A semana política terminou com a notícia de que o MDB fez um convite ao presidente Jair Bolsonaro para que ele se filiasse ao partido. A informação foi dada inicialmente pelo jornalista Gerson Camarotti, da TV Globo, na sexta-feira (9). O convite teria sido feito pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM).
A ideia de Bolsonaro integrar-se ao MDB, especialmente depois que o partido retirou da sigla o “P” e retornou às três letras que o caracterizavam durante a ditadura militar, não deixa de ser surpreendente. Afinal, o MDB foi criado para fazer oposição ao regime que Bolsonaro sempre defendeu com unhas e dentes. Políticos do partido, como Rubens Paiva, foram mortos pela ditadura. Sob o comando de Ulysses Guimarães, o MDB acabou por conduzir a eleição de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, em 1985, pondo fim ao regime e redemocratizando o país. Ao promulgar a Constituição de 1988, Ulysses comunicou em seu discurso, que tinha “ódio e nojo” da ditadura.
Nova roupagem
Mas o MDB não é mais comandado por Ulysses. E o novo MDB, outra vez com a sigla de três letras, parece ter as mesmas características pragmáticas da atual roupagem de Bolsonaro na sua aproximação com setores políticos do Congresso. E é neste momento que retorna também aos holofotes da política outro nome que tem essas características, o senador Renan Calheiros (MDB-AL).
Renan andava sumido dos corredores azuis do Senado desde que foi derrotado na disputa pela presidência da Casa por Davi Alcolumbre (DEM-AP). Durante a pandemia, optara por um mergulho na sua base eleitoral, Murici, cidade
administrada por Olavo Calheiros Neto, seu sobrinho. Reapareceu como organizador do jantar que reconciliou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o ministro da Economia, Paulo Guedes.
Ao promover a reaproximação, Renan faz seus cálculos políticos. Se aproxima de Bolsonaro justamente no momento em que o presidente trabalha para aumentar sua popularidade no Nordeste, sua região política. E quando o presidente busca meios de financiar seu programa social, o Renda Cidadã. Renan foi o relator no Senado do Bolsa Família dos governos petistas.
Consensos políticos
A iniciativa de Renan de tentar reaproximar Guedes e Maia foi elogiada por colegas, como o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB). “Ele soube ter a visão de papéis que desempenhou no passado e usou a experiência anterior para resolver uma situação situação delicada. É um político de reconhecida habilidade”, disse aos repórteres Julia Chaib, Gustavo Uribe e Danielle Brant, da Agência Folha. É uma avaliação parecida com a de um colega de Renan no Senado, que afirma que o ex-presidente da Casa “faz o que sempre faz, busca consensos políticos”.
Sempre próximo dos governos
Na verdade, a história política de Renan é de incrível capacidade de aproximação dos governos, sejam quais forem. Depois de um início no MDB, em oposição ao regime militar, em 1979, Renan foi eleito pela primeira vez deputado federal em 1982, quando Fernando Collor elegeu-se governador de Alagoas. Na época, chamava Collor de “príncipe herdeiro da corrupção”. Alguns anos depois, era um dos artífices da construção da candidatura de Collor à Presidência. Filiou-se ao PRN de Collor e tornou-se líder do governo.
Em 1990, depois de atritos relacionados com a campanha de Geraldo Bulhões ao governo alagoano, rompeu com Collor, denunciando a existência de um esquema de corrupção comandando pelo ex-tesoureiro da campanha presidencial, Paulo Cesar Farias, o PC. Chegou a depor na CPI que deu origem ao processo de impeachment de Collor.
No governo Itamar Franco, lá estava Renan Calheiros, de 1993 a 1994, como vice-presidente executivo da Petrobras Química S.A.
Ministro da Justiça
Fernando Henrique Cardoso foi eleito para suceder Itamar Franco e, em 1998, eis que Renan se torna ministro da Justiça. Na primeira eleição de Lula, oficialmente o PMDB apoiou o candidato do PSDB, José Serra. E registre-se que o único estado em que Serra venceu as eleições foi Alagoas. Mas, logo depois, Renan já estava entre os nomes que articulavam uma aproximação com o novo governo eleito. Aliado de Lula no PMDB, José Sarney elegeu-se presidente do Senado em 2003. Na sequência, Renan o sucedeu no comando da Casa.
O PMDB era aliado de Dilma Rousseff, tanto que compunha mesmo a sua chapa, com Michel Temer como vice. Ao final, Renan e vários outros peemedebistas votaram por seu impeachment.