O Senado vai votar nos próximos dias uma proposta que inclui na Constituição a criminalização do porte e da posse de drogas em qualquer quantidade, com algumas mudanças em relação à Lei das Drogas.
O que aconteceu
A PEC é uma reação ao STF. O Supremo Tribunal Federal retomou o julgamento sobre a descriminalização da maconha. Os ministros analisam a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, que estabelece a figura do usuário e o responsabiliza de maneira diferente do traficante.
O julgamento foi suspenso conforme Gabriel Máximo, do Uol, em 6 de março por um pedido de vista —ou seja, mais tempo para análise— do ministro Dias Toffoli. O placar está em 5 votos a 3 para descriminalizar a maconha para consumo pessoal. Entretanto, já há maioria na Corte para fixar uma quantidade que diferencie o traficante do usuário.
O texto em análise no Senado é de autoria do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A PEC recebeu 23 votos favoráveis e quatro contrários na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado e teve a relatoria de Efraim Filho (União Brasil-PB).
Agora tem de passar pelo plenário e ter votos favoráveis de 49 senadores, ou seja, 3/5 da Casa, em dois turnos de votação. Depois, é analisada pela Câmara. Se for aprovada também por 3/5 dos deputados, ou seja, 308, em dois turnos, vai à promulgação.
O que muda em relação à Lei de Drogas
O texto é simples e curto. Ele acrescenta ao artigo 5º da Constituição que considera crime o porte e a posse de drogas, independentemente se para consumo pessoal ou tráfico. O artigo 5º é um dos mais importantes da Carta Magna e trata de direitos e garantias fundamentais dos cidadãos. A Lei de Drogas (11.343/2006) já previa essa criminalização.
A lei considerará crime a posse e o porte, independentemente da quantidade, de entorpecentes e drogas afins sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.Nova redação dada pela PEC das Drogas ao artigo 5º da Constituição
Não define quantidade de drogas para diferenciar o usuário do traficante. Essa indefinição já existia na norma de 2006. O relator da PEC acolheu uma mudança sugerida pelo líder da oposição, senador Rogério Marinho (PL-RN), para manter a distinção a partir das condições encontradas no momento da apreensão.
Já a Lei de Drogas delega ao juiz do caso a responsabilidade para definir se a droga é destinada ao consumo pessoal ou tráfico. Para isso, o magistrado deve considerar a quantidade, a natureza da droga, sob quais condições ocorreu a apreensão, além das circunstâncias sociais e pessoais, a conduta e os antecedentes do envolvido.
Críticas à lei. Para Cristiano Maronna, diretor do centro de pesquisa Justa e doutor em direito penal pela USP (Universidade de São Paulo), o Senado ignora na discussão da PEC outras questões em relação à política de drogas, como o padrão das abordagens e o perfil dos presos, em sua maior parte composta por pretos e pobres.
A PEC define ainda que ao usuário serão aplicadas penas alternativas, sem a necessidade de prisão. A diferença também já está na norma de 2006, que estabelece como medidas punitivas ao consumidor pessoal a “advertência sobre os efeitos da droga, prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo”.
O último trecho da proposta em análise no Senado é uma novidade. Além das penas alternativas, diz que o usuário será submetido a “tratamento contra dependência”. Especialistas veem que essa redação pode abrir brecha, inclusive, para internações compulsórias de dependentes químicos.
O Senado está de alguma forma chancelando o estado de coisas que existe hoje, que é uma situação que promove muitas injustiças. Não só condenar usuários como traficantes, mas dá carta branca para a letalidade policial, que é o que a gente está assistindo em várias operações voltadas contra o tráfico de drogas.Cristiano Maronna, doutor em direito penal