O projeto é assinado pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e determina limites de quanto os parlamentares poderão destinar por meio das emendas de relator, previstas em R$ 19,4 bilhões em 2023. Pelas regras, 80% do valor serão distribuídos proporcionalmente, de acordo com quantos representantes a sigla elegeu em outubro, e caberá ao líder do partido fazer a divisão interna, definindo quanto cada deputado e senador poderá indicar. A proposta reserva ainda uma fatia menor, de 7,5%, para que o presidente do Senado, e outros 7,5% para que o da Câmara, decidam para onde enviar. A prerrogativa de indicação dos 5% restantes ficaria com o relator-geral do Orçamento e com o presidente da Comissão Mista do Orçamento do Congresso. As informações são de Bruno Góes, Gabriel Sabóia, Fernanda Trisotto e Mariana Muniz, do O Globo.
Seguindo o critério da proporcionalidade partidária, o PL, que elegeu 99 dos 513 deputados federais nas últimas eleições, teria direito a R$ 2,1 bilhões do total de recursos da Câmara. Com 68 parlamentares eleitos, o PT, que conseguiu a segunda maior bancada, ficaria com R$ 1,44 bilhão, seguido pelo União Brasil. O partido oriundo da fusão entre DEM e PSL elegeu 59 deputados, obtendo assim uma fatia correspondente a R$ 1,2 bilhão. Na sequência, o PP terá R$ 990 milhões, já que contará com 47 parlamentares a partir do ano que vem.
O partido de Bolsonaro também ficaria com o maior montante destinado ao Senado. Com o resultado das eleições deste ano, a sigla passou a ter 14 dos 81 senadores — ou seja,16% da bancada a partir de 2023. A fatia daria à legenda direito a R$ 720 milhões. Com uma bancada de 11 senadores, o PSD pode dispor de R$ 611 milhões. Na sequência, o MDB, com dez parlamentares, contará com R$ 550 milhões, valor idêntico ao do que o União Brasil terá à disposição. Já o PT, que elegeu o quarto maior número de senadores, pode embolsar R$ 490 milhões.
Pela divisões previstas no projeto, o PL de Bolsonaro, um dos expoentes do Centrão, ficaria responsável, assim, por R$ 2,8 bilhões — somando as bancadas na Câmara e no Senado. O PT do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, por sua vez, teria ao seu dispor R$ 1,89 bilhão. Desde que Lula atacou duramente o mecanismo durante a campanha, petistas e integrantes do futuro governo vêm mudando o tom, amenizando as críticas e defendendo uma solução pelo próprio Congresso.
Na justificativa do projeto ao STF, os parlamentares afirmam que a proposta tem o “objetivo de conferir ainda mais transparência e implementar critério de impessoalidade para formalização da indicação”.
— Acreditamos que com diálogo e entendimento podemos chegar à modulação que o Supremo quer sem ter a necessidade de determinar a inconstitucionalidade das emendas — afirmou o relator do Orçamento do ano que vem, senador Marcelo Castro (MDB-PI).
Dinheiro “patrocinado”
Segundo o senador, não haverá mais a possibilidade de recursos serem enviados para prefeituras ou outras instituições por meio das emendas sem que um parlamentar seja responsável.
— O prefeito de um município qualquer do Brasil fazia uma reivindicação, um relator atendia e aí ficava aquela dúvida. Hoje não vai poder mais: mesmo que o prefeito faça a solicitação, ele terá que ir atrás de um deputado ou de um senador para o parlamentar dizer “bota isso aqui, sou eu que estou patrocinando” — pontuou.
Ao instituir regras de transparência, com a proibição da omissão das indicações, a ideia dos parlamentares é que o Judiciário não proíba essa forma de emenda.
— O Supremo Tribunal Federal vai saber tomar a melhor decisão para o momento em que a gente precisa de harmonia entre os Poderes, cada um no seu quadrado — disse o deputado Elmar Nascimento (BA), líder do União Brasil e um dos principais nomes do Centrão.
A mudança de tom do PT coincide com a necessidade de aprovação da chamada PEC da Transição na Câmara, que abrirá espaço no orçamento para que Lula cumpra promessas eleitorais, como o valor de R$ 600 do Bolsa Família.
— Penso que o ideal é que o Congresso, em primeiro lugar, e, eventualmente, o próprio Supremo encontrem uma forma de pôr fim a essa anomalia de sigilo quanto à aplicação de verbas públicas. O Congresso deveria buscar isso com urgência — analisou Flávio Dino, futuro ministro da Justiça e Segurança Pública, em entrevista ao GLOBO no domingo.
As ações que voltarão a ser analisadas hoje pelo Supremo questionam a forma como uma parcela considerável do Orçamento da União é enviada para obras e serviços em redutos eleitorais de parlamentares sem que eles sejam identificados, usando indicações em nome do relator-geral do Orçamento. Na prática, o formato permite que o governo contemple deputados e senadores aliados com mais recursos em troca de apoio em votações de interesse do Palácio do Planalto.
O mecanismo também blinda os parlamentares caso sejam identificadas irregularidades na aplicação destes recursos, uma vez que não é possível saber quem foi o responsável por enviá-lo. A Controladoria-Geral da União (CGU), por exemplo, apontou no ano passado que tratores adquiridos pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco (Codevasf) com recursos destinado via orçamento secreto foram comprados com sobrepreço.
Voto de Rosa Weber
O julgamento do Supremo será retomado com o voto da relatora e presidente do Supremo, ministra Rosa Weber. Nos bastidores da Corte, a expectativa é que ela apresente um longo voto considerando inconstitucional o formato pelo qual emendas de relator, identificadas pelo código RP-9, são aplicadas atualmente, mas abrindo espaço para que o Congresso apresente regras claras de transparência.
Rosa já havia votado neste sentido no ano passado, quando suspendeu de forma liminar os pagamentos até que o Congresso identificasse os parlamentares responsáveis pela destinação dos recursos de anos anteriores e apresentasse uma solução para dar transparência às futuras indicações. A determinação, porém, foi cumprida apenas em parte.
As ações que estão sendo julgadas pelo Supremo foram propostas em 2021 por partidos de oposição ao governo Bolsonaro: Cidadania, Rede, PV e PSOL.
Na sessão que iniciou a análise sobre a legalidade do orçamento secreto, a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, reclamou das críticas que foram feitas ao Congresso durante as sustentações orais. Segundo Lindôra, que repetiu a argumentação da PGR encaminhada ao Supremo, não é possível apontar erros na condução do orçamento público apenas “porque a mídia publicou”.
Ao falar em nome do governo de Jair Bolsonaro, a Advocacia-Geral da União (AGU) também saiu em defesa das emendas de relator e disse que as formas adotadas pelo Congresso para dar publicidade aos autores de indicações do orçamento secreto estão em “constante aperfeiçoamento”.