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COBIÇA - Plenário do TCU: protagonismo e prestígio atraem parlamentares de todas as legendas - Foto: Samuel Figueira/TCU/
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quinta-feira 6 de março de 2025 às 16:38h

TCU conclui que ONGs contratadas pelo governo não entregavam a comida

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Um relatório da área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) aponta indícios de irregularidades nos gastos com o programa federal Cozinha Solidária, voltado a distribuir marmitas de comida, as chamadas ‘quentinhas’, a pessoas em situação de rua. Os problemas apontados em uma auditoria prévia do tribunal vão desde a falta de comprovação na entrega da comida até compras de alimentos sem apresentação de nota fiscal, além de possível conflito de interesses no repasse dos recursos.

“Não há notas fiscais ou cupons da compra de alimentos, embalagens e insumos, ou sequer balancetes resumidos de despesas, não sendo possível auferir os custos e a relação com o repasse público recebido; não há relatório detalhado ou fotos que atestem efetivamente o local e dias do fornecimento; e também não há lista de beneficiários diário, de forma a atestar a quantidade fornecida”, diz trecho do relatório do TCU, cujo sigilo foi retirado esta semana.

O relatório sugere que a Corte determine a suspensão dos repasses do Ministério do Desenvolvimento Social para a ONG responsável pelo programa e que essa entidade não faça pagamentos com as verbas já recebidas. A adoção ou não das medidas será decidida pelo plenário do TCU, em análise ainda sem data marcada.

Como revelou o jornal O Globo no mês passado, a pasta comandada pelo ministro Wellington Dias contratou uma entidade comandada por um ex-assessor do PT para fornecer os alimentos na periferia de São Paulo. A associação Movimento Organizacional Vencer, Educar e Realizar (Mover Helipa), por sua vez, repassou verbas para entidades lideradas por atuais e ex-auxiliares de parlamentares petistas.

O jornal visitou alguns dos endereços informados ao governo federal e não encontrou sinais da produção ou distribuição dos alimentos.

Após as reportagens, o TCU recebeu um total de oito pedidos de investigação da Câmara e do Senado Federal, assinados por parlamentares das duas casas. Os técnicos do órgão realizaram uma primeira análise do programa e recomendaram a suspensão dos pagamentos para a Mover Helipa, que ainda vai ser analisada pelo plenário da corte. O objetivo é que não haja prejuízo aos cofres públicos enquanto o caso é investigado.

Irregularidades

Os técnicos do órgão apontam, entre as supostas irregularidades, que “há indícios de conflito de interesses na contratação de empresas ou sociedades civis com recursos públicos da parceria, o que reforça a necessidade de apuração e providências cabíveis”.

A Unidade de Auditoria Especializada em Previdência, Assistência e Trabalho realizou uma análise amostral nos gastos do programa. Um dos repasses auditados foi feito para a Cozinha Solidária Madre Teresa de Calcutá, no bairro Jardim Varginha, na Zona Sul da capital paulista. A ONG pertence a Paula Souza Costa, que até dezembro do ano passado estava lotada no gabinete do ex-vereador de São Paulo Arselino Tatto (PT), que não se reelegeu em 2024 — quando o acordo foi celebrado, ela era funcionária do petista.

O TCU aponta que o projeto foi contratado mesmo “não estando habilitado como cozinha solidária para atuar no programa” . Outra irregularidade apontada é que, como funcionária do gabinete parlamentar, Paula “não poderia ser contratada para prestação de serviços, incorrendo a Mover supostamente na vedação do artigo 27, inciso II, do Decreto 8.726/2016”, que estabelece regras e procedimentos para parcerias entre a administração pública federal e as organizações da sociedade civil .

Os repasses para Cozinha Solidária Divino Espírito Santo, que está em nome de um ex-auxiliar do deputado estadual de São Paulo Luiz Fernando Teixeira (PT), também foram analisados O contrato prevê a entrega de 4.583 quentinhas por mês na região de Sapopemba, na Zona Leste.

“O único documento de liquidação vinculado ao pagamento é um recibo declarado pelo próprio representante da Divino Espírito Santo de que forneceu integralmente as refeições no período acordado, sem a devida comprovação das despesas realizadas e da efetiva prestação dos serviços”, destaca o TCU.

O mesmo problema é apontado na verba destinada à Cozinha Solidária Instituto Rosa dos Ventos, de Anderson Clayton Rosa, que ainda trabalha como assessor do deputado federal Nilto Tatto (PT-SP).

“O presidente dessa entidade é o Sr. Anderson Rosa, servidor da Câmara dos Deputados, havendo indícios novamente de violação ao artigo 27”, destaca o TCU. “A falta do nexo de causalidade se dá, igualmente, às demais cozinhas: não há notas fiscais dos custos ou balancetes das despesas incorridas, bem como relatórios diários do cardápio com assinaturas/documentos dos beneficiados”.

Outro indício de irregularidade, segundo o órgão, é que o presidente da Mover Helipa, José Renato Mundes Varjão, “em violação ao princípio da impessoalidade e legitimidade, foi contratado via sua própria pessoa jurídica para exercício das funções de Coordenador Executivo” do programa.

A área técnica também destaca indícios do “fornecimento de refeições de baixa qualidade nutricional, com alimentos altamente processados como salsichas e calabresas, inclusive para crianças, violando as diretrizes do programa e recomendações do Guia Alimentar para a População Brasileira”.

Procurada, a ONG Mover Helipa disse que não recebeu, por parte do TCU, “nenhuma notificação acerca de questões pertinentes ao Programa Cozinha Solidária, do qual é habilitada na condição de entidade gestora no estado de São Paulo”. “Assim que recebermos a notificação, procedermos com o envio da resposta na integralidade dos questionamentos e, conforme dito em todas as oportunidades possíveis, seguiremos à disposição para esclarecer todos os questionamentos que nos forem colocados”, diz em nota.

Um dos responsáveis pela representação no TCU, o senador Eduardo Girão (Novo-CE) afirma que a investigação aberta pelo tribunal “é fundamental para garantir a transparência e a correta aplicação dos recursos públicos”.

— As irregularidades apontadas na execução do Programa Cozinha Solidária, especialmente no repasse de verbas à ONG Mover Helipa sem a devida prestação de contas, são graves e precisam ser esclarecidas. A fiscalização rigorosa é essencial para impedir o desperdício de dinheiro público e garantir que os recursos cheguem a quem realmente precisa, sem interferências políticas ou desvios — declarou.

Desde a publicação das primeiras reportagens, o Ministério do Desenvolvimento Social, responsável pelo programa, afirmou ter suspendido pagamento de recursos para quatro ONGs, além de ter aberto uma investigação interna e estar colaborando com as apurações de outros órgãos de controle, como o TCU e a Controladoria-Geral da união (CGU), que também apura o caso.

Pasta pode pedir devolução de recursos

Procurado, o MDS disse que apresentou as explicações solicitadas pelo TCU e que, “constatada qualquer irregularidade quanto ao cumprimento do objeto pactuado e quanto à boa e regular utilização dos recursos públicos, as devidas medidas saneadoras serão adotadas”. A pasta justifica que essas medidas podem incluir pedido de devolução de recursos à União, bem como a inabilitação das cozinhas junto ao programa. “Vale destacar que o MDS já suspendeu a execução do termo de colaboração de quatro entidades até a finalização da fiscalização em andamento”, completa o ministério.

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