Cidadãos de comunidades próximas ao Rio Salitre, na região do Campo Formoso (407 km de Salvador), estão enfrentando dificuldades com a desertificação do rio. No povoado da Lagoa Branca, os peixes endêmicos da região, como curimatá, mandi, dourado e piau-verdadeiro, não existem mais. Isso porque o trecho do rio, vizinho da localidade, secou.
A desertificação de Campo Formoso, atinge uma área de 80 km² onde residem centenas de famílias quilombolas, pequenos agricultores e comunidades tradicionais de fundo de pasto.
A degradação ambiental é marcada por solos improdutivos que obrigaram moradores a migrar. E o afluente do São Francisco não é o único exemplo do fenômeno. É o que aponta a reportagem da Folha de São Paulo.
Segundo a publicação, estudos apontam que ao menos seis comunidades rurais do chamado sertão do São Francisco estão com segurança hídrica e alimentar ameaçadas pela desertificação severa.
Uma das possíveis causas da seca do rio é a construção de 35 barragens na bacia hidrográfica do Médio Salitre. Outros indicativos para o dano a existência do rio é o desmatamento da caatinga, sobrepastoreio e agricultura irrigada incompatível com os limites naturais do bioma, dizem os pesquisadores.
“Em Campo Formoso, a desertificação cárstica é um fenômeno jovem, mas perigoso”, explica Jémison Santos, professor da Uefs (Universidade Estadual de Feira de Santana).
O termo vem de “carste”, um dano considerado irreversível que ocorre quando os ecossistemas tornam-se espécies de paisagens rochosas e desoladas. Um dos exemplos mais conhecidos no mundo são os desertos de Guangxi, na China.
“Funciona como uma espiral descendente. Um problema puxa outro e perde-se o controle do processo com a biota cada vez mais vulnerável”, completa Santos, que estuda o carste na Bahia. No estado, há 289 áreas suscetíveis à desertificação.
De acordo com dados do Sistema de Monitoramento e Alerta para a Cobertura Vegetal da Caatinga (Sima), da Universidade Federal de Alagoas, cerca de 13% da região Nordeste já está transformada em deserto.
O PAN-Brasil (Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca), principal iniciativa de enfrentamento da desertificação que o país já teve, está paralisado há 13 anos.
Procurado pela reportagem da Folha, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima informou que um novo plano será lançado em 2023. Segundo a pasta, ele incluirá ações relacionadas à agricultura resiliente ao clima, à agroecologia e à convivência com o semiárido.
“O problema é regional, mas o impacto é nacional. Se não resolver, vai piorar muito. O plano vai precisar ser repactuado”, indica o pesquisador José Roberto de Lima, ex-coordenador do PAN-Brasil, no MMA.
Outra característica que se tornou presente na paisagem da região de Campo Formoso são as voçorocas, buracos que chegam a cinco metros de profundidade.
“Minha mãe comprou o sítio na década de 1990 e já tinha voçoroca, mas o problema só piorou. Depois, veio a algaroba. Sonho em ver o Salitre correr de novo, mas, antes de tudo, sonho em acabar com a algaroba”, diz Joselina Pimentel, presidente da associação quilombola local. Foram mapeadas 734 linhas erosivas, entre sulcos, voçorocas e ravinas.