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Bandeiras de apoio a Bolsonaro e a Lula agitadas por apoiadores em Brasília em 2022 - Ueslei Marcelino - Foto: 13.out.22/Reuters
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quinta-feira 10 de outubro de 2024 às 11:30h

Resultado das urnas mostra que ainda é cedo para decretar o fim da polarização

NOTÍCIAS, POLÍTICA


Os resultados do primeiro turno, com a vitória numérica dos partidos do Centrão e a reeleição de dez prefeitos de capitais, fizeram muita gente acreditar no arrefecimento da polarização que marca a política nacional desde pelo menos o pleito de 2018, vencido por Jair Bolsonaro (PL) e em 2022 pelo atual presidente Lula da Silva (PT).

O discurso voltado para entregas dos reeleitos com grandes votações, como Eduardo Paes (PSD) no Rio e João Campos (PSB) no Recife, também reforçou conforme artigo da colunista Malu Gaspar, do O Globo, a suposição de que o Brasil estaria numa era de mais realizações e menos ideologia, mais diálogo e menos ódio. Olhando com mais atenção, porém, fica evidente que é cedo para ir tão longe.

As quase 3.500 cidades conquistadas pelo Centrão (contando apenas PSD, PP, MDB, União Brasil e Republicanos) impressionam, mas não são propriamente novidade. Eleições municipais são um palco tradicionalmente dominado por legendas pragmáticas e fisiológicas.

O PSD superou o MDB e saiu campeão, com quase 900 prefeituras, porque executou com competência o lema de seu líder, Gilberto Kassab: não ser de direita, nem de esquerda, nem de centro, muito pelo contrário. Nesses partidos, cada um escolhe seu lado, portanto os números sem contexto não dizem nada.

A vitória da direita em nove capitais e a quantidade de disputas de segundo turno em que a esquerda ficou de fora — cinco ao todo — mostram que continua a guinada descrita pelo cientista político Jairo Nicolau — autor de “O Brasil dobrou à direita”.

Sem Jair Bolsonaro, não se poderia contar a história das eleições em Curitiba, Goiânia, Belo Horizonte, Manaus ou João Pessoa, onde ele se empenhou em fazer seus candidatos superarem o desempenho projetado pelas pesquisas no início da campanha. Bolsonaro fugiu da disputa em São Paulo, mas a votação acumulada por Pablo Marçal (PRTB) já levou até ao surgimento da expressão “bolsonarismo sem Bolsonaro”.

Ainda de acordo com Malu Gaspar, ele não ter conseguido empurrar Alexandre Ramagem (PL) ao segundo turno no Rio de Janeiro pode até ser computado como derrota, mas, numa eleição em que até as pedras do Arpoador sabiam que a vez era de Eduardo Paes (PSD), é de respeitar que um candidato tão insosso e desconhecido dos cariocas tenha obtido 30,8% dos votos válidos. Tanto que Lula ou o PT acharam melhor apoiar Paes logo, em vez de lançar alguém só para constar ou ficar com Tarcísio Motta no primeiro turno (PSOL).

Da ausência de Lula das grandes disputas talvez venha a explicação para a sensação de que a polarização tenha arrefecido. Como analisa o cientista político Felipe Nunes, dono da empresa de consultoria e pesquisa Quaest e um dos autores de “Biografia do abismo: como a polarização divide famílias, desafia empresas e compromete o futuro do Brasil”:

“Se, por um lado, Bolsonaro foi a campo e teve atuação fundamental para a direita, a estratégia de Lula foi esconder o PT atrás de outras siglas, o que não significa que a esquerda não estivesse na disputa”.

Traduzindo: sem Lula para se contrapor a Bolsonaro, a polarização como conhecemos ficou capenga.

Nunes aponta — e a eleição de São Paulo demonstra — que os grandes temas que dividem os brasileiros continuam a mobilizar o eleitorado. A demanda por lideranças conservadoras, anti-Estado e antissistema continua firme, e é isso o que explica o crescimento de Marçal.

“É uma ilusão achar que a polarização acabou no primeiro turno”, diz Nunes. “A elite política tentou de todas as formas isolar a direita radical nestas eleições apresentando uma direita unida e acabou atropelada pelo Marçal. Isso porque a polarização é fruto das demandas, vem de baixo para cima”.

Em maior ou menor grau, o embate entre visões de mundo deverá surgir em cidades onde direita e esquerda se enfrentarão no segundo turno, como São Paulo, Fortaleza (CE), Porto Alegre ou Cuiabá. Nada indica que se esgotará quando a eleição municipal acabar. Ao contrário, se voltará para o Congresso e, em seguida, para as eleições presidenciais.

Se, no passado, o lema do “nós contra eles” funcionava como alegoria para opor o PT à direita fraca e difusa representada pelo PSDB ou pelo antigo PFL, agora a direita tem uma variedade de lideranças. Hoje são Bolsonaro, Tarcísio de Freitas (Republicanos) e até Marçal. Mas isso é o que menos importa.

O eleitor conservador não é mais o envergonhado de antes, também não age única e exclusivamente como gado. Cria novos líderes e alimenta a polarização. A esquerda pode estar enfraquecida, mas Lula deverá estar a postos em 2026. Se não abandonar a arena para os adversários, a disputa tende a continuar.

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