Após sua vitória, nesta segunda-feira (24), para liderar o Partido Conservador britânico, Rishi Sunak se tornará o primeiro chefe de Governo não branco no comando de um antigo país imperial que um dia governou a Índia, boa parte da África e muitas outras partes do planeta.
Seu triunfo ocorreu no início do Diwali, festival hindu que celebra a vitória do bem sobre o mal, o que para alguns com mentalidade religiosa foi uma coincidência escrita nas estrelas.
O primeiro-ministro indiano, o nacionalista hindu Narendra Modi, o parabenizou no Twitter e a toda a comunidade indiana do Reino Unido.
A vitória de Sunak, nascido no Reino Unido, também cruzou o Atlântico.
Ro Khanna, congressista democrata da Califórnia, lembrou que seu avô lutou durante anos contra o domínio britânico na Índia.
“É notável ver @RishiSunak, um britânico indiano de fé hindu, tornar-se primeiro-ministro no Diwali. Independentemente da política, é um passo simbólico de avanço em um mundo de colonizadores”, tuitou.
Para muitos asiáticos no Reino Unido e para o país em geral, no entanto, a chegada de alguém não branco ao cargo de primeiro-ministro é tão importante como sua crença econômica.
“É um grande dia para a comunidade indiana. Ainda mais no momento em que olhamos para trás e pensamos ‘como podemos avançar?’”, disse à AFP Kirtan Patel, analista financeiro, em visita a um templo hindu no distrito londrino de Neasden.
Anand Menon, professor de política do King’s College de Londres, considera que a etnia de Sunak é algo “realmente importante”, se bem que “o que me tranquiliza, na realidade, são os poucos comentários suscitados, no sentido que parece que normalizamos”, disse à BBC.
‘Rios de sangue’
Ainda que agora pareça “normalizado”, um primeiro-ministro britânico negro ou, simplesmente, não branco, teria sido inimaginável há alguns anos.
No final dos anos sessenta, muitos britânicos estavam de acordo com o agitador conservador Enoch Powell, que advertiu para uma guerra civil racial se continuasse a imigração maciça do antigo Império.
Quando Sunak nasceu, em 1980, não havia deputados de origem asiática ou africana no país desde a Segunda Guerra Mundial.
Alguns poucos foram eleitos para o partido de oposição trabalhista, mas os conservadores ainda não tinham nenhum em suas fileiras quando Sunak se graduou em Oxford em 2001.
Hoje, “a maioria das pessoas no Reino Unido diz, com razão, que a etnia e a fé do primeiro-ministro não deveriam importar”, garante Sunder Katwala, diretor do centro de estudos sobre demografia British Future.
“Vão julgar se pode controlar o caos em Westminster, ordenar as finanças públicas e restaurar a integridade da política”, disse, embora “não devemos subestimar esta importante mudança social”.
Oxford ainda manda
A acolhida de Sunak entre os sul-asiáticos é marcada pela percepção sobre outros políticos conservadores como Priti Patel, primeira ministra do Interior de etnia indiana do país.
Foi Patel quem decidiu enviar potenciais refugiados com passagem de ida para Ruanda, apesar de sua própria família ter fugido da perseguição sob o ditador ugandês Idi Amin.
Quando a nomeação de Sunak foi anunciada, Patel tuitou imagens de uma visita a um templo hindu pelo Diwali, declarando: “É um momento de autorreflexão, a família, os amigos e o serviço aos demais”.
“Um período de autorreflexão te faria bem”, foi um dos tuítes mais educados em reposta.
Com o tempo, os conservadores têm apoiado e impulsionado políticos de etnia indiana e a mulheres em maior medida que os trabalhistas e, frequentemente, estes superam seus colegas brancos em políticas de linha dura.
Isto pôde ser visto com a sucessora de Patel, Suella Braverman, também de família indiana, e cujas posturas afundaram as esperanças de um acordo de livre comércio entre o Reino Unido e a Índia para o Diwali.
Muitos observadores acreditam que o Partido Conservador carece de pontos de vista diferentes, dada a educação de elite – muitos em Oxford – que todos os primeiros-ministros dos pós-guerra receberam.
Ainda que a nomeação de Sunak “conte uma história importante sobre nossa sociedade”, sobre seu passado e seu futuro, “espero que seja consciente de que nem todo mundo teve seus privilégios na vida”, disse Katwala.
“A chegada de Rishi Sunak a Downing Street não transforma o Reino Unido em uma perfeita meritocracia”.