Os Estados Unidos têm um problema a resolver com a presença de Jair Bolsonaro na Flórida.
O ex-presidente viajou para o Estado norte-americano dois dias antes de seu mandato terminar em 1º de janeiro, mas deixou para trás um movimento violento de negacionistas das eleições que neste domingo invadiram o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF).
Depois de assistir apoiadores do então presidente norte-americano Donald Trump invadirem o Capitólio dos EUA dois anos atrás, o presidente Joe Biden agora enfrenta uma pressão crescente para remover Bolsonaro de seu autoexílio nos arredores de Orlando.
“Bolsonaro não deveria estar na Flórida”, disse o parlamentar democrata Joaquin Castro à CNN. “Os Estados Unidos não deveriam ser um refúgio para esse autoritário que tem inspirado o terrorismo doméstico no Brasil. Ele deveria ser enviado de volta ao Brasil.”
Castro acrescentou que Bolsonaro, um seguidor de Trump que está atualmente no Estado natal do ex-presidente, “usou o manual de Trump para inspirar terroristas domésticos”.
A deputada democrata Alexandria Ocasio-Cortez compartilha essas opiniões: “Os EUA devem parar de conceder refúgio a Bolsonaro na Flórida”, tuitou neste domingo. “Quase dois anos depois do dia em que o Capitólio dos EUA foi atacado por fascistas, observamos movimentos fascistas no exterior tentando fazer o mesmo no Brasil.”
Os comentários aumentam a pressão sobre Bolsonaro, e destacam a agora grande decisão que Washington precisa tomar sobre seu futuro.
Bolsonaro tem tido um relacionamento turbulento com Biden e já estava em situação complicada no Brasil, depois de perder amplas proteções de processos judiciais quando deixou o cargo de presidente. Investigações em curso podem levar à sua prisão ou torná-lo inelegível, conforme informou a Reuters na semana passada.
John Feeley, que foi embaixador dos EUA no Panamá de 2016 a 2018, quando o país da América Central buscou a extradição de seu ex-presidente Ricardo Martinelli, disse que a ameaça mais imediata a Bolsonaro virá se seu visto norte-americano for revogado, deixando-o à deriva no palco internacional.
“Os Estados Unidos –ou qualquer nação soberana, na verdade– podem remover um estrangeiro, mesmo um que entrou legalmente com visto, por qualquer motivo”, disse Feeley. “É uma decisão puramente soberana para a qual nenhuma justificativa legal é necessária.”
Uma autoridade consular dos EUA, falando sob condição de anonimato, disse que Bolsonaro entrou nos Estados Unidos quase que certamente com um visto A-1, que é reservado para chefes de Estado.
Normalmente, o A-1 é cancelado depois que o beneficiário deixa o cargo. No entanto, com Bolsonaro tendo deixado o Brasil antes do fim de seu mandato, a autoridade suspeita que seu A-1 ainda esteja válido.
A autoridade, que tem experiência com o cancelamento de vistos para ex-chefes de Estado, disse que não há limite de tempo para que alguém possa permanecer nos Estados Unidos sob um visto A-1.
“Estamos em território desconhecido”, disse a autoridade. “Ninguém sabe quanto tempo ele vai ficar.”
O Departamento de Estado dos EUA não respondeu de imediato a um pedido de comentário.
Bolsonaro pode não querer voltar tão cedo ao Brasil, onde é acusado de instigar um movimento violento de negacionismo eleitoral com alegações infundadas de que o sistema eleitoral brasileiro é propenso a fraudes.
Lula culpou neste domingo seu antecessor pela invasão aos edifícios-sede dos Três Poderes.
“Esse genocida não só provocou isso, não só estimulou isso, como, quem sabe, está estimulando ainda pelas redes sociais, lá de Miami”, disse, referindo-se ao ex-presidente, que, na verdade, está na cidade de Orlando.
Em um tuíte neste domingo, Bolsonaro rejeitou as acusações de Lula e disse que a invasão ultrapassou os limites do protesto pacífico.
Bolsonaro estava sob investigação em quatro inquéritos criminais no STF antes de deixar o cargo de presidente.
Após a invasão deste domingo, especialistas jurídicos disseram que ele pode se tornar alvo de uma investigação do Supremo sobre protestos antidemocráticos, que já rendeu várias prisões de aliados dele.
Se o ministro do STF Alexandre de Moraes assinar um mandado de prisão enquanto Bolsonaro estiver nos Estados Unidos, o ex-presidente é obrigado a voltar ao Brasil e se entregar à polícia. Se ele se recusar, o Brasil emite um alerta vermelho pela Interpol para solicitar sua prisão por agentes federais dos EUA.
Uma vez detido em solo norte-americano, o Brasil teria que buscar formalmente sua extradição. Bolsonaro estaria livre para apelar nos tribunais dos EUA, ou poderia tentar pedir asilo, embora isso não ofereça garantia de impedimento do seu retorno ao Brasil.
O ex-presidente panamenho Martinelli foi extraditado dos Estados Unidos de volta ao Panamá em 2018, três anos depois que a Suprema Corte do Panamá emitiu seu mandado de prisão.