Segundo a coluna de Vera Magalhães, o PSDB não é apenas um partido em busca de um candidato a presidente. Também é uma sigla à procura de um projeto de país. E parece mais distante de encontrar o discurso que de escolher um dos postulantes à sucessão de Jair Bolsonaro.
Nas pouco mais de duas horas de debate promovido pelo Globo e pelo Valor entre os três pré-candidatos sobraram justificativas para o apoio pretérito a Bolsonaro, críticas entre tímidas (no caso de Eduardo Leite) e mais enfáticas ao presidente, propaganda das próprias gestões feitas pelos dois governadores tucanos e alguma nostalgia do passado glorioso do partido.
Mas e para o futuro? O que propugna a sigla que por duas décadas se revezou com o PT no comando do Brasil, ajudou a formular e a implementar o Plano Real, quebrou os monopólios das telecomunicações e do petróleo, formulou a Lei de Responsabilidade Fiscal, implementou o Bolsa Escola no plano federal, promoveu a universalização do ensino fundamental, vendeu a Vale e criou os genéricos, só para ficar em alguns grandes projetos estruturantes?
Nem Doria nem Leite conseguiram apresentar, até aqui, a espinha dorsal de qual seu programa para o pós-bolsonarismo.
Se em 1995 Fernando Henrique Cardoso assumiu tendo o Real como força eleitoral e aproveitando a lua de mel com o eleitorado para fazer, logo de cara, as reformas econômicas mais difíceis e modelar as privatizações, agora os postulantes do partido saem de um patamar em que o PSDB não é sequer uma das principais vozes de oposição.
O partido não consegue nem ao menos se contrapor de forma inequívoca ao bolsonarismo, tanto que, no debate, os pré-candidatos tiveram de enfrentar o constrangimento de admitir que há setores das bancadas que flertam com o apoio ao presidente.
Para além do “bolsotucanismo”, pesa sobre a sigla o fato de cobrar mea culpa do PT sobre a corrupção tendo como um dos mandachuvas, inclusive das prévias, o deputado Aécio Neves, colhido pelo caso JBS em 2017.
No plano econômico, a defesa genérica de “reformas”, entoada em uníssono pelos três contendores, pouco se distingue da pregação de Paulo Guedes, por exemplo. No que as reformas tucanas diferem da geleia que o ministro da Economia de Bolsonaro tenta levar adiante, sem sucesso?
Essa nitidez é importante para dar algum sentido concreto ao discurso “nem Lula nem Bolsonaro”, ainda mais numa situação em que os tucanos não são mais nem mesmo a opção número 1 de partidos para alianças em 2022.
E aí se chega à tibieza política dos tucanos, para além da programática. A humilhação de Geraldo Alckmin nas urnas em 2018 — mesmo com a maior aliança, o maior tempo de TV e mais recursos financeiros — converteu o PSDB de um dos principais polos político-ideológicos do Brasil por 20 anos em nanico.
Não são os tucanos que lideram a oposição no Legislativo, onde a influência de Aécio Neves, a atração das emendas do Orçamento e a condescendência com o governo falam mais alto.
As prévias, que nos bastidores transcorrem em clima menos amistoso que o visto no debate, podem ser a oportunidade de oxigenar um partido que perdeu o protagonismo na cena política nacional.
Vencida essa etapa haverá outra, igualmente pedregosa: a de demonstrar que o vencedor das prévias é mais viável como alternativa à polarização entre Bolsonaro e Lula que os demais nomes postos até aqui. Nas pesquisas, até aqui, ninguém tem chances.
E, mais que tudo, esse nome precisará ter o que dizer a um país empobrecido, conflagrado e que terá perdido, ao término de quatro anos de Bolsonaro, o foguete para o futuro da economia, da sustentabilidade e da democracia.
Por ora, os postulantes do PSDB apenas tangenciam esses temas, sem serem capazes de empolgar eleitores de Norte a Sul do Brasil. Falta ao partido um “Plano Real” para o século 21.