A cúpula do PT espera conforme a Folha de S. Paulo, que o Supremo Tribunal Federal (STF) impeça, após o período eleitoral, o uso das emendas de relator —recursos que são distribuídos por critérios políticos e que permitem aos congressistas mais influentes bancarem projetos e obras em seus redutos eleitorais.
A expectativa de que o Supremo possa colocar um fim nessas emendas também ronda a cúpula do Congresso e membros do alto escalão do governo, que colocam em dúvida a continuidade desse mecanismo principalmente em caso de vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O petista lidera as pesquisas de intenção de voto.
As emendas de relator somam R$ 16,5 bilhões no Orçamento deste ano e são hoje a principal ferramenta para garantir apoio político para o presidente Jair Bolsonaro (PL) no Legislativo e para fortalecer os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Os chefes das duas casas legislativas têm poder sobre a liberação dessa verba, uma vez que a distribuição dessas emendas depende de acordos costurados entre eles.
Lula afirma que quer acabar com esse mecanismo e reestabelecer o controle do Executivo sobre essa parcela do Orçamento, que supera o valor disponível para alguns ministérios.
Sem um cenário claro para as emendas após a eleição, aliados de Lira e do ministro Ciro Nogueira (Casa Civil) querem acelerar o processo burocrático para liberação do dinheiro neste ano.
Eles, no entanto, esbarram em limitações financeiras impostas pelo governo, que se viu obrigado a congelar essa verba por falta de espaço no Orçamento. A pressão para que o Ministério da Economia encontre uma saída para desbloquear as emendas tende a se elevar no início de outubro.
Aliados de Lira, que é próximo de Bolsonaro, reconhecem que, sem as emendas, o presidente da Câmara fica enfraquecido para a campanha à reeleição para o comando da Casa.
Já integrantes do PT veem eventual decisão do STF contra as emendas de relator como uma saída para que Lula, em caso de vitória, consiga retomar o controle sobre o Orçamento e tente emplacar um presidente da Câmara aliado.
As ações no STF que pedem o fim das emendas de relator são relatadas pela presidente do tribunal, ministra Rosa Weber. Em 2021, ela determinou a suspensão do uso dessa verba.
Rosa recuou da decisão um mês depois, após o Congresso apresentar uma série de medidas para dar transparência às emendas. Porém, as ações não foram suficientes, segundo adversários de Bolsonaro.
Agora, Rosa sinalizou que deve levar o caso à análise do Supremo logo após as eleições.
Petistas citam pareceres do TCU (Tribunal de Contas da União) para respaldar eventual decisão do Supremo contra as emendas de relator. A avaliação do órgão de controle é que o modelo adotado para distribuí-las tem aumentado o risco para o planejamento das ações de governo.
“Há dois pareceres aprovados por unanimidade que o definem como prática frontalmente inconstitucional. Acho que é um fato relevante [os pareceres] e que pode amparar a decisão do Supremo. Temos que aguardar, mas é um fato relevante”, disse o presidente da Fundação Perseu Abramo, Aloizio Mercadante (PT), coordenador do programa de governo de Lula.
Ex-governador do Piauí, Wellington Dias, que faz parte da coordenação da campanha petista, afirma que, além da falta de transparência sobre o destino dessas emendas, o mecanismo “é ilegal e quebra princípios da democracia; gerou desequilíbrio numa eleição como [a de] agora”.
Neste ano, parlamentares governistas e próximos à cúpula do Legislativo têm usado uma brecha nas regras para destinar emendas às suas bases eleitorais sem revelar o padrinho político do recurso. Para isso, elas são registradas por um usuário externo, que pode ser qualquer pessoa.
Até o momento, R$ 12,1 bilhões em emendas de relator já foram negociados com os líderes do Congresso e com Hugo Leal (PSD-RJ), deputado que é relator do Orçamento deste ano. Desse total, quase um terço —R$ 3,8 bilhões— foi prometido para os chamados usuários externos.
A possibilidade de uma pessoa de fora do Congresso ser autora de uma emenda não existia e foi incluída após Rosa Weber ter determinado o compartilhamento de informações referente à indicação desse tipo de recurso.
Como resposta a Rosa, o Congresso criou um sistema com a justificativa de dar mais transparência na divisão do dinheiro em 2022, abrindo a brecha para que pessoas de fora da Câmara e do Senado fizessem solicitações.
O argumento usado para justificar a nova regra era a necessidade de ampliar as pessoas que podem fazer sugestões para o emprego da verba bilionária. Críticos à ideia temiam que nomes de usuários externos fossem usados como laranjas dos parlamentares nas negociações.
Hoje existem quatro tipos de emendas: as individuais (a que todos os deputados e senadores têm direito), as de bancada (em que parlamentares de cada estado definem prioridades para a região), as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso) e as de relator.
Aliados do governo são ampla maioria entre os beneficiados pelas emendas de relator.
Em troca do mecanismo de distribuição das emendas, o PT afirma que irá propor um modelo de formulação do orçamento com participação popular direta, com a criação de plataformas para sugestões da sociedade civil e a retomada de conferências e assembleias que discutiriam prioridades para algumas áreas, como assistência social e educação.
No entanto, os governos petistas também usaram emendas parlamentares como forma de acalmar a base no Congresso em momentos de atrito.
Além disso, pleitos de deputados e senadores também eram atendidos em negociação direta com ministros, que passavam a destinar recursos para as bases eleitorais de parlamentares aliados.