“Minha voz não é só minha voz, é a voz de todas que sofrem caladas”. O trecho do poema “Por Marielle e todas nós”, declamado pela poetisa Isabel Guimarães, abriu a sessão regimental realizada na tarde desta sexta-feira (22), no Plenário Cosme de Farias, em homenagem ao Dia Internacional da Mulher – celebrado em 8 de março. A atividade foi idealizada pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, da Câmara de Salvador, presidida pela vereadora Ireuda Silva (PRB).
Com o tema “Feminicídio – O impacto causado à sociedade e os caminhos para eliminação”, o evento reuniu representantes do Poder Público, ativistas e vítimas de agressões. Após execução do Hino Nacional pela banda da Guarda Municipal, uma encenação realizada por integrantes do Grupo de Teatro da Polícia Militar ilustrou a importância do combate à violência doméstica através da denúncia.
Com auxílio de slides, a coordenadora de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde, Mônica Neri, apresentou números alarmantes. Conforme a pasta federal, de 2011 a 2017, 1,5 milhão de casos foram notificados (através da central de atendimento – 180), posicionando o Brasil em 5º na estatística negativa de violência contra o gênero feminino.
Ao discursar na tribuna, Ireuda Silva alertou para a necessidade de atenção a mudanças de comportamento das mulheres próximas. “O que precisamos, independente de ser homem ou mulher, é ter esta sensibilidade. Fortalecer a rede é uma responsabilidade de todas nós, da adolescente que vai casar e ter filhos, da mãe, do homem que tem irmãs ou não tem irmãs, é preciso cuidar das mulheres”, ressaltou.
A mesa da sessão contou com as presenças das vereadoras que integram o colegiado: Cátia Rodrigues (PHS), Marcelle Moraes (sem partido), Marta Rodrigues (PT), Aladilce Souza (PCdoB) e Ana Rita Tavares (PMB).
Rede de proteção
Procuradora do Ministério Público da Bahia (MP-BA), a promotora Sara Gama apresentou dados de funcionamento referentes ao feminicídio, desde que o termo foi instituído por lei, em 2015. Na tribuna, ela lembrou de casos de grande repercussão, destacando o crescente número de vítimas. “Um estudo feito em São Paulo indica que a maioria dos casos acontece durante a semana, quando o agressor não está alcoolizado, para não alegar que não sabia o que estava fazendo”, frisou.
Representando a Secretaria Estadual de Políticas para as Mulheres, pasta responsável pela campanha “Respeite as Mina”, Cátia Santos destacou a necessidade de compartilhar informações para fortalecer a rede de proteção, principalmente nos municípios mais distantes. “Esse conhecimento empodera, potencializa a rede primária, aquela que socorre as vítimas”, afirmou.
Titular da Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam/Periperi), a delegada Simone Moutinho informou que em 2019 já foram instaurados mais de 900 inquéritos. “Todo feminicídio um dia foi uma agressão de natureza leve”, alertou.
Superação
Três relatos marcaram o público, que lotou o plenário. Ana Mendes, Girlene Almeida e Eva Luana compartilham o mesmo trauma causado pela violência oriunda do machismo.
Após 15 anos de agressões, Ana disse ter encontrado no Centro de Atenção Loreta Valadares, na Cidade Baixa, um novo sentido para a vida. “Lá encontrei pessoas que me deram amor, carinho e me ajudaram a ser o que sou hoje. Quebrar o ciclo da violência não é fácil, mas estou aqui”, contou comovida.
Já Girlene, representando o grupo Papo de Mulher, trouxe outra triste realidade: casos de abusos sexuais em sanatórios.
Outra vítima da violência doméstica, a estudante Eva Luana falou de superação. “Na condição de menina, não tive tempo de amadurecer totalmente, alguns dizem até que amadureci cedo demais”, constatou. Após oito anos sendo abusada pelo padrasto, Eva aponta: “Fui resgatada porque gritei e superei meus traumas”.
Durante a sessão regimental, diversas mulheres foram homenageadas com placas de honra por conta de suas atuações na sociedade.
Ainda integraram a composição da mesa, a desembargadora Nágila Brito; a secretária municipal de Políticas para a Mulheres e vereadora licenciada Rogéria Santos; a coordenadora da Superintendência de Prevenção à Violência da Guarda Civil Municipal, Mônica Garcia; a vice-coordenadora do grupo Mulheres do Brasil, Virginia Paschoal; e a secretária-geral da Comissão do Direito da Mulher da OAB-BA, Fernanda Barbosa, que expressou: “Falar de feminicídio é mais que necessário, e esta Casa e a OAB não podem se calar”.