Depois do envio da proposta do governo de criar um imposto para fundir PIS/Cofins, o relator da comissão mista da reforma tributária, Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-PB), disse que a mudança no sistema tributário “não pode ser pequena”. Segundo ele, o acerto é fazer uma reforma ampla, como já está previsto nas propostas que tramitam na Câmara e do Senado.
Ribeiro afirmou que para o setor de serviços, considerado o mais prejudicado com a proposta enviada pelo governo, é melhor uma proposta que inclua a redução dos impostos pagos sobre os salários dos funcionários como contrapartida já que o segmento não consegue abater crédito pelo modelo proposto pelo governo. Ribeiro não quis adiantar qual será a fonte de financiamento da desoneração, mas disse que não é um imposto aos moldes da antiga CPMF.
Ele defendeu uma junção dos tributos sobre consumo federais com os estaduais e municipais com a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Disse que vai conseguir o apoio das cidades, inclusive das capitais, que estão mais reticentes.
Qual será a estratégia depois do envio da proposta do governo?
Vamos pegar as três propostas na comissão mista. Meu pessoal está analisando e vai entregar na segunda-feira. Temos uma reação muito grande de vários setores à proposta do ministro da Eonomia, Paulo Guedes.
Essas críticas ao projeto mudam os planos?
Para mim, não. Não muda muita coisa porque sempre tenho defendido uma reforma ampla, que é o que está posto na PEC 45 (da Câmara) e na PEC 110 (Senado) e ir além.
O que é ir além? É a desoneração?
É trabalhar um aumento da base de contribuição (onde o imposto é cobrado), os desafios da tributação da nova economia. O mundo todo está buscando isso e não vamos perder o momento de trabalhar essa lacuna que existe em função de tudo ser novo. As novas relações que surgiram em função dos novos hábitos de consumo, como as plataformas digitais, os big data, streaming, com aquisição de serviços pela internet. Isso aumenta consideravelmente a base de tributação. Essas são as empresas que mais crescem.
O sr. pretende ampliar essas empresas com um novo tributo?
Estamos vendo como solucionar. Na minha visão, a solução dessa tributação também está na tecnologia.
É possível ampliar a base com uma nova CPMF?
Não estamos tratando de CPMF. Até porque não foi colocada.
O sr. é contra ou favor à volta da CPMF?
Por convicção, eu sou contra aumentar a carga tributária do País. Eu sou a favor da redistribuição dela. Como é que faz? Redistribui aumentando a base. É esse o trabalho que vamos fazer. É por isso que a reforma tem que ser ampla. Não pode ser uma reforma pequena. Se ela for pequena, vai recair sob determinado setor. É o que a gente não quer. Se fizermos uma reforma pequena, vamos terminar fazendo uma mudança de carga setorial.
O sr. está indicando que vai pegar a proposta de governo e incluir num imposto amplo?
A proposta que o governo colocou é convergente do ponto de vista conceitual da simplificação tributária. Mas eu defendo que seja incorporada às propostas que estão postas. Todas duas são mais amplas do ponto de vista dos impostos que são unificados.
Os municípios não querem essa reforma ampla?
São municípios grandes. Não os pequenos. Estamos trabalhando no texto e vamos construir o diálogo (com os grandes) para ver o que precisa corrigir em relação ao impacto que acreditam que têm. Mas isso estará contemplado no fundo de compensação. Que é exatamente para prever uma possível perda e calibrar com o prazo de transição.
O setor de serviços ficará mais tranquilo se a reforma for ampla?
Nós precisamos enfrentar este momento com soluções estruturais. O que o País espera de nós é que possamos enfrentar os nossos problemas com mudanças estruturais. Não adianta fazer uma reforma que não enfrente as distorções que temos. Por essa razão, tratar, por exemplo, de tributação indireta, no consumo, sem enfrentar o ICMS (imposto estadual), não vamos resolver as questões de conflitos estaduais. Não vamos resolver os problemas que hoje contribuem para o sistema complexo que temos. É mais razoável do ponto de vista político, inclusive, que utilizemos essa energia para aprovar uma reforma mais ampla. Talvez não seja aquela que o Brasil precise, uma radical, em matérias como essa o bom senso manda a gente ser prudente, mas vamos ser ousados o que do ponto de vista estrutural pode modernizar mais o nosso País.
