O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu manter a taxa básica de juros (Selic) em 10,50% ao ano, após sete cortes consecutivos iniciados em agosto do ano passado, quando a taxa estava em 13,75%. A decisão interrompe o ciclo de queda a contragosto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que disse nesta terça-feira avaliar que “não tem explicação a taxa de juros do jeito que está”, mas em linha com a expectativa do mercado financeiro.
Segundo comunicado do Banco Central, a decisão foi tomada de forma unânime pelos nove integrantes do Copom.
Em uma pesquisa realizada pelo Valor Data com 132 instituições, 123 esperavam estabilidade da Selic em 10,50%, enquanto apenas nove viam espaço para mais um corte de 0,25 ponto percentual, como na reunião de maio.
A manutenção da taxa ocorre em um momento de disparada do dólar, que tem impactos inflacionários, e do aumento dos riscos fiscais, especialmente após a mudança da meta de 2025 e da ausência até o momento de medidas concretas de corte de gastos. Além disso, a inflação corrente medida pelo IPCA subiu de 3,69% em 12 meses até abril para 3,93% no período encerrado em maio, contra uma meta de 3,0% neste e nos próximos anos.
As expectativas de inflação futura, já distantes da meta, se afastaram ainda mais desde o Copom de maio. Entre os motivos estão temores sobre o compromisso do BC com a meta de inflação quando a maioria do colegiado for formado por indicados do governo Lula.
Para 2025, ano em que o BC mira para colocar a inflação na meta, houve alta de 3,64% para 3,80% na mediana do Boletim Focus. Mesmo a projeção do Copom já estava acima do alvo a ser perseguido no último encontro, em 3,3%. Ainda houve deterioração no Focus de expectativa mais longa, de 2026, de 3,50% para 3,60%. Por fim, o cenário internacional está mais adverso para o Brasil diante do diagnóstico de que os juros americanos ficarão altos por mais tempo.
Na última reunião do Copom, no mês passado, o BC tinha deixado o caminho aberto para as decisões futuras, citando que as incertezas no cenário global, a resiliência da atividade doméstica e as expectativas de inflação longe da meta demandavam cautela.
A decisão de maio aumentou bastante a temperatura em torno do comitê em função do racha entre os quatro diretores indicados por Lula, que queriam um corte de 0,50 ponto percentual, e os cinco membros que já estavam no comitê no governo anterior, cuja decisão foi por uma queda de 0,25 ponto.
Ainda que os dissidentes tenham apresentado argumentos técnicos, ligados principalmente à indicação dada na reunião anterior por corte de 0,50 ponto, a divisão aumentou os temores de uma postura mais tolerante com a inflação a partir de 2025, quando os nomeados pelo presidente da República serão maioria. No fim do ano, acabam os mandatos do presidente do BC, Roberto Campos Neto, e de outros dois diretores.
Desse modo, aumentou a pressão sobre a posição dos quatro “emissários” de Lula na reunião deste mês, principalmente sobre Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária e ex-número 2 de Fernando Haddad no Ministério da Fazenda, principal cotado para assumir a vaga de Campos Neto. Na avaliação do mercado, novo dissenso similar ao do encontro de maio deve alimentar a sangria dos ativos brasileiros no mercado financeiro.
A politização em torno do Copom aumentou ainda mais na semana passada devido à ida do presidente do BC a um jantar oferecido pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-ministro de Jair Bolsonaro, em sua homenagem. Na ocasião, segundo o jornal Folha de S.Paulo, Campos Neto teria dito a interlocutores que aceitaria ser ministro da Fazenda de Tarcísio caso ele concorra ao Palácio do Planalto e ganhe as eleições em 2026.
Na terça-feira, em entrevista à CBN, Lula afirmou que a única coisa “desajustada” no país é o Banco Central e questionou a autonomia de Campos Neto.
— Nós só temos uma coisa desajustada no Brasil nesse instante: é o comportamento do Banco Central. Essa é uma coisa desajustada. Um presidente do Banco Central que não demonstra nenhuma capacidade de autonomia, que tem lado político e que, na minha opinião, trabalha muito mais para prejudicar o país do que para ajudar o país.