Presidente nacional do PL, o ex-deputado Valdemar Costa Neto tem em seu nome segundo a Folha de S. Paulo em uma madeireira no Amazonas que acumula dívida ativa de R$ 5,4 milhões com a União, quase integralmente relativa a tributos federais não pagos.
As dívidas fizeram a empresa ser abandonada nas últimas décadas e, em junho de 2022, ela foi declarada inapta pela Receita Federal por não fazer declarações ao Fisco há pelo menos dois anos.
Caso não haja medidas efetivas de cobrança, a empresa pode ser beneficiada com a prescrição e consequente arquivamento dos débitos. Essas medidas de cobrança incluiriam, por exemplo, a penhora de bens.
Há um processo de execução que tentou penhorar bens da empresa, mas oficiais de Justiça tiveram dificuldade em localizá-los ao longo dos anos. A União é a responsável por tentar recuperar esses valores, por meio da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional).
Valdemar é listado como sócio da empresa, chamada Agropecuária Patauá, desde a década de 1980. A empresa foi criada em 1983 e se chamava, antes, Agropecuária São Sebastião. Os negócios eram conduzidos principalmente pelo pai de Valdemar, o ex-prefeito de Mogi das Cruzes (SP) Waldemar Costa Filho, morto em 2001.
A firma dizia atuar em “fabricação de madeira laminada, compensada, prensada e aglomerada”.
Em fevereiro do ano 2000, outra empresa, chamada Reflorestadora Holanda, comprou 75% da Patauá.
O presidente do PL ficou com 25% da Patauá, mas argumentou à Junta Comercial do Amazonas que as quotas ficariam em seu nome, mas seriam destinadas à sua ex-mulher (ele não especifica o nome) por acordo de partilha de divórcio.
Segundo Valdemar, ela “oportunamente deverá manifestar sua intenção, ou não, de permanecer na sociedade”.
Mais de 20 anos depois, não houve nenhuma manifestação no processo. A empresa continua em nome do presidente do PL.
A Folha procurou Valdemar Costa Neto várias vezes, por meio de sua assessoria, mas ele não quis se manifestar.
Consultados pela Folha, dois advogados especializados em direito tributário e um auditor da Receita Federal afirmam que, para fins legais, a empresa ainda não foi transferida.
Apesar disso, o ex-deputado parou de declarar os 25% da propriedade à Justiça Eleitoral ao se candidatar em 2002, 2006 e 2010. A empresa constou em sua lista de bens de 1998.
Ele não concorreu a cargos eletivos após esse período, já que foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do mensalão e preso em 2013.
Por causa de um débito trabalhista da Reflorestadora Holanda, sua sócia, Valdemar chegou a ter as contas bloqueadas pela Justiça em 2016.
O presidente do PL recorreu, sob o argumento de que nessas contas ele recebia aposentadoria e salário e que o ex-funcionário que o processou não provou que a Patauá era uma empresa do mesmo grupo da Reflorestadora Holanda (à qual o ex-funcionário pertencia), e conseguiu o desbloqueio.
“Ele [Valdemar] conseguiu desbloquear, mas nós continuamos [tentando o bloqueio], porque como era uma [empresa de sociedade] Ltda., a desconsideração da personalidade jurídica tinha que ser feita através de um processo à parte, que não foi feito no inicial”, afirma Edmilson Almeida de Oliveira, advogado do ex-funcionário.
A Reflorestadora Holanda pertence a um empresário chamado Francisco Jonivaldo Mota Campos, que diz não conhecer o político e ter comprado as quotas da empresa para fazer um trabalho de “reflorestamento de áreas degradadas”.
A Holanda tem débitos ainda maiores com a União: R$ 13 milhões, em parte também por ausência de pagamentos de tributos federais, como o ITR (Imposto Territorial Rural).
Ela foi considerada “baixada” em 2015, medida tomada também por ausência de declarações por ao menos cinco anos. É uma escala abaixo da empresa “inapta”, que ainda pode regularizar o CNPJ e voltar a funcionar.
Francisco Jonivaldo também responde a uma ação civil pública do Ministério Público Federal sob acusação de dano ambiental pelo suposto desmatamento de uma área de 23,6 hectares de floresta nativa da Amazônia, sem autorização do órgão ambiental competente.
A reportagem da Folha visitou os lugares onde a Patauá dizia funcionar, nos endereços da matriz e da filial, e não encontrou sinais de atividade. Um dos endereços, onde foi registrada a filial, nem sequer existe hoje em dia.
Francisco Jonivaldo afirma que as empresas existem apenas “para o sistema”. “Porém, elas não estão funcionando desde 2004, se não me falha a memória”, afirma o empresário.
Ele diz que não conhece Valdemar Costa Neto e que, quando se instalou no Amazonas para “um projeto de reflorestamento para recuperar áreas degradadas”, comprou uma fazenda com pasto da Patauá porque tinha melhores condições de solo.
Afirma que teve problemas com supostas fraudes relacionadas a uma empresa de contabilidade contratada pela sua companhia relacionadas ao INSS. Após esses problemas, diz, “a empresa Reflorestadora Holanda perdeu o interesse de seus investidores e tudo veio abaixo”.
“A reflorestadora morreu no nascedouro por conta disso. Só sobrou dívida”, afirma.
Ainda de acordo com Francisco Jonivaldo, a acusação por dano é “provavelmente um engano”, porque ele não tem áreas na região apontada pelo Ministério Público.
Também diz que o funcionário que processou as empresas e conseguiu bloquear as contas de Valdemar é “o único que entrou na Justiça do Trabalho” depois que a empresa fechou.
Também procurada a respeito de quais providências tem tomado para cobrar as dívidas da Patauá e da Reflorestadora Holanda, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional afirmou, por meio da assessoria de imprensa, que “não comenta sobre dívidas específicas de devedores que constam na Dívida Ativa da União”.
Bolsonaro, que foi eleito em 2018 pelo PSL (atual União Brasil), se filiou ao PL em novembro do ano passado para disputar a reeleição à Presidência.
A ida de Bolsonaro para o PL consagrou a aliança do presidente com o centrão, que também tem como representantes partidos como o Republicanos e o PP, que dão sustentação ao governo federal no Congresso Nacional.