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quinta-feira 18 de julho de 2019 às 08:38h

‘Quem atua para revelar a verdade dos fatos incomoda’, diz presidente da ABI

DESTAQUE, ENTREVISTAS


Antônio Walter dos Santos Pinheiro nasceu em Salvador, diplomou-se em Ciências Contábeis e  Economia pela UCSal. em 1968, dedicando-se à carreira bancária de 1961 (Banco Corrêa Ribeiro) até 1974 (Banco Itaú). Presidiu o Sindicato das Indústrias de Bebidas da Bahia e foi diretor-financeiro da Fieba em 1972 e 73. Ingressou no jornalismo em 1978, assumindo a direção da Tribuna da Bahia. Tornou-se conselheiro da ABI em 1986, depois o seu presidente desde 13 de junho de 2011. Em entrevista publicada pela OAB-BA, republicamos os melhores trechos.

A imprensa é considerada um dos mecanismos responsáveis por zelar pelo bom funcionamento da democracia. Nesse contexto, qual a importância da liberdade de imprensa para o Brasil na atualidade? Acredita que ela vem sofrendo alguma espécie de cerceamento?

Walter Pinheiro: Sem a imprensa livre, não há democracia. Ela é um dos pilares para o exercício democrático do poder. Numa sociedade com as características da nossa, ainda em processo de formação, a presença e a atuação da imprensa é fundamental. Entretanto, é preciso fazer isso de forma responsável, para que a liberdade não se torne uma licenciosidade. Quanto ao desejo de alguns de atrapalhar ou suprimir e prejudicar essa liberdade, é algo que acontece em qualquer nação. Sempre há alguém para ativar o rei que existe dentro de si e ser monocrático. No Brasil, não é diferente. Por aqui, a liberdade de imprensa existe e está sendo exercitada há algum tempo, ainda que atravessada por episódios de violência concreta e simbólica. Mas existem formas diferentes para se fazer censura. Precisamos ficar muito atentos, por exemplo, a investidas na área jurídica. Houve um aumento dos casos de cerceamento à liberdade de imprensa por ações judiciais, de acordo com a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). Cada vez mais se recorre a processos por danos morais com o objetivo de intimidar ou fragilizar o profissional da notícia. E o pior de tudo é a autocensura, que visa desestimular a ação daqueles que fazem imprensa no país.

Muito tem se falado sobre a importância da fonte dentro do jornalismo. Qual o papel da fonte para o livre exercício da profissão?

Walter Pinheiro: A fonte é quem fornece notícias, ela é a base de um bom jornalismo. Normalmente, as matérias estão estribadas em fontes, na maioria, identificadas e conhecidas. Elas garantem a credibilidade de uma boa matéria jornalística, enriquecem o material, porque prestam o testemunho dos fatos. Por isso, é importante que seja fidedigna, que valorize, fortaleça a verdade que o jornalista está buscando revelar. Cabe ao jornalista se comprometer com a apuração, para comprovar a veracidade das informações que divulgará.


Em seu artigo 5º, a Constituição Federal diz que é “assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”. Qual a importância do sigilo da fonte e em que casos o jornalista pode se utilizar da prerrogativa?

Walter Pinheiro: O direito do jornalista de manter o sigilo da fonte é essencial à prática da profissão. Essa garantia constitucional resguarda o bom desempenho da atividade de informar. O jornalista guardará a origem de suas fontes de informação sempre que considerar necessário (Art. 8o -). Muitas vezes, numa investigação jornalística, a fonte admite fornecer os dados, mas não deseja ser identificada. Então, se ela confia no profissional e este nela, é feito um pacto entre as partes, para que o fato seja divulgado e a fonte, preservada. Se tudo estiver estribado na verdade, não há por que temer. É importante deixar claro que, no momento em que o jornalista opta por não revelar, ele assume a responsabilidade pelo que está divulgando. Se não fosse assim, ele poderia publicar informações falsas ou incorretas e atribuir a uma fonte desconhecida e não sofreria sanção. Ele tem o direito de preservar a fonte, mas responde pelo que escreve.

A partir da popularização da internet e das redes sociais, a estrutura das equipes jornalísticas e os próprios modelos de venda de conteúdo passaram por mudanças significativas. Como funcionam e quais são os modelos atuais de mercados do jornalismo?

Walter Pinheiro: Sem dúvida, a internet reformulou o mundo da comunicação social, antes resumido praticamente à redação, rádio e TV. As inovações tecnológicas e as influências da globalização cunharam o perfil do ‘novo jornalista’. Hoje, a prática da imprensa é algo liberado para todos aqueles que tenham um celular na mão. Uma pessoa pode a qualquer momento e de qualquer lugar relatar um fato ou transmitir uma mídia, fazer aquilo que durante anos foi uma exclusividade dos que estavam atuando diretamente em órgãos de comunicação. O jornalismo se abriu a novos formatos. Vemos o fortalecimento do modelo das novas empresas de conteúdo, assinatura de newsletters de temas específicos, estreitamento da relação entre jornalismo e publicidade, os jornais abraçando a tecnologia, as redes sociais e os serviços de valor adicionado. Há possibilidades infinitas de atuação e isso é muito positivo, mas o jornalista deve continuar prezando pelas boas práticas na apuração e elaboração do material.

