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Antonio Batista: "O mercado é como um grande funil, poucos resistem" - Foto: Homero Xavier
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domingo 21 de abril de 2024 às 16:03h

“Sem reformas, o atual crescimento do PIB não se sustenta”, diz Antonio Batista, da Fundação Dom Cabral

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Doutor em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Antonio Batista está há mais de 35 anos na Fundação Dom Cabral (FDC), a pioneira escola de negócios do Brasil, fundada em 1976, e desde então uma das mais prestigiadas do setor no País. Foi eleita a sétima melhor do mundo pelo ranking de educação executiva do jornal Financial Times (2023) e recebe anualmente 27 mil profissionais, entre executivos, empresários e gestores públicos que buscam se aprimorar nos programas educacionais, de capacitação e desenvolvimento de lideranças do mercado nacional e internacional. Presidente-executivo da Fundação desde 2016, Batista falou à revista Dinheiro sobre as oportunidades e os riscos para empresas e gestores diante do cenário econômico brasileiro de hoje e do futuro. Segundo ele, o ambiente seguirá se movimentando em torno de pautas relacionadas a temas ambientais, de inclusão e do avanço tecnológico.

DINHEIRO ­— Para muitos investidores, empresários e executivos brasileiros, o ano de 2023 foi dedicado a arrumar a casa, sobretudo em função da troca de governo. O que virá daqui em diante?

ANTONIO BATISTA — Nos últimos três anos, o mundo corporativo passou por uma transição ampla, acelerada pela pandemia. Neste ano, a gente observa três grandes impactos, como furacões no segmento, que exigem mudanças rápidas por parte das organizações. A questão ambiental é a primeira delas, impulsionada principalmente pela alteração climática e pela economia de baixo carbono. A segunda é a inclusão, que no Brasil pode ser associada diretamente ao social. Por fim, a adoção de tecnologia, que apresenta melhorias para toda a estrutura empresarial. Essas também são tendências para os próximos anos e décadas. Com isso, a revisão do modelo de negócios, criação novos valores e o reposicionamento são fatores importantes para empresas e executivos. O lema é: ou se adapta, ou morre.

Com a alta de 2,9% do PIB em 2023 e taxa de desemprego em queda, qual a estratégia para aproveitar esse cenário?
É um cenário positivo e que aponta para o crescimento do PIB em torno de 2% em 2024. Acredito que poderia ser maior, mas não é pouca coisa olhando para o tamanho da nossa economia. Para sustentar esse crescimento, é necessário implementar diversas reformas. O País depende delas para se tornar mais competitivo, gerar empregos e também aumentar a inclusão. Nós sabemos o que fazer, mas falta coragem política. Sem reformas e com a dificuldade de queimar capital político para executá-las, as oscilações de desemprego e inflação serão constantes. Sem reformas, o atual crescimento do PIB não se sustenta. Na iniciativa Imagine Brasil, da FDC, debatemos o florescimento sustentável da nação através do crescimento econômico pela produtividade, prosperidade ambiental, tema no qual podemos ser protagonistas, governança colaborativa entre os três setores e inclusão social, reduzindo a desigualdade.

Quais as principais oportunidades e as maiores ameaças para as empresas?

O momento econômico atual é muito favorável para as organizações empresariais. É preciso aproveitar. O agronegócio, por exemplo, é um setor no qual toda a cadeia envolvida tem muita oportunidade de crescimento. Além disso, se acontecer a distribuição de renda média, o nível de consumo voltará a ser muito alto. Não faltam oportunidades, pois temos os ativos que o mundo precisa, como energia, alimentos, meio ambiente e também um sistema democrático, relações estáveis e sem conflitos. Tudo isso me leva a afirmar que o futuro está aqui e com isso precisamos de mão de obra qualificada à medida que a população está envelhecendo. Quem pensa em sair do País está deixando para trás boas oportunidades e optando por subempregos em outros países. Vale destacar que todas as vantagens estão atreladas às reformas tributária, trabalhista, administrativa e de saneamento. Esse conjunto pode abrir portas, como investimentos estrangeiros.

“Não faltam oportunidades, pois temos os ativos que o mundo precisa, como energia, alimentos, meio ambiente e também um sistema democrático, relações estáveis e sem conflitos”

O número de profissionais que vivem no Brasil e trabalham para o exterior aumentou 491% entre 2020 e 2022, conforme pesquisa da Husky. É um problema?

Devemos olhar atentamente para esse movimento, já que caminhamos para um déficit demográfico e esses profissionais são necessários para o desenvolvimento do nosso mercado. Estamos perdendo muita mão-de-obra qualificada com o aumento de brasileiros que prestam serviços para o exterior. É preciso que os setores público e privado adotem medidas para incentivar o trabalho em território nacional.

E a internacionalização das empresas brasileiras? É uma tendência?

Não. É uma necessidade quase imperativa de se internacionalizar. Somos um mercado extremamente fechado. Os empresários, geralmente, não almejam oportunidades lá fora. Temos de mudar isso e abrir o mindset dos executivos. As startups são exemplos desse comportamento: enquanto no exterior elas são criadas para o mundo, no Brasil esse modelo é feito para o nosso próprio mercado.

Quanto às startups brasileiras, onde elas estão e para onde devem ir?

