Muito embora considere “improvável” a chapa Lula-Alckmin, o deputado federal pela Bahia, Afonso Florence (PT) disse em entrevista ao jornal Tribuna, que partido “deve fazer a política de aliança necessária para ganhar e governar”.
Florence ainda elogiou a possível migração do MDB para o grupo liderado pelo governador Rui Costa e pelo senador Jaques Wagner, ambos do PT.
Confira abaixo:
Tribuna – Qual a avaliação que o senhor faz da conjuntura da política nacional? O senhor acha que está mais estável ou permanece um cenário político conturbado?
Afonso Florence – Eu acho que estamos num momento decisivo para o desenlace na correlação de forças pré-eleitoral. Bolsonaro sofreu uma derrota substantiva ao tentar um golpe no Sete de Setembro e não ter êxito. Houve um desmonte dessa operação dele para golpear a democracia, do Supremo (Tribunal Federal), da sociedade civil, da imprensa, dos partidos de oposição. Agiram, cada um desses setores, de forma autônoma, talvez, um pouco mais de articulação entre os partidos de oposição e os movimentos sociais, com denúncia e mobilização pelo Brasil. Ele sofreu uma derrota muito substantiva e isso reduziu a capacidade dele de desestabilizar as instituições. Reduziu muito e nesse momento há uma aparente calmaria decorrente deste momento dessa capacidade dele de jogar para o golpe. Mas ele vai retornar aí essa operação na medida que evolua o quadro pré-eleitoral. O quadro é pré-eleitoral é digamos assim informado pela conjuntura econômica, pelo conjunto de variáveis que somam em particular a evolução da pandemia da Covid-19.
Tribuna – E como o senhor avalia a conjuntura econômica?
Afonso Florence – A política macroeconômica neoliberal do governo Bolsonaro aprofundou a crise econômica iniciada no governo Temer, com a emenda constitucional 95. Mas aí vieram reforma trabalhista, reforma da Previdência, independência do Banco Central e desmonte de políticas públicas, inclusive, da agricultura familiar. Euma carestia, em particular, dos alimentos, mas também de combustíveis com a alteração da política de preços de combustíveis nos governos do PT. O nome técnico era preços administrados virou TPI – política de paridade internacional – ou seja dolarizou. Somando todas essas variáveis, comida cara, porque não tem mais programa nacional de alimentação, de fortalecimento da agricultura familiar. Com a extinção desses programas (sociais),houve uma carestia de alimentos, houve a carestia de combustíveis desemprego. Com emenda constitucional 95,teto dos gastos, caiu o investimento público. Então, isso levou o país a esse caos econômico e a popularidade de Bolsonaro sofre impacto dessa econômica.
Tribuna – O que o senhor achou da CPI da Covid?
Afonso Florence – A CPI da do Covid deixou público, comprovado a responsabilidade, os crimes de Bolsonaro contra a saúde do povo. (Ele) disse que era gripezinha,jogou contra o distanciamento social, jogou contra a aquisição de vacinas, depois se envolveu em corrupção na aquisição de vacinas. Não forneceu a infraestrutura do SUS, chegando até a faltar oxigênio como uma crise de Manaus. E isso tudo impactou na popularidade e na rejeição que bate todos os recordes de presidentes anteriores.
Tribuna – Como o senhor vê a participação do ex-presidente Lula neste processo?
Afonso Florence – Com as revelações da Vaza Jato, dos crimes de Moro e Dallagnol contra Lula, com a própria Justiça inocentando Lula, anulando condenações ilegais sem provas, ficou claro para o país que Lula era preso injustiçado, quase um preso político. Moro e Dallagnol fizeram política para eleger Bolsonaro. E isso somado a uma percepção da população de que os governos do PT houve prosperidade, melhoria da renda, acesso a serviços públicos, qualidade, melhoria na qualidade de vida, isso catapulta Lula a liderança em todas as pesquisas já perto de indicação de vitória no primeiro turno. Isso estressa muito o bolsonarismo. Eles vão tentar voltar para golpe. Eles são golpistas com milicianos. Em quase todos os estados, tem milícia ligada a eles, que defendem arma, que defende estupro. Então, a conjuntura é um quadro ainda muito nervoso com tendência de se agravar o estresse na medida em que se aproxima o calendário eleitoral, e tendência eleitoral de derrota de Bolsonaro.
