A relevância da aplicação das penas e medidas alternativas no Brasil foi destacada nesta última quinta-feira (26) pelo procurador de Justiça baiano Geder Gomes, que palestrou no ‘Seminário Internacional sobre Justiça Negociada, Acordo de Não Persecução Penal e Alternativas Penais: experiências na América Latina’. Ao participar do evento promovido pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), ele sinalizou que “punir com penas alternativas é punir melhor, com mais efetividade, já que os próprios dados demonstram, por exemplo, que a reincidência é menor” e lembrou que este tipo de pena não pode ser aplicada para crimes graves. Também destacou que é possível e preciso utilizar todas as ferramentas que o sistema dispõe, sendo a pena alternativa uma delas, e que é necessário “dar continuidade ao que já tivemos”.
Segundo o procurador de Justiça, as penas alternativas foram utilizadas com bastante propriedade entre os anos de 2002 e 2010. Nesse período, as Centrais de Penas Alternativas, “verdadeiras coletâneas de saberes que vão para além do Direito”, atuaram muito e como verdadeiras células-modelo criadas com fundamento na aplicação da sanção não carcerária, mas para reforçar valores no penitente. Com o esse modelo, um preso custava 60 vezes menos e a reincidência era 10 vezes menor do que a do cárcere, informou Geder Gomes, lamentando o fato de que, nos últimos oito anos, houve uma “brusca mudança de paradigmas”. Já nos últimos quatro anos, disse ele, “infelizmente” houve uma descendente vertiginosa com relação a aplicação de alternativas penais no Brasil. O procurador acredita que isso tem a ver com o discurso atual que alimenta a ideia de que justiça é prisão. Ele informou que, na década de 90, existiam 600 tipos penais, 500 unidades prisionais e cerca de 90 mil presos. Em 2019, já somamos 1.300 tipos penais, cerca de 2 mil unidades prisionais e quase 800 mil presos. “Nenhum país do mundo teve uma evolução numérica no sistema prisional como o Brasil”, lamentou.
Geder Gomes ressaltou que, na pandemia, as alternativas penais sofreram um grande impacto porque o caminho desse tipo de solução é o de nutrição de valores, que se dão com o contato social, o que não ocorre em momentos de isolamento. Também apontou o que considerou um problema sério: o fato de haver no Sistema de Justiça uma ideia central de suspensão de tudo, das penas e medidas alternativas. Para o procurador, o problema é sério porque o perfil do penitente não muda, é cheio de carências e vulnerabilidades, e tudo se agrava no cenário de pandemia. “A exclusão que já existia é aumentada”, alertou. Geder lembrou que a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade existe, mas que isso também preocupa porque não pode ser usada demasiadamente, a ponto de haver descrédito do sistema da pena alternativa. Ele acredita que não há necessidade de modificação legislativa, mas de interpretação pelo Judiciário e Ministério Público, que precisam entender que, no período de pandemia, a discricionariedade tem que ser exercida com um pouco mais de cautela. Falou ainda sobre a atual mobilização “personalíssima e populíssima” em relação ao descrédito das instituições, que também precisa ser observada. “A ambiência atual chega ao limite de indicar possível descumprimento de decisões judiciais, questionamentos no tom de desrespeito, o que é um caminho para morte da democracia”, alertou, frisando que é preciso refletir a respeito dessas questões e que todo o contexto deve inserir o mundo jurídico.