A indústria defende a reforma porque paga mais hoje e o setor de serviços está insatisfeito. Como sair desse impasse?
No nosso relatório, estamos construindo uma alternativa via desoneração, buscando as fontes necessárias para que possam custear. Não no modelo de desoneração geral, que tem um custo muito alto, mais de R$ 300 bilhões. Fizemos um debate com a Frente Parlamentar de Serviços. Temos na semana que vem reuniões marcadas para avançarmos na construção de uma alternativa para a parte do setor de serviços que tem mão de obra mais intensiva (a proposta de reforma apresentada pelo governo aumenta a carga tributária para essas empresas).
Como seria essa desoneração?
Por faixas de renda dos salários. E vamos testar quanto podemos desonerar e o efeito que isso tem nas cadeias que não geram crédito para compensação. A desoneração será com esse foco: para as cadeias produtivas que não conseguem gerar crédito. Para a parte do setor de serviços que gera crédito, está resolvido. Ainda não posso dizer a fonte de financiamento. Precisamos testar esses modelos colocando fontes. Eu tenho alguns valores e estou pedindo as informações. A partir daí, vamos para cima.
Uma alíquota maior do IBS pode bancar essa desoneração?
Aí seria fácil de resolver. A mesma coisa é a CPMF. Resolver o problema aumentando carga tributária é o caminho mais elementar. O nosso desafio é manter a carga e criar um ambiente em que a possamos aumentar a base. Para num futuro próximo ter uma carga menor.
De que forma a proposta do ministro Paulo Guedes ajuda já que o Congresso estava cobrando o projeto dele?
A proposta ajuda do ponto de vista do debate. O governo se põe no debate. O próprio Guedes disse que não mandou uma mais ampla para respeitar o Parlamento e a Federação. Mas disse que é a favor de uma reforma mais ampla. É importante que a partir de agora a gente possa avançar nesse debate para aprovarmos este ano. As quatro votações (uma reforma mais ampla com os tributos estaduais e municipais exige dois turnos na Câmara e no Senado com, no mínimo, três quintos de apoio em cada Casa). Por isso, foi importante a criação da comissão mista porque esse debate já se fará a com os parlamentares das duas Casas. Todos terão acesso ao texto que será construído no ambiente do Congresso como um todo.
A eleição municipal não atrapalha?
Já habituamos com o debate virtual. Estamos votando, aprovamos três PECs (Proposta de Emenda à Constituição) virtualmente, com todo mundo nas suas bases. Se construir um texto que for validado pelas lideranças, não vejo dificuldade não.
A recessão provocada pela covid-19 muda a história da reforma tributária?
Muda à medida que ela contribui para que a reforma seja ainda mais necessária. A fórmula de sair dessa relação dívida pública x PIB, que aumentou consideravelmente, é aumentar o crescimento econômico. Se avançarmos numa transição da reforma mais rápida, podemos ter um crescimento também mais rápido.
O governo com apoio do Centrão não pode tentar aprovar o projeto de reforma dele antes?
O ministro foi claro. Ele fez uma fala internamente na sala do Davi (Alcolumbre, presidente do Senado) que defendia uma reforma ampla e que está apresentando essa proposta por respeitar a relação federativa.
Não pode ser retórica do ministro?
Se eu não acreditar na palavra das pessoas, fica difícil.
Mas o Centrão vai apoiar a reforma ampla?
A reforma ampla é do Brasil e acho que nenhum partido vai negar a reforma que o Brasil precisa num momento como esse. Não é uma pauta do governo. Uma pauta do Estado.