia.

Em junho deste ano, o STF analisou os mesmos gatilhos criados por leis aprovadas no Tocantins que beneficiavam membros do MP-TO e do TJ-TO. O voto do ministro Luis Roberto Barroso, relator do caso, deixa clara a inconstitucionalidade da vinculação.

“Não se justifica que o ente regional delegue à lei federal, que estabelece a remuneração do ministro do STF, a função de, por via oblíqua, determinar o valor dos subsídios dos desembargadores ou juízes”, escreveu Barroso em seu voto, aprovado por unanimidade do plenário neste ponto.

Além de declarar a lei estadual inconstitucional, o plenário do STF decidiu por maioria (8 a 2) fixar tese de julgamento. A medida obriga que todos os tribunais do país adotem automaticamente a mesma interpretação sobre o tema.

Liminares concedidas por membros do CNJ e do CNMP em 2014 e 2015 mantiveram o “reajuste automático” ao longo dos anos. No dia 23 de maio deste ano, o CNJ concluiu o julgamento e decidiu incluir o gatilho numa resolução de 2006 que trata do teto remuneratório para magistrados.

Na sessão, o conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello votou contra a alteração da resolução.

“Isso tem impacto no orçamento estadual, precisa ter um planejamento por parte do governador e um referendo pela Assembleia Legislativa. Não me parece razoável o Congresso Nacional, ao alterar os subsídios dos ministros do Supremo, impactar as contas dos mais diversos estados da federação”, afirmou o conselheiro.

O julgamento que definiu a inclusão do gatilho na resolução do CNJ ocorreu quatro dias depois que o STF fixou a tese de julgamento contra o “reajuste automático”.

A presidente do STF e do CNJ, ministra Rosa Weber, votou de forma distinta nas duas oportunidades. No Supremo, concordou com Barroso ao declarar a inconstitucionalidade da lei do Tocantins. No Conselho, acompanhou a maioria para aprovar a inclusão do reajuste automático na resolução.

Entre os estados que concederam o reajuste automático estão Rio de Janeiro e Goiás. Ambos aderiram ao Regime de Recuperação Fiscal, legislação de 2017 que auxilia estados que enfrentam grave desequilíbrio fiscal. O Tribunal de Justiça e o Ministério Público de Minas Gerais, que pleiteou o ingresso no programa, também adotaram a prática.

O Regime de Recuperação Fiscal não veda recomposições limitadas à inflação. Mas exige a aprovação de lei específica, como previsto na Constituição. O envio do projeto de lei pode ter repercussões políticas, já que outros servidores também pleiteiam junto aos deputados o reajuste.

TRIBUNAIS E PROMOTORIAS CITAM LEIS ESTADUAIS, DECISÕES DO CNJ E CNMP

A AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) e a Conamp (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público), autores dos pedidos de reajuste automático no CNJ e no CNMP, respectivamente, não responderam aos questionamentos da reportagem.

O TJ-SP afirmou, em nota, que o reajuste dos magistrados no estado é automático, “não dependendo de lei estadual específica”. O tribunal citou a lei estadual 1.031/2007, cujo teor é semelhante ao do Tocantins, considerado inconstitucional pelo STF.

“O julgamento referido [sobre as leis de Tocantins] ainda não transitou em julgado, visto que opostos embargos de declaração. Além disso, diz respeito especificamente à lei impugnada na ação direta de inconstitucionalidade mencionada (do estado de Tocantins), não estendendo seus efeitos, mesmo que venha a transitar em julgado, para outras leis estaduais”, diz a nota do TJ-SP.

Posicionamento semelhante foi dado pelo TJ-PR e MP-PR, que mencionaram leis estaduais que preveem o gatilho.

Os TJs do RJ, BA, PE, MG, GO, RN, MT, MS e ES afirmaram que adotaram entendimento aprovado pelo CNJ.

O tribunal mineiro ressaltou que a decisão do Supremo sobre as leis de Tocantins “não trata da situação fática deste tribunal”. Os TJs de PE, GO e MS citaram a legislações estaduais que disciplinam a forma de remuneração dos magistrados.

As Promotorias de MG, BA, PE, SC, GO e ES afirmaram estar de acordo com decisões do CNMP. Os TJs do AC e do MA também mencionaram o Código de Organização Judiciária. O MP de Mato Grosso citou lei estadual de 2016 que prevê a recomposição automática.

Os Tribunais de Justiça e Promotorias dos demais estados não responderam.

Por meio da assessoria de imprensa do STF, Rosa Weber disse que o julgamento no CNJ analisava a questão no aspecto administrativo e, no Supremo, no âmbito constitucional. Ela declarou que por considerar o tema constitucional mais relevante, decidiu suspender a resolução do Conselho.


LISTA DOS TRIBUNAIS E MINISTÉRIOS PÚBLICOS QUE NÃO ENVIARAM PROJETO DE LEI PARA REAJUSTE

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