O dia de São Jorge é comemorado neste domingo (23) e, no sincretismo religioso, muitas pessoas associam o santo aos orixás Ogum e Oxóssi. Apesar da Bahia ser um estado onde a mistura de religiões marca presença na maior parte das festas populares, será mesmo que a figura do guerreiro católico pode ser associada às divindades do Candomblé?
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro Amerindia (AFA), Leonel Monteiro ao g1 Bahia, para responder essa pergunta é preciso voltar ao período colonial do Brasil, quando os africanos escravizados foram trazidos para o país.
Ao serem capturados na África, eles perderam todas as liberdades possíveis – inclusive a de exercerem suas próprias religiões. Por isso, no Brasil, os escravizados passaram a celebrar suas divindades de forma disfarçada, durante celebrações de santos católicos.
“O sincretismo é consequência da escravidão, assim como o racismo religioso”, afirmou Leonel Monteiro. O “disfarce” durou mais de 300 anos e, ao longo da história, os santos católicos e divindades africanas foram se “misturando”, o que deu origem ao sincretismo religioso. Por isso, é normal celebrar Santa Bárbara e Iansã, Nossa Senhora dos Navegantes e Iemanjá, São Jorge e Oxóssi. Mas apesar disso ser comum na Bahia, colonizada por africanos escravizados, o presidente da AFA afirma que santos e orixás são bem diferentes.
“Os santos católicos normalmente são pessoas que viveram e depois se tornaram santas. No candomblé não, as divindades não são pessoas”, afirmou.
Nessa perspectiva, a única possível coincidência entre São Jorge e Oxóssi é a lança. Enquanto o primeiro foi um turco capitão do exército romano, o segundo é do clã de grandes caçadores, conhecido inclusive como “o guardião noturno de uma flecha só”.
Para Leonel, insistir nesse tipo de comparação é uma forma de diminuir a importância das religiões de matrizes africanas. “É dizer para a sociedade intolerante que, se não estiver ligado ao cristianismo, não serve, é menor”, explicou.
Nas comemorações das divindades, que historicamente acontecem na mesma época dos santos católicos devido ao sincretismo, os terreiros fazem oferendas e rezas para o orixá. Normalmente, há também uma festa aberta ao público.
Independente da crença, destaca Leonel, o importante é entender que não existe uma espécie de “tradução” entre santos católicos e divindades das religiões de matrizes africanas, onde um corresponde ao outro.