Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai dando, lamentavelmente, vários passos atrás no necessário processo de privatização de estatais, os seus aliados, com o PT à frente, vão colocando toda a sorte de obstáculos aos governadores dos principais estados, que tentam ir na direção contrária — e correta, como mostra reportagem na revista Veja.
Nesta quinta-feira, 6, Lula editou um decreto que excluiu sete estatais do Programa Nacional de Desestatização: Correios, Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Dataprev, Nuclebrás, Serpro, Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias S.A. (ABGF) e Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada S.A. (Ceitec). Também revogou as qualificações no PPI da Telebras e da Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA) e de armazéns e imóveis de domínio da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O ato do presidente revogou 13 decretos editados entre 2019 e 2022 por seu antecessor, Jair Bolsonaro.
Enquanto isso, nos estados, governadores como Tarcísio de Freitas (São Paulo), Romeu Zema (Minas Gerais), Eduardo Leite (Rio Grande do Sul) e Ratinho Jr. (Paraná) se empenham para vender gigantescas estatais como a paulista Sabesp, a mineira Cemig, a gaúcha Corsan e a paranaense Copel, empresas que já talvez já tenham feito algum sentido nas mãos dos estados em outras épocas, mas que hoje precisam de investimentos privados para continuar garantindo serviço de qualidade para a população.
A resistência nos estados se dá por meio de protestos organizados por partidos de esquerda ou sindicatos por eles controlados, por meio de ações na Justiça ou pela oposição política nas Assembleias, como em São Paulo, onde foi criada a Frente Parlamentar em Defesa da Sabesp. “A luta da bancada do PT contra uma das principais bandeiras do governador Tarcísio de Freitas começou”, anunciaram os representantes petistas na Casa.
Gleisi
Além do sinal claro dado por Lula, a resistência petista às privatizações é estimulada — e muito — pela presidente nacional do partido, Gleisi Hoffmann. “Ótimo! Governo Lula retira Correios, EBC e outras estatais do programa de privatizações. Não adianta sair vendendo o patrimônio do povo para depois acontecer como lá fora onde empresas estão sendo reestatizadas porque os serviços eram caros e ruins”, postou na tarde desta sexta-feira a dirigente petista – não deu um único exemplo de privatizações que estariam sendo desfeitas.
A mesma Gleisi entrou com uma ação popular na Justiça de Minas Gerais para barrar a concessão do metrô de Belo Horizonte por Zema, que foi concluída na semana passada. O processo foi julgado improcedente no início de março, mas a petista recorreu. Também em Minas, um ministro de Lula, Alexandre Silveira (Minas e Energia), que tem a sua base eleitoral no estado, tem dito que vai atuar contra a privatização da Cemig, a companha energética estatal de Minas Gerais que Zema sonha passar para a iniciativa privada. E não é por menos, já que Lula também disse, já eleito presidente, no final de 2022, que é contrário à venda da companhia mineira.
No Paraná, reduto eleitoral de Gleisi, deputados e lideranças do PT, PSOL, PDT, PSB, PSDB, PV e Rede se reuniram em Curitiba em março para discutir uma ofensiva para impedir a venda da Copel, a estatal paranaense de eletricidade, pelo governador Ratinho Jr (PSD). O encontro, batizado de “Coalizão em Defesa do Paraná”, foi ideia do presidente do PT no estado, o deputado Arilson Chiorato, ex-assessor de Gleisi em Brasília. O candidato do PT ao governo do estado em 2022, Roberto Requião, é outro porta-voz atuante na luta para impedir a privatização.
Outros aliados de Lula se esforçam para barrar as privatizações. Em São Paulo, a presidente do Sindicato dos Metroviários, Camila Lisboa, que é militante do PSOL, tem usado problemas na linha-8 da CPTM, recém-concedida à iniciativa privada, para tentar impedir que Tarcísio leve adiante a ideia de privatizar o Metrô. Em março, ela liderou uma greve que parou o serviço por mais de um dia e obrigou o governador a fazer um acordo. Encerrada a paralisação, já anunciou que a próxima batalha é contra a privatização. “Privatizar é o fim da linha”, prega a sindicalista em suas redes.
Como afirma a Carta ao Leitor, da revista Veja, desta semana, “ninguém imaginaria que, de volta ao poder, o petismo teria se convertido em ferrenho defensor da iniciativa privada”, “mas as reservas que os seus políticos mantêm frente a esses investimentos — curiosamente, num momento de contas públicas bastante fragilizadas — ultrapassam o razoável”. “A insistência em acreditar no Estado como o único capaz de ser um grande indutor do crescimento da economia vai contra todas as evidências práticas e teóricas”, diz o texto.