A revisão dos benefícios fiscais concedidos a empresas sinalizada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) é uma das bandeiras históricas da oposição formada por partidos de esquerda na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Porém, um estudo realizado pela bancada da federação PT-PCdoB-V aponta que, na contramão do anunciado pelo governador, o Executivo prevê no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) aumentar as isenções fiscais em 12%: dos atuais R$ 63,9 bilhões para R$ 71,5 bilhões em 2025.
O governo de São Paulo informou, em nota, que o PLDO 2025 prevê aumento das renúncias fiscais porque foi elaborado “dentro da conjuntura de benefícios até então vigentes” – o projeto foi apresentado no dia 2 de maio. “O impacto dos ajustes em benefícios fiscais será avaliado durante o ano e antes dos prazos de vigência, que termina no final de 2024”, afirma o Palácio dos Bandeirantes.
A LDO, como o próprio nome indica, estabelece as diretrizes orçamentárias para o ano seguinte, mas não é definitiva. A Lei Orçamentária Anual (LOA), que é o orçamento em si, é discutida e aprovada somente no segundo semestre e pode sofrer alterações em relação à LDO.
Como antecipado pelo Estadão, o governo paulista lançou nesta quinta-feira, 23, as diretrizes do plano “São Paulo na Direção Certa”, que determina a realização de uma série de estudos para reduzir os gastos com custeio, despesas com pessoal e desonerações fiscais para dar fôlego fiscal ao Estado e permitir o aumento dos investimentos em políticas públicas.
O decreto publicado dá 90 dias para que a Secretaria de Fazenda realize uma avaliação dos benefícios fiscais em vigor no Estado. Tarcísio estima que seja possível cortar de R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões por ano. Segundo o governador, dos 64 incentivos fiscais que venceram em abril, ele não prorrogou 23, o que representa aumento de cerca de R$ 400 milhões em arrecadação por ano. Outros 250 benefícios serão reavaliados até dezembro.
O deputado Paulo Fiorilo (PT), líder da federação, afirma que a proposta do governador de rever as renúncias fiscais é “interessante”, mas que é preciso ter transparência sobre quais serão os critérios utilizados para definir quais setores perderão ou continuarão com o benefício.
“É preciso ter uma olhar crítico para aquilo que vai ficar e aquilo que ele já deu (de isenção)”, disse o petista, citando que Tarcísio concedeu, em 2023, benefícios fiscais que terão impacto de R$ 827 milhões em 2025. De acordo com o estudo, 80% do valor são renúncias para o agronegócio, setor no qual Tarcísio tem feito gestos. O último deles foi a prorrogação, até 2026, do prazo para que fazendeiros que ocupem terras devolutas sem ter a titularidade dos terrenos regularizem a situação com até 90% de desconto.
“Se for dar para os próximos, os apaniguados, está errado. Agora, ele acerta quando vai mexer na questão da desoneração, o que é importante. O problema é que esse Estado tem dinheiro, mas aplica mal”, continuou Fiorilo. Ele defende que os recursos obtidos sejam utilizados na saúde de forma que o governo não prossiga com a proposta de Emenda Constitucional (PEC) que reduz de 30% para 25% o piso para gastos na educação – a diferença seria aplicada na saúde.
A Secretaria de Fazenda disse que as renúncias não estão diretamente relacionada ao agronegócio e abrangem diversos setores, como indústria, comércio e serviços. Tarcísio afirma que o governo vai analisar individualmente os benefícios concedidos para estabelecer quais são determinantes para gerar investimentos, empregos e aumentar a competitividade do Estado.
“Tenho uma indústria aqui em São Paulo e uma similar na Zona Franca. A mesma empresa tem uma planta aqui e outra lá. Se eu tiro o benefício, ele desliga a chave aqui e começa a produzir só lá e eu tenho um decréscimo de arrecadação. O efeito é o oposto do que a gente quer”, exemplificou ele em entrevista nesta quinta-feira.
