O descaso das agências aeroespaciais para o assunto inspirou um artigo científico, publicado no final de 2021 na revista The Journal of Sex Research, chamado “Em defesa da sexologia espacial”. Nele, um grupo de pesquisadores internacionais, liderados por Simon Dubé, da Universidade de Concórdia, no Canadá, propõe que todos os programas espaciais adotem uma nova