Segundo a ABREN, somente em 2023 o país tem a possibilidade de receber investimentos de aproximadamente R$ 4 bilhões no setor
A recuperação energética de resíduos, tecnologia que transforma o lixo não reciclável em energia, é uma técnica bastante utilizada em diversos países, mas que ainda dá os primeiros passos no Brasil. Enquanto há mais de 2,5 mil usinas de recuperação energética (URE) em todo o mundo, o país constrói sua primeira URE, localizada em Barueri (SP), que terá 20 MW de potência instalada e deve entrar em operação a partir de 2025.
Porém, esse cenário deve mudar nos próximos anos, devido principalmente às metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Resíduos Sólidos – Planares. O documento prevê o total de 994 megawatts (MW) de potência instalada até 2040, o que demandaria um investimento, público, privado ou misto, de aproximadamente 40 bilhões de reais.
Segundo Yuri Schmitke, presidente da Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos (ABREN), “atualmente há dez projetos de UREs em andamento no Brasil, que irão gerar 10 bilhões de investimentos. Para 2023, especificamente, temos a expectativa de que sejam investidos mais de R$ 4 bilhões em aportes nas URE Mauá (80MW), URE Caju (31MW) e URE Consimares (20MW), caso esses empreendimentos vençam os próximos leilões A-5 ou A-6, que serão promovidos pelo Governo Federal”.
Com a efetivação dos investimentos e a entrada dessas usinas em operação, entre 2027 e 2028, as plantas teriam capacidade de tratamento de mais de 5 mil toneladas por dia de lixo urbano, ou 1,8 milhões de ton/ano. Atualmente, o Brasil gera por ano cerca de 80 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos (RSU). Desse montante, quase metade (38 milhões de toneladas) pode ser transformado em energia, considerando-se as 28 regiões metropolitanas do país com mais de 1 milhão de habitantes.
Desta forma, além de contribuir com a matriz energética nacional, o Brasil passaria a dar uma destinação ambientalmente mais correta à fração não reciclável do lixo, deixando de enviar esse resíduo para lixões e aterros sanitários.
Panorama mundial
Segundo relatório da consultoria Ecoprog referente a 2020, a China lidera o ranking entre os países do mundo que possuem maior capacidade instalada de recuperação energética de resíduos por tratamento térmico, com uma capacidade de processar 170 milhões de toneladas por ano de resíduos sólidos. Na sequência vêm o Japão, com 65 milhões de ton/ano, os Estados Unidos, com 29 milhões ton/ano, e a Alemanha, com a capacidade de tratar 27 milhões de ton/ano.
Em relação aos continentes, a Ásia responde por 66% de toda a capacidade mundial de recuperação energética de resíduos, seguida pela Europa, com 26%, e pela América do Norte, com 8%. A América do Sul não possui nenhuma URE em operação até o momento.
CDR é alternativa relevante no Brasil
Atualmente, os resíduos considerados perigosos, além dos pneumáticos em fim de vida, constituem parte significativa dos combustíveis derivados de resíduos, também conhecidos como CDR, produzidos no Brasil. O Decreto Presidencial nº 10.936, de 12 de janeiro de 2022, instituiu um rol extenso de resíduos perigosos, inclusive solo contaminado com combustíveis, que devem ser destinados, obrigatoriamente, para a recuperação energética se, em um raio de 150km, houver uma usina em operação e devidamente licenciada.
Desta maneira, o decreto afasta, de maneira definitiva, entendimentos ultrapassados sobre a destinação adequada desses materiais, adotados em alguns Órgãos Ambientais Estaduais. “O documento representa uma importante contribuição para que o País desenvolva seu potencial de produção de CDR, estimado em mais de 20 milhões de toneladas por ano – 10 vezes mais do que o atual patamar de menos de 2 milhões de toneladas/ano”, destaca Schmitke.
A ABREN estima que tenham sido investidos R$ 150 milhões em usinas de CDR em 2021. Esse tipo de combustível é considerado uma alternativa ecologicamente viável para a substituição de derivados de petróleo, como o clínquer, por exemplo. Há 38 indústrias no Brasil habilitadas para utilizar o CDR – um número que pode crescer muito nos próximos anos.
De acordo com a ABREN, além de sinalizar avanços ambientais e atrair investimentos para o setor de infraestrutura, há também toda uma cadeia de suprimentos que se estrutura em função de mecanismos políticos e regulatórios claros. Essas plantas precisarão de equipamentos que podem ser produzidos nacionalmente, promovendo crescimento econômico e gerando empregos, de forma direta e indireta.
Projeto de Lei pode destravar investimentos
Para fazer frente aos investimentos necessários em recuperação energética de resíduos, a ABREN é favorável à aprovação do Projeto de Lei 924/2022, que cria o Programa Nacional da Recuperação Energética de Resíduos (PNRE). O PL, que está em trâmite na Câmara dos Deputados, prevê uma série de incentivos para acelerar o desenvolvimento da recuperação energética de resíduos no Brasil.