Em um cenário em que a preocupação com a inflação global cede espaço para estratégias para se evitar uma recessão, os títulos da dívida do governo brasileiro são ativos atraentes para o investidor internacional, se destacando entre seus pares do mercado emergente, na avaliação do economista-chefe do banco suíço, Lombard Odier, Samy Chaar.
“Os títulos do governo em moeda local dos mercados emergentes, especialmente o Brasil, estão cada vez mais atraentes”, disse ele, em entrevista ao Valor.
“O ciclo de aperto monetário brasileiro está bem adiantado e o próximo passo será provavelmente um corte nos juros”, projeta. Segundo o executivo, existe confiança em um cenário desinflacionário de médio prazo, com a inflação já estando dentro da meta do Banco Central, “embora o núcleo e as expectativas inflacionárias permaneçam elevadas”.
Para Chaar, o BC deve começar a cortar os juros no terceiro trimestre. “O BC irá se comportar de forma cautelosa, esperando a política do Federal Reserve ficar mais clara”, disse. O economista prevê uma taxa de juros de 12,25% ao fim de 2023 no Brasil e de 10,25% no término de 2024.
Chaar também vê com bons olhos o desempenho do real brasileiro, a única moeda de países emergentes recomendada pelo economista, juntamente com divisas de países desenvolvidos, como iene japonês, franco suíço e o euro. Porém, alerta que, do lado positivo, balança externa mais forte, carrego de diferencial de juros elevado e inflação mais baixa podem ser favoráveis à divisa brasileira.
“A volatilidade do real tem caído continuamente nos últimos seis meses para seu nível mais baixo desde a pandemia. Isso tem mantido o real atraente para operações de carrego”, ponderando, contudo, que não se deve esquecer inteiramente o mau desempenho da moeda brasileira em períodos de expansão de spreads de crédito global. O banco reduziu o intervalo da cotação do dólar para R$ 4,90 a R$ 5,20, com uma tendência de ficar perto do piso da projeção.
Um ponto a favor para os ativos brasileiros foi a recente colocação do rating do Brasil em perspectiva positiva pela agência de classificação de risco S&P. “A decisão da S&P é relevante para aumentar a confiança do investidor e atrair fluxo de capital se os investidores anteciparem melhorias fiscais no país.”
“A volatilidade do real tem caído continuamente nos últimos seis meses”
— Samy Chaar
Chaar lembra que entre 2008 e 2015 a classificação de “investment grade” do Brasil coincidiu com fluxos de investimento positivos líquidos tanto em ações como em títulos. “Desde 2015, o país tem seguido um caminho de rebaixamento de crédito. Então, o rating da S&P é um passo positivo para potencialmente reverter essa tendência”. Ele adverte, contudo, que esse processo é lento.
“Embora o carrego siga elevado e movimentos recentes nos ratings de crédito sejam favoráveis, uma recuperação maior no fluxo de investimentos para dívida vai depender de mais melhorias no rating de crédito, considerando que grande parte dos investidores é movida por ratings”, diz.
De modo global, Chaar diz acreditar que os riscos para o crescimento parecem subavaliados em comparação com os riscos de inflação persistente. “O foco permanece nas perspectivas de inflação. Mas combater a inflação tem um custo de crescimento. Como os bancos centrais pretendem manter-se restritivos nos próximos trimestres, o impacto no crescimento será mais visível no restante do ano.” O economista prevê recessão moderada e de curta duração nos EUA entre o fim de 2023 e começo de 2024, mas não acha que o Fed irá cortar os juros antes do início do próximo ano.
Contudo, para Chaar, a principal conclusão é que na última reunião do Fed, de junho, aconteceu um importante pivô na política do banco central, ao pausar os juros “Mesmo que os juros sejam aumentados nas reuniões subsequentes, é improvável que tais movimentos mudem o quadro geral, de que a maior parte do aperto monetário já foi entregue. A economia e a inflação estão se comportando em linha com as expectativas e, se a tendência continuar, novas altas seriam um risco desnecessário. Acreditamos que o Fed está muito próximo do fim de seu ciclo de alta”, diz o economista.
“Já para a zona do euro, com o núcleo da inflação tendo apenas recentemente começado a cair e o crescimento dos salários acelerando em meio a um mercado de trabalho historicamente apertado, vemos o Bando Central Europeu subindo as taxas em mais 0,25 ponto percentual.” Segundo ele, isso aumenta o risco de um erro de política, dada uma economia já em contração e previsão de muitos elementos inflacionários caindo nos próximos meses.
Chaar também projeta que o Banco do Japão (BoJ) terá que encerrar o controle da curva de juros dos títulos de dez anos ainda este ano. “Esta política tem sido uma fonte de desconforto para os formuladores de políticas.”