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segunda-feira 21 de março de 2022 às 09:38h

PPP de saneamento de R$ 7 bi no Nordeste testa a lei e indispõe BNDES com Economia

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Uma parceria público-privada bilionária, que tem como objetivo levar a universalização do saneamento básico para duas regiões metropolitanas no Ceará, regi] tornou-se pivô de um mal-estar entre o Ministério da Economia e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O lançamento do edital da PPP está previsto para as próximas semanas e o governo estadual, comandado por Camilo Santana (PT), prevê o leilão para o começo do segundo semestre.

Para auxiliares do ministro Paulo Guedes, a PPP contraria frontalmente o novo marco legal do saneamento, uma das grandes vedetes do governo Jair Bolsonaro. A Lei 14.026 foi sancionada em julho de 2020 e, na visão da equipe econômica, veda PPPs que ultrapassem 25% do valor dos contratos de concessão no setor.

O projeto no Ceará na região Nordeste, abrange dois blocos, que abrangem a capital Fortaleza e Juazeiro do Norte, bem como municípios vizinhos. Atualmente, essas duas regiões metropolitanas correspondem a 83% das receitas obtidas pela Cagece (companhia estadual de água e esgoto) e a 73% da população atendida pela estatal.

A interpretação do texto (artigo 11-A da lei) que impõe restrições sobre PPPs não é unânime e abriu margem para a continuidade da PPP. Para a equipe econômica, se o projeto for mesmo levado adiante, pode liberar a porteira para outras parcerias público-privadas que driblem o “espírito” do novo marco e colocar em risco a eficácia de uma legislação elogiada pelo mercado.

Por isso, a equipe econômica faz críticas duras à participação do BNDES, que estruturou a PPP para o governo do Ceará. O presidente do banco, Gustavo Montezano, foi cobrado pessoalmente pela cúpula do ministério devido ao apoio da instituição para um projeto que feriria – na avaliação da pasta – a Lei do Saneamento.

O novo marco estimula a entrada de investidores privados na distribuição de água, na coleta e no tratamento de esgoto, a fim de universalizar esses serviços até 2033. A lei deixou uma brecha para que parcerias público-privadas em estudo ou “em curso” pudessem ser licitadas no prazo de um ano, ou seja, até julho de 2021. Esse dispositivo viabilizou as PPPs em Cariacica (ES) e 68 municípios em Mato Grosso do Sul.

Quando a legislação foi criada, o objetivo era incentivar a concessão plena dos serviços. As estatais de saneamento podem continuar à frente da operação de água e esgoto, onde já têm contratos, desde que comprovem capacidade econômica atingir a universalização.

O desestímulo às PPPs ficou mais nítido em outro parágrafo do mesmo artigo: “Para a observância do princípio da modicidade tarifária aos usuários e aos consumidores, […] ficam vedadas subconcessões ou subdelegações que impliquem sobreposição de custos administrativos ou gerenciais a serem pagos pelo usuário final”.

Mesmo com a lei mais restritiva, o Ceará resolveu prosseguir na estruturação do projeto com o BNDES, que começou a ser feita em 2018, ainda no governo Michel Temer. Quando os estudos ficaram prontos e o governo estadual abriu consulta pública, o banco divulgou a PPP em seu site.

A parceria prevê R$ 7 bilhões de investimentos nos 30 anos de contrato – dos quais R$ 3,2 bilhões nos primeiros cinco anos – e o avanço da coleta e do tratamento de esgoto dos atuais 59% para 95% da população dos 23 municípios cobertos. O fornecimento de água permanecerá sob a responsabilidade da Cagece.

O Ministério da Economia tem pedido ao BNDES que deixe de apoiar esse projeto e chega até a falar, nos bastidores, em “morte prematura” do novo marco legal – na premissa de que outros Estados, em vez de organizar blocos de concessão “pura” do saneamento, vão usar as PPPs como forma de dar sobrevida às suas companhias de água e esgoto. Isso, segundo auxiliares de Guedes, gera justamente a sobreposição de custos administrativos que é coibida pela lei.

Consultado pelo jornal Valor, o diretor de concessões e privatizações do BNDES, Fábio Abrahão, evitou entrar em detalhes sobre as divergências, mas frisou que o banco não fará nada que contrarie a Lei do Saneamento. “O que ultrapassa 25% do valor do contrato, não tem como fazer”, disse Abrahão.

O presidente da Cagece, Neuri Freitas, afirmou não ver incompatibilidade entre a lei e o projeto. Segundo ele, a vedação expressa às PPPs só ocorre no decreto de regulamentação do novo marco do saneamento. E o decreto, acrescentou Freitas, não pode ir além da lei.

O executivo argumentou que a PPP não deve ser considerada “subdelegação”, o termo adotado na lei, pois trata-se de um contrato administrativo e a relação do usuário final continuará sendo com a Cagece. “Vamos pagar o prestador de serviço de acordo com o que ele executar e com a sua perfomance.”

Mesmo assim, Freitas disse ter a expectativa de ficar abaixo do limite de 25%, uma vez que o leilão será pela menor tarifa proposta.

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