Em uma reedição do que aconteceu meses atrás, a Câmara e o Senado iniciaram nas últimas semanas uma nova disputa pelo protagonismo na agenda de votações. Desta vez, a briga envolve principalmente o projeto que regula o mercado de carbono, a proposta que altera regras para a participação de militares na política, e a minirreforma eleitoral.
A Câmara tenta puxar para si o início da tramitação do projeto que trata da regulação do mercado de carbono no país. O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), tem alegado que, já que o Senado está com a reforma tributária, os deputados deveriam se debruçar sobre a pauta verde, que ele anunciou como prioridade do semestre. As informações são de Raphael Di Cunto, Julia Lindner, Marcelo Ribeiro e Caetano Tonet, do jornal O Globo.
A agenda, no entanto, também é vista como uma das bandeiras do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e está em estágio mais avançado na Casa. O próprio governo demonstrou simpatia com a possibilidade de propostas suas para o tema serem incorporados no parecer da relatora no Senado, Leila Barros (PDT-DF).
O início da tramitação é importante porque quem começa as discussões do projeto de lei também dá a palavra final.
Leila tem evitado entrar no embate com Lira. Por enquanto, a orientação de pessoas ligadas a ela é não tensionar o clima. Há uma avaliação de que, por ora, a situação está sob controle.
Leila apresentou seu relatório na última semana. Na ocasião, a parlamentar disse que o texto foi “fruto de um consenso” com o governo.
O projeto para regular o mercado de carbono da Câmara está parado desde 2021, aguardando troca da relatoria, enquanto o do Senado já está mais adiantado na Comissão de Meio Ambiente (CMA). Se passar na CMA, o texto segue direto para a Câmara.
Por ora, a relatora na Câmara é a deputada bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP), o que é visto com resistência pelo governo, mas Lira se comprometeu com a escalação de outro nome para o posto. O deputado Aliel Machado (PV-PR) é o mais cotado.
No Congresso, deputados lideram discussão sobre a minirreforma eleitoral
Deputados relataram incômodo com o movimento do governo em dar preferência por enviar suas sugestões ao Senado.
Há ainda a divergência sobre o formato do texto. Deputados alertam que a versão apresentada pelo governo ao Senado deixa muitos pontos para serem regulamentados por decreto. Eles destacam que isso deixaria o campo aberto para que governos menos comprometidos com a pauta ambiental alterassem a legislação com mais facilidade. Representantes do setor compartilham a mesma preocupação.
Outro ponto sensível é a PEC dos militares, que gerou desconforto inclusive entre setores do PT pelo fato de o governo ter priorizado o Senado para começar a tramitação.
Já havia um texto sobre o tema na Câmara relatado pelo petista Carlos Zarattini (SP), mas a avaliação do Palácio do Planalto foi de que a proposta seria muito ampla.
Por isso, o governo incumbiu seus líderes no Senado e no Congresso de coletarem assinaturas para uma nova PEC, o que já está ocorrendo. A relatoria do texto será definida pelo presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Davi Alcolumbre (União-AP). O texto começará a tramitar pelo colegiado.
Ainda assim, no Senado existe um sentimento de que o texto sobre os militares deve sofrer alterações na Câmara, que já indicou intenção de deixar sua marca. Uma das modificações esperadas é incluir os policiais militares.
O presidente do Senado tem sido pressionado a defender a autonomia da Casa e a assumir maior protagonismo em temas relevantes. No caso do projeto da reforma do Código Eleitoral, Pacheco pediu ao relator Marcelo Castro (MDB-PI), que não apresentasse seu parecer em julho, quando o texto ficou pronto.
A ideia de Pacheco era esperar até que Castro se reunisse com Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), para receber sugestões sobre combate às fake news. O encontro não ocorreu até hoje.
Com isso, a avaliação é que o Senado deu margem para que a Câmara liderasse a articulação pela proposta mais uma vez.
Os deputados tomaram frente na discussão sobre a questão eleitoral, através de um grupo de trabalho, para viabilizar ao menos o que fosse de consenso até outubro, quando vence o prazo das alterações para o pleito de 2024.
Há cerca de duas semanas, Marcelo Castro esteve na casa do presidente do Republicanos, Marcos Pereira, e outros presidentes de partidos. E sugeriu incluir no seu texto os pontos prioritários para as siglas para o próximo ano e facilitar a tramitação.
A equipe de Castro também tem participado das reuniões do grupo de trabalho na Câmara em busca desse entendimento.
Na semana passada, o relator do grupo de trabalho na Câmara, Rubens Pereira Júnior (PT-MA), admitiu a possibilidade de o conteúdo construído pelo colegiado ser absorvido pelo relatório de Castro.
Alguns senadores reclamam que o Senado tem “dormido no ponto” e “cochilado” na condução de propostas relevantes.
Nos bastidores, aliados de Lira avaliam que a postura menos combativa de Pacheco reflete pretensões do mineiro para seu futuro. Para eles, o senador do PSD “já atua sonhando com uma vaga no Supremo [Tribunal Federal]”. Aliados do presidente do Senado ainda creem que ele poderia ser uma opção para a Corte no futuro. Outra alternativa seria disputar o governo de Minas Gerais.
Há também a leitura de que Lira trabalha para concentrar o maior número de realizações em sua segunda gestão à frente da Mesa Diretora da Câmara, pois espera chegar ao Senado “com histórico que o coloque em um posto de destaque na Casa”. O alagoano deve concorrer ao cargo de senador em 2026.