A discussão do projeto de lei (PL) que regulamenta cassinos, bingos e o jogo do bicho no Brasil divide senadores da base governista e da oposição. Apoiada pela maioria dos líderes do Centrão, a matéria encontra forte resistência na bancada evangélica. A proposta deve retornar à pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) nesta quarta-feira (5). Diante do impasse, a expectativa é que seja concedido um pedido de vista (mais tempo para os parlamentares analisarem o texto).
O senador Davi Alcolumbre (União-AP), presidente da CCJ, garante que a proposta será votada antes do recesso parlamentar, marcado para 15 de julho. “Tem que votar antes (do recesso). Essa matéria está aqui há mais de um ano”, afirmou a Caetano Tonet e Julia Lindner, do jornal Valor.
Em meio à pressão da bancada evangélica, Alcolumbre já retirou o texto de pauta em duas oportunidades com a justificativa de que o relator, senador Irajá (PSD-TO), não estava presente. Ao Valor, o presidente da CCJ disse que não descarta indicar um novo parlamentar para a relatoria caso Irajá não compareça à próxima reunião do colegiado.
A posição de Alcolumbre quanto ao avanço da proposta é a mesma do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e ambos são favoráveis à proposta. “Considero um projeto importante, meritório e sou a favor”, declarou Alcolumbre, que nos bastidores tem bancado o avanço da matéria.
Contrário à proposta, o senador Marcos Rogério (PL-RO) reconhece que Alcolumbre é favorável ao projeto, mas diz que o presidente da CCJ está sabendo conduzir os trabalhos no processo de deliberação. “O Davi se comprometeu a votar, mas não está atropelando o processo”, afirmou o senador.
O principal argumento dos parlamentares favoráveis ao projeto está no potencial arrecadatório com a regulamentação dos cassinos. Em seu parecer, o senador Irajá estima que o mercado de jogos de azar no Brasil movimentou pelo menos R$ 15 bilhões em 2023, valor que, segundo ele, pode ultrapassar R$ 30 bilhões por ano.
Apesar do argumento de aumento na arrecadação, o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), reconhece que o assunto divide a base governista. “Eu não tenho até agora uma posição definitiva de governo. Se for olhar, quem tem a cabeça na Fazenda vai dizer que vai gerar arrecadação”, pontuou.
O Valor apurou que o ministério da Fazenda acompanha de perto a discussão, mas, até o momento, não pretende se posicionar.
Para o senador oposicionista Dr. Hiran (PP-RO) a regulamentação dos cassinos no país tem um potencial enorme na geração de empregos e por isso deve priorizar áreas em desenvolvimento.
“Cassinos são um investimento privado e que gera muito emprego no setor de serviços e entretenimento. As áreas que têm cassinos no mundo, como Las Vegas, ganham muito mais com entretenimento do que com jogo”, argumentou o senador.
Davi [Alcolumbre] se comprometeu a votar mas não atropela o processo”
— Marcos Rogério
A Frente Parlamentar Evangélica tem liderado o movimento para barrar o avanço da proposta e conta com o apoio de parlamentares da base do governo, como Eliziane Gama (PSD-MA), e Zenaide Maia (PSD-RN). Ontem, o senador governista Humberto Costa (PT-PE), afirmou já ter sido a favor da proposta, mas mudou de posição.
“Eu, em algum momento, ainda fui favorável à ideia de cassino em algumas estâncias, lugares turísticos e tal, mas eu confesso que hoje não sou mais a favor disso”, disse o senador, citando pontos como a preocupação com a saúde mental como consequências negativas. “Eu espero que o governo não apoie essas proposições, porque vem um discurso: ‘Não, mas o governo vai arrecadar mais, esse dinheiro está se perdendo”. E o custo que isso tem, não é? É um custo social, é um custo da saúde mental das pessoas.”
Para o senador Eduardo Girão (Novo-CE), um dos principais críticos do texto, as eleições municipais marcadas para outubro deste ano podem impactar a votação.
“É uma pauta que causa muita mobilização. Pastores do Brasil inteiro têm se posicionado contra. Acho que o fato de ser ano de eleição pode pesar na decisão dos parlamentares”, pontuou o senador.
Além das questões gerais da proposta, parlamentares devem se debruçar nas próximas semanas sobre pontos específicos do projeto, como o número de cassinos por Estado.
O texto prevê um estabelecimento para Estados com até 15 milhões de habitantes, dois para locais com população entre 15 milhões e 25 milhões e três para entes com mais de 25 milhões de pessoas. Com isso, São Paulo teria direito a três estabelecimentos, enquanto Minas Gerais e Rio de Janeiro poderiam ter até dois. A regra não vale para Amazonas e Pará, que têm direito a dois Cassinos pela extensão territorial.
No caso dos bingos, a regra prevê um estabelecimento a cada 150 mil habitantes e para o jogo do bicho de um a cada 700 mil pessoas.
Jaques Wagner defende uma mudança nesse ponto. “Eu acho graça que todo mundo aqui bate no peito e diz que é de mercado. Se é de mercado deixa concorrer”, diz o senador.