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domingo 19 de junho de 2022 às 10:32h

STF evita há 6 anos e meio julgamento sobre uso de banheiro por transexuais

JUSTIÇA, NOTÍCIAS


Embora tenha tomado decisões importantes para garantir direitos à comunidade LGBTI+, o STF paralisou há seis anos e meio segundo a jornalista Malu Gaspar, do jornal O Globo, um processo que vai determinar como será o uso de banheiros públicos por transexuais no Brasil.

O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Luiz Fux, em novembro de 2015, e até hoje não foi retomado.

A ação foi movida por uma mulher transexual impedida de usar o banheiro feminino por funcionários de um shopping de Santa Catarina e a decisão que for tomada nesse caso terá repercussão geral.

Ou seja: o entendimento da Corte valerá para todos os processos que abordam o mesmo tema nas diversas instâncias judiciais. Há pelo menos 778 ações suspensas aguardando o desfecho desse julgamento.

No episódio que gerou a controvérsia judicial sobre uso do banheiro em Santa Catarina, ocorrido em 2008, a costureira transexual Ama Fialho alegou ter sido impedida de usar o banheiro feminino por funcionários do Beiramar Shopping.

“Traveco” e “você tem que usar o banheiro dos homens porque você é isto aí” foram alguma das frases que ela teria ouvido dos funcionários.

O shopping alegou à Justiça que, por mais que Ama “se sinta como mulher”, a sua presença no banheiro feminino “certamente” provocaria “constrangimento no local”.

Para o professor Toni Reis, presidente da Aliança Nacional LGBTI+ e da Associação Brasileira de Famílias HomoTransafetivas, o caso pode parecer “insignificante” para algumas pessoas, mas para a população trans é fundamental ser respeitado ao usar o banheiro segundo a sua identidade de gênero.

Na primeira instância, a Justiça de Santa Catarina condenou o Beiramar Shopping a uma indenização de R$ 15 mil por danos morais. O shopping recorreu e o Tribunal de Justiça catarinense derrubou a indenização, entendendo não ter havido “dano moral, mas mero dissabor”. O caso chegou ao Supremo em outubro de 2014.

De lá pra cá, durante o governo do presidente Jair Bolsonaro, o Supremo enquadrou a homofobia e a transfobia como racismo e derrubou restrições impostas pela Anvisa à doação de sangue por homossexuais, mas outras questões sensíveis para a comunidade LGBTI+ ainda aguardam julgamento.

Mas o tema do uso do banheiro por transexuais nunca andou na Corte. Em seu pedido de vista, Fux explicitou o motivo. “Sobre essa questão há um profundo desacordo moral na sociedade. Me sinto no dever de ofício de pedir vista porque entendo que essa solução vai ter uma repercussão muito importante”, afirmou o ministro.

Quando Fux parou o julgamento, o placar estava de acordo com Malu Gaspar, em 2 a 0 a favor da costureira. Já tinham votado o relator do caso, Luís Roberto Barroso, e Edson Fachin, dois ministros que costumam ficar do lado do direito de minorias em julgamentos.

Barroso manteve a condenação imposta contra o shopping, dizendo que os transexuais têm direito a serem tratados socialmente de acordo com a sua identidade de gênero, inclusive na utilização de banheiros públicos.

“Destratar uma pessoa por ser transexual é como discriminar alguém por ser negro, judeu, índio ou gay. É simplesmente injusto, quando não perverso”, disse o relator do caso, Luís Roberto Barroso, ao votar para manter a indenização de pé.

“Toda vida desperdiçada, toda violação à dignidade de alguém, é uma perda para toda a humanidade. O projeto civilizatório, a causa da humanidade é estender a mão a quem precisa.”

Na avaliação de Paulo Iotti, autor da ação do partido Cidadania que resultou na criminalização da homofobia, é “urgente” o término desse julgamento.

“O pedido de vista já ultrapassou qualquer razoabilidade há muito tempo. Não há razão para não continuar o julgamento. O processo tem relação com a dignidade das pessoas trans, de terem sua identidade de gênero plenamente respeitada e não serem desumanizadas por estereótipos fruto de espantalhos irreais”, afirmou.

Outra ação, que está parada desde o final do ano passado, é a da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), que pede que os órgãos públicos adaptem formulários e cadastros de modo a permitir o registro de crianças pertencentes a famílias com dois pais ou duas mães.

Ao invés de “mãe” e “pai”, a Declaração de Nascido traria os campos “filiação 1” e “filiação 2”, por exemplo.

O relator da ação é o ministro Gilmar Mendes, que ainda não liberou o caso para análise dos colegas.

No julgamento da ação movida por Ama Fialho, Barroso destacou números do Projeto de Monitoramento de Homicídios Trans (Trans Murder Monitoring Project), que apontavam que entre janeiro de 2008 e dezembro de 2014, haviam sido registrados 1.731 casos de homicídios de pessoas trans em todo o mundo, sendo que 681 (cerca de 40%) deles no Brasil.

“Não por acaso, a expectativa de vida desse grupo é de apenas cerca de 30 anos, muito abaixo daquela apontada pelo IBGE para o brasileiro médio, de quase 75 anos”, afirmou o ministro.

Em 2021, 140 assassinatos de pessoas trans foram registrados no Brasil, segundo estudo da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), realizado junto com as universidades Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Federal de São Paulo (Unifesp) e Federal de Minas Gerais (UFMG).

Os Estados de São Paulo (25 assassinatos), Bahia (13)  e Rio de Janeiro (12) lideram o ranking da violência contra pessoas trans. Em 2019 e em 2020, foram registrados 124 e 175 assassinatos, respectivamente, em todo o território nacional.

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