O cenário atual das startups é difícil, como sempre foi. A dureza da vida desse modelo de negócio não é um fenômeno novo, a imensa maioria ficou e ainda vai ficar pelo caminho. O desafio é construir uma preparação permanente para atender a necessidade do cliente, muito mais do que ser apenas uma marca que gera paixão pela sua tecnologia e por seu produto. Para sobreviver aos desafios, a startup tem de ser flexível e adaptável às transformações do ambiente de negócios. Não é uma tarefa simples sustentar uma empresa por longos anos, e para isso, a preparação constante é essencial, especialmente para startups.

“Não podemos esperar anos para compreender de fato a inteligência artificial e outras novidades. Isso significa perder a corrida, perder o mercado. Temos de investir em educação”

Um levantamento recente da FDC mostra que a maior parte das startups da América Latina com foco em impacto social está no Brasil. Isso é uma resposta direta para a desigualdade social do País?

Totalmente. O Brasil é um dos países com mais organizações do terceiro setor, porque temos grandes vácuos e carências no campo social, onde o poder público não chega e as iniciativas privadas não dão conta, ou não solucionam porque não são de responsabilidade delas. Sendo assim, há muita oportunidade e espaços para empreendimentos com impacto social. É sintomático.

A inteligência artificial tem tomado conta dos debates mundo afora. No Brasil, como gestores e empresas olham para essa tecnologia?

Com muito medo, assustados, de forma especulativa e incipiente. A IA veio para ficar e já é uma das grandes transformações tecnológicas da história, mudando práticas internas e externas de empresas, como processamento de dados e atendimento ao cliente. As grandes companhias são responsáveis por puxar esse movimento, trazendo novidades no uso da IA. Já as pequenas e médias estão muito aquém e despreparadas. A questão é que a IA está ganhando mais e mais velocidade e seu aceleramento desenfreado requer adaptação dos trabalhadores.

Como avançar nessa adaptação?

Pesquisas recentes mostram que a inserção de tecnologia pode criar mais cargos do que destruir. Não se trata da substituição de trabalhadores pela inteligência artificial e sim da adaptação de mão de obra, ou seja, a alfabetização digital do profissional, que acontece de maneira mais lenta se comparada ao ritmo da tecnologia. Assim, faltam pessoas preparadas para administrá-la. Isso é um problema para o Brasil, pois não podemos esperar anos para compreender de fato a IA e outras novidades. Isso significa perder a corrida, perder o mercado. Temos de investir em educação para um desenvolvimento qualificado e rápido.

Na corrida pela inovação, o que as empresas têm deixado para trás?

Segundo Peter Drucker [escritor, professor e consultor administrativo austríaco], o marketing e a inovação são dois fatores fundamentais para um negócio. E, nessa corrida, o que as empresas têm deixado para trás é justamente a parte organizacional para alcançar a inovação, feita de forma desordenada, sem políticas e planejamentos. Muitas vezes o resultado considerado inovador vem do acaso. Exceto nas startups, cuja essência é a inovação, falta às empresas disciplina nos investimentos, recursos e uma equipe sólida para atingir resultados inovadores.

Quem tem vencido essa corrida?

As empresas nascentes do digital possuem a vantagem do letramento nesse ambiente e isso faz a diferença na hora de inovar e buscar soluções num mundo que se transformou em um grande algoritmo. Apesar disso, as empresas tradicionais, além de serem capazes, são resilientes e possuem uma bagagem muito grande, que pode servir de exemplo para as novas companhias, seja na tomada de decisão ou centralidade do cliente. Fato é que quem souber ler as demandas do mercado de maneira ágil e adaptar o empreendimento à essa leitura, sobreviverá. O mercado é como um grande funil, poucos resistem.

Outro tema muito presente nas empresas tem sido o das práticas no âmbito do ESG. Ainda há mais discurso que ação?

Sim, há mais discurso porque as empresas podem fazer muito mais nesse sentido. Porém, isso não me preocupa. Acredito que toda ação começa no discurso. Geralmente, as companhias iniciam as práticas de ESG por conveniência e depois evoluem para a convicção das mesmas. De qualquer forma, se não for por conveniência e convicção, será por coerção.

Como tem sido aplicada a diversidade em cargos de liderança?

Pode-se notar avanços, sobretudo em multinacionais, mas ainda tem muito chão. Toda sociedade precisa estar atenta para estimular e cobrar cada vez a presença de uma liderança diversa. No caso das pequenas e médias empresas, isso não é nem considerado. Por isso, o setor público e as grandes companhias têm um papel importante na busca por igualdade. Quando grandes agentes da cadeia se movimentam, eles geram pressão em todo o resto. E o ecossistema, sem dúvida, é atingido por essas mudanças positivas.

Quais os pilares para o crescimento sustentável de um negócio?

Um bom sonho, uma boa governança para estruturar e implementar esse sonho e o investimento em pessoas. O último talvez seja o mais importante. Parece clichê, mas é preciso lembrar que uma empresa é feita por pessoas, ela nunca será maior que o time, pois o time define o tamanho da instituição. Na FDC, trabalhamos para estimular modelos de negócios bem estruturados e que valorizam esses pilares. Tudo isso através de uma ferramenta essencial: a educação.

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