A mais importante batalha política em curso hoje não é entre o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal, mas dentro da Procuradoria Geral da República, a PGR. Responsável pelos inquéritos envolvendo crimes e autoridades federais, a PGR tornou-se um campo minado.
Segundo a revista Veja, de um lado está o procurador geral Augusto Aras, indicado por Jair Bolsonaro e que quer o apoio do presidente para virar ministro do STF. Do outros, os procuradores que montaram a Operação Lava Jato. Quem vencer essa briga terá o poder de política sobre os políticos.
Na última sexta-feira (26) os quatro procuradores dedicados às investigações da Lava Jato renunciaram em protesto ao que chamaram tentativa de interferência ilegal nas suas investigações. A mando de Augusto Aras, a subprocuradora Lindora Maria Araújo viajou a Curitiba e, segundo os procuradores da Lava Jato, tentou copiar bancos de dados sigilosos das investigações sem apresentar pedidos formais. A corregedoria da PGR abriu investigação sobre o caso.
Um dos motivos da ida de Lindora foi a descoberta de que desde 2016, todos os telefones da Lava Jato são gravados, a maior parte do tempo sem uma autorização judicial. A Lava Jato confirmou o fato, mas justificou que apenas os ramais institucionais eram gravados para apurar ameaças aos procuradores. A justificativa não convenceu os chefes da PGR.
Desde a saída do ex-juiz Sergio Moro do governo Bolsonaro, a relação dos procuradores da Lava Jato com Augusto Aras é conturbada. O procurador Aras negocia a delação premiada de um ex-operador da Odebrecht que denunciou ter recebido um pedido de suborno de advogado amigo de Sergio Moro para fechar um acordo com os procuradores de Curitiba. Moro descartou a denúncia. Depois que Moro rompeu com Bolsonaro, Aras retomou a conversa com o denunciante, o advogado Rodrigo Tacla Duran. Para o mundo político, Aras está tentando constranger Moro e agradar a Bolsonaro.
Nos governos do PT, a indicação do procurador geral era feita pelos próprios procuradores, em uma eleição interna. Bolsonaro rompeu com a tradição e indicou Aras. Sob a sua gestão, a PGR tem dado zero prioridades às investigações que envolvem a família Bolsonaro e aliados do presidente. Em compensação, tem avançado nos inquéritos que envolvem governos de oposição.
Essa domesticação da PGR enfrenta oposição interna. Na terça, 23, a insatisfação dos subordinados com Aras ficou evidente com a eleição dos novos subprocuradores para o Conselho Nacional do Ministério Público. Os eleitos são opositores do procurador geral e tiveram mais de 600 votos cada. Os candidatos defendidos por Aras receberam menos de 200 votos.
A Lava Jato nasceu do braço de um inquérito sobre a fraude de um posto de gasolina em Brasília. Com as delações premiadas do doleiro que usava o posto de gasolina para lavar dinheiro e de um ex-diretor da Petrobras beneficiado pelo esquema, os procuradores descobriram uma rede de propinas envolvendo políticos do PT, PP e MDB. Depois, as investigações mostraram que esse esquema se repetia na construção de hidrelétricas, usinas nucleares, estádios de futebol, estradas de São Paulo, prédios públicos do governo de Minas Gerais e quase todas as compras do Estado do Rio. Como se diz no interior, cada enxadada, uma minhoca.
Já faz tempo que políticos tentam controlar o alcance da Lava Jato. Ficou clássica a gravação do ex-senador Romero Jucá defendendo um “grande acordo nacional com Supremo e tudo e delimitava onde está”. Depois da declaração de Jucá, a Lava Jato ainda divulgou a lista com centenas de políticos beneficiados com doações ilegais da Odebrecht e da JBS, condenou e prendeu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, grampeou e processou o então presidente Michel Temer e gerou o clima de “todo político é ladrão” que ajudou na eleição de Jair Bolsonaro. Por ironia, a operação que nasceu sob o governo do PT investigando o PT, cresceu no governo do MDB investigando o MDB, está morrendo por asfixia com o presidente que ela ajudou a eleger.