A popularização das redes sociais alimentou a criação e propagação das fake news. Quais os riscos que as notícias falsas podem trazer para o leitor e como filtrá-las?

Walter Pinheiro: Não é um fenômeno novo. A diferença é que hoje as notícias falsificadas têm um alcance muito maior, por causa dos múltiplos canais na internet. Antes, chamávamos de “fofoca”, “mentira”, “barrigada” (quando era algo involuntário). Notícias não verdadeiras sempre existiram. O que é condenável é a notícia falsa espalhada propositalmente com o objetivo de tirar proveitos. Tivemos exemplos nas eleições dos Estados Unidos e nas últimas eleições brasileiras. É algo que precisa ser combatido. A melhor forma de se proteger é verificar qualquer informação recebida antes de retransmitir. Já houve casos de pessoas agredidas ou mortas por causa de desinformações compartilhadas na rede.

Com a velocidade que a internet enseja, o “furo” tem sobrevivência de segundos. Quando algo cai na rede através de um canal, os outros começam a replicar. Alguns têm a responsabilidade de publicar aquilo que está checado, para não afetar a sua credibilidade e imagem. O importante é não dar sequência a notícias sensacionalistas. Não devemos alimentar o processo. Isso não será elucidado tão cedo e há perigos de aumentar, porque ainda trabalhamos muito na superfície da internet. Existe a deep web, oculta para o grande público e território de muitas práticas ilegais.

No relacionamento com o leitor, como o jornalista deve lidar com as patrulhas partidárias da internet?

Walter Pinheiro: O jornalista não deve ter medo de patrulhamento que acontece pela internet. Caso contrário, é melhor não ser jornalista. Naturalmente, sabemos que é uma profissão de risco. Quem atua para revelar a verdade dos fatos incomoda. Essa verdade gera reações violentas, às vezes. É preciso que o jornalista trabalhe com a sua consciência. Se ele está elaborando uma matéria, procure gravar o que está recolhendo, ser fidedigno, ser cuidado ao escrever, não se afastar da verdade. Agindo assim, estará mais seguro e fortalecido para enfrentar esse patrulhamento e lidar com divergência de posicionamentos. Se houver excessos, existem remédios jurídicos que poderão ser aplicados. Os bons advogados estão preparados.

A ABI tem um passado marcado por lutas voltadas à liberdade de expressão e em defesa dos jornalistas baianos. Quais as principais dificuldades enfrentadas pela associação na atualidade?

Walter Pinheiro: A ABI se mantém, permanentemente, atenta à defesa da liberdade de expressão do pensamento por entendê-la como um dos direitos mais sublimes do indivíduo. Além disso, a instituição segue atenta aos direitos humanos, às questões ambientais, a tudo aquilo que vise o aprimoramento do ser humano. As maiores dificuldades se dão na intermediação de conflitos que envolvem autoridades, ou poderosos, que se acham no direito de não serem fustigados, mesmo sendo pessoas públicas, sujeitas ao trabalho da própria imprensa. A ABI encontra-se muito bem montada, estruturada e fortalecida, com instalações dignas, sempre à disposição dos profissionais da comunicação. É um momento alvissareiro para nossa entidade, ainda mais nesta fase, em que o Brasil passa por transformações, enfrenta conflitos, vivencia um processo intenso de intolerância. Estamos aqui para contribuir, mediar posições, visando o alcance de um cenário melhor para o país.

A OAB da Bahia já atuou junto à ABI, inclusive na promoção de eventos em defesa da imprensa livre. Como enxerga essa parceria com a OAB-BA, uma vez que a entidade é uma das principais responsáveis pela defesa do estado democrático de direito?

Walter Pinheiro: A ABI e a OAB-BA são irmãs siamesas, porque também sem a OAB não existe democracia. A Ordem trata da boa prática da Justiça. O seu alinhamento com a ABI é algo que fortalece as duas instituições. Não é surpresa que todas as vezes que existe um conflito na comunidade, logo, os nomes dessas instituições são lembrados para ajudar. Por isso, devemos estar sempre unidos. Já realizamos convênios em outras gestões e estamos prontos para fazê-lo com o Dr. Fabrício, que é um prezado amigo. Que a ABI possa contribuir com a OAB-BA para o alcance dos seus objetivos e que ela possa ser nossa patrona, no fortalecimento dos nossos trabalhos em busca da verdade e em defesa da boa prática do jornalismo.

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