O bolsonarista Lucas Bove (PL) considera que há espaço para reduzir o tamanho do Estado, mas que prefere aguardar os estudos do governo para se posicionar sobre a extinção de benefícios fiscais. “A princípio eu sou contra, porque na prática representa aumento de imposto. O governador diz que vai fazer algo suave e desde que não prejudique nenhum setor da economia, concorrência com outros Estados. Vou aguardar a análise técnica”, disse.
Investimentos ficariam para ano eleitoral, segundo oposição
A lógica de Tarcísio é que é preciso reduzir gastos com custeio para aumentar investimentos públicos. “É fôlego para investir em política pública, ferrovia, metrô, hospital, educação, revisão da nossa infraestrutura, para a gente encarar mais parceria público-privada”, disse ele ao anunciar o plano ao Estadão.
Contudo, o estudo da federação PT-PCdoB-PV aponta que o aumento de investimentos mencionado pelo governador não ocorrerá imediatamente. De acordo com o documento, a rubrica diminuiu 12% na LDO de 2025, enquanto a previsão de superávit das contas públicas subiu 300%, para R$ 15 bilhões. “Possivelmente, está de olho na expansão de investimentos apenas para 2026”, diz o texto, mencionando o ano eleitoral.
Vice-líder do governo, Guto Zacarias (União) afirma que o plano de Tarcísio é aprofundar o movimento iniciado com a aprovação da reforma administrativa, que cortou 20% dos cargos comissionados, e acabar com “gastos e mordomias desnecessárias”.
“É importante também fazer uma revisão dos benefícios fiscais que foram concedidos pelos últimos governos sem muito critério e o próprio Tribunal de Contas do Estado questionou isso no momento da aprovação de contas”, disse ele. “Essas medidas são uma excelente sinalização para a população e para os investidores”, acrescentou.
Preocupação com extinção de órgãos e redução de despesa com pessoal
O governador também determinou estudos para extinção e reestruturação de órgãos e o corte de mais cargos, o que também gerou preocupação na oposição. Ainda não há definição sobre quais medidas serão tomadas, mas Tarcísio já demonstrou a intenção de realizar mudanças na Fundação Padre Anchieta, responsável pela TV Cultura, na Fundação para o Remédio Popular (Furp) e realizar parceria público-privada para a gestão da Fundação Casa.
“São órgãos de relevância para o Estado com pretensões de extinção fundadas muito mais em convicções político-ideológicas do quê em evidências técnicas que mostrem que esse serviço pode ser extinto ou ter a sua prestação modificada sem afetar a sua qualidade”, diz o documento da oposição.
Cada órgão e entidade, como fundações, agências e autarquias, terá que formular um plano para reduzir as próprias despesas. O decreto não estabelece o percentual de corte, mas as propostas podem incluir itens como pagamento de diárias e horas extras a servidores, aluguel de imóveis e carros, passagens aéreas e gastos com serviços de impressão, limpeza e vigilância.
O decreto também menciona venda de imóveis, a antecipação de créditos que o governo tem a receber e a ampliação dos casos em que as empresas podem utilizar créditos acumulados de ICMS e precatórios para pagar dívidas com o Estado.
Nota na íntegra da Secretaria de Fazenda de São Paulo
“O Governo de SP realiza uma ampla revisão dos benefícios fiscais de ICMS vigentes atualmente no Estado. Somente em abril, um quinto desses incentivos foram reavaliados e 23 deles descontinuados, resultando em uma economia aos cofres públicos. Até dezembro, outros cerca de 250 benefícios também serão revistos.
O objetivo do Governo é garantir a continuidade dos incentivos que efetivamente contribuam ao desenvolvimento dos setores produtivos, gerando investimentos, empregos e renda. Em relação à Lei de Diretrizes Orçamentárias, ele prevê aumento das renúncias fiscais porque foi elaborada dentro da conjuntura de benefícios até então vigentes. O impacto dos ajustes em benefícios fiscais será avaliado durante o ano e antes dos prazos de vigência, que termina no final de 2024.