Tribuna – Tem se comentado nas últimas semanas que alguns setores do PT defendem uma chapa com Lula e Alckmin. O que o senhor acha dessa ideia?
Afonso Florence – A legislação eleitoral não tem coligação. Tem federação. E a política de aliança vai estar em torno disso. Então, nós vamos ter que esperar para ver quais partidos pedirão federação ao PT, e isso vai condicionar a política de aliança na majoritária. Tanto para o governo federal quanto os governos estaduais. O PT já governou o Brasil por quatro mandatos, sendo que o de Dilma foi encerrado prematuramente pelo golpe de estado de 2016. O povo brasileiro conhece os governos do PT. Governos com desenvolvimento econômico, redução de desigualdades, programas sociais para todos que precisam de apoio do estado, da sociedade e de também de boa gestão fiscal. Portanto, a pré-candidatura de Lula é muito positiva para o país. O próprio Alckmin se disse honrado de ter seu nome lembrado. Alckmin é da ala do PSDB que não atacou o PT da forma golpista, virulenta que o PT vá atacado pelo PSDB e seus avaliados. Quem atacou o PT? Aécio atacou o PT, ACM Neto atacou PT. Esses são os de extrema–direita. ACM Neto é bolsonarista. Aécio é outro bolsonarista. E Alckmin manteve uma conduta respeitosa de diferença política, mas respeitosa. Nas eleições de 22, o tempo de TV, tempo de rádio vai continuar a pesar. Ele (Alckmin) lidera as pesquisas para governo de São Paulo. Então, é improvável, mas não é digamos assim algo que deva ser resultado. O PT vai apresentar um programa, a Fundação Perseu Abramo já lançou um programa de reconstrução e transformação do Brasil, significa retomar a capacidade do estado de investir pelo desenvolvimento da redução de desigualdade, sustentabilidade. Tem que saber se o Alckmin vai aceitar o programa da candidatura que lidera. O PT deve estar aberto com muita firmeza programática. Acho que é isso que é importante dizer. O PT tem um programa de transformação, de reconstrução e transformação do Brasil. Com muita firmeza programática deve fazer a política de aliança necessária para ganhar e governar. Então, tem que ter uma frente de esquerda, para os movimentos sociais contribuírem, com a sustentação do governo e suas medidas de transformação social. E tem que ter a política de aliança para governar e ter governabilidade parlamentar, a sustentação parlamentar.Isso deve ser o parâmetro de diálogo. Já é notório aí, já houve esse contato com Alckmin, e vai haver com outros setores. Nós temos que conduzir com cuidado necessário,para que tenhamos êxito no nosso objetivo, que é ganhar as eleições e governar para melhorar a vida do povo brasileiro a partir de 2023.
Tribuna – O PT voltaria, então, a dialogar com partidos que defenderam o impeachment?
Afonso Florence – O chamado por alguns como impeachment foi um golpe do Estado, que teve como resultado o desmonte de programas sociais, a eleição de Bolsonaro. Bolsonaro é parte do impeachment, parte do golpe de estado. O desmonte da engenharia nacional, das empresas nacionais com uma perseguição a empresários para obrigá-los a fazer delação premiada contra o PT, uma prática criminosa. Em outro país, isso teria a punição com privação de liberdade, de promotor, de juiz. Agora, Moro é inclusive candidato a presidente. Muita gente que participou desse processo fez sua autocrítica, e nós é que lideramos pesquisas de opinião. O presidente Lula que é identificado como um candidato que pode devolver a prosperidade para o país, para população que mais precisa. Então, se a gente lidera e alguma personalidade ou um partido fez sua autocrítica, é importante a gente ter a caracterização do período. O período histórico é de reconstrução nacional. É de reconstrução das instituições, da normalidade democrática. O país vai precisar de todas as forças políticas, inclusive, daquelas que façam sua autocrítica do voto na Câmara e no Senado, quando do impeachment para realizar essa reconstrução. Então, o PT tem que apresentar seu projeto para o Brasil e discutir a política de alianças com todos os partidos que se dispuserem a apoiar essa reconstrução, essa transformação do Brasil. E os partidos fazem sua autocrítica e vem conosco. Essa é uma possibilidade concreta.
Tribuna – E como é que o senhor acha que o eleitorado vai olhar a candidatura de Moro?
Afonso Florence – Eu não sei nem se ele leva até o final essa candidatura. Ele está desmascarado. Ele vai a eventos de juristas, e as pessoas se retiram. Ele é vetado no círculo de pessoas com critérios éticos e morais. Ele praticou a corrupção do processo legal para poder virar ministro, virar a candidato, para virar ministro do Supremo. Até onde isso chegará na opinião pública, a gente só vai medir com a evolução da conjuntura. Até o momento, tudo indica que ele já não está bem-posicionado nas pesquisas de opinião. O que quer dizer que deve ter algum impacto. Acho que já se dissemina em formadores de opinião discernimento de que praticaram crimes, condenaram ilegalmente, prenderam um homem honesto, filho do povo e que foi o melhor presidente da história do país. Por isso tudo leva a crer que, apesar de ter setores de mercado, a imprensa golpista que mantém apoio a ele, ele não tem muita viabilidade eleitoral. Essa é uma tendência.
Tribuna – Como é que o senhor enxerga essa possível filiação de Bolsonaro a um partido do centrão?
Afonso Florence – O Bolsonaro é um mentiroso contumaz. Ele criticar ou fazer uma afirmação que não se sustenta em fatos é regra, é diário. Ele está criticando partidos que ele já foi filiado e que depois ele vem a se filiar é da rotina. Claro que isso é da responsabilidade de cada partido. E o impacto na política de aliança desse partido, que ele se filie, é da responsabilidade de seus dirigentes nacionais e regionais. Nós temos que seguir a nossa vida, consolidando os mandatos de governadores e governadora. Três grandes governadores, uma grande governadora. Temos que seguir com essa rede de entidades da sociedade civil, que é um verdadeiro movimento de consciência democrática pelos direitos civis e pelos direitos humanos, pelos direitos trabalhistas, pela liberdade de organização, pela liberdade de imprensa, pela liberdade de expressão e dos direitos dos povos tradicionais, indígenas, quilombolas, nas esquerdas LGBTQ+, mais comunidades tradicionais. Essa rede democrática da sociedade civil organizada, seguindo nosso trabalho de aliança com o povo, e lá na frente onde Bolsonaro estiver, nós seremos um lado oposto que polariza porque não tem. O resto a gente vai ver no processo eleitoral.
Tribuna – O Brasil acabou passando os Estados Unidos na vacinação. O senhor acredita que, apesar das patinadas no início e da demora na aquisição de vacina, o país acabou de alguma forma dando a volta por cima?
Afonso Florence – Os resultados atuais não são piores, obviamente, do que em alguns países. Mas impressionante esses países estarem nessa situação. No Nordeste, o Consórcio do Nordeste foi fundamental para essas conquistas. Os estados do Nordeste, pela ação dos seus governadores e do consórcio, somos com menor letalidade na Covid. Isso contribui com esses números de cobertura vacinal. Essa cobertura vacinal obtida é uma conservação de que, se o presidente da República, o governo tivesse adquirido a vacina no momento da antecedência necessária, nós teríamos tido menos mortes. Isso demonstra a capacidade do SUS de cuidar da vida do nosso povo, e mais uma vez expõe o quanto o governo Bolsonaro foi responsável pela letalidade que ocorreu no Brasil.
Tribuna – Como o senhor vê a retomada de diálogo aqui na Bahia entre o PT e o MDB?
Afonso Florence – A candidatura de Lula e a de Jaques Wagner são polos catalisadores. É natural que partidos, que façam sua autocrítica ao apoio ao impeachment, ou o apoio ACM Neto, queriam conversar conosco. E na medida que nós atualizemos o nosso programa de desenvolvimento econômico, redução das desigualdades, políticas de interesse social, e que tenha a viabilidade eleitoral cada vez mais consolidada, é natural que atraiamos possíveis apoiadores. Nós temos que conversar para ter um leque amplo necessário para ganhar e governar. Então, acho essa aproximação, esse diálogo, é oportuno. Acho que quem vem para o lado de cá, e estava do lado de lá, fez autocrítica de estar do lado de lá, e está vindo para o lado certo. Então, tem a que ter oportunidade de quem errou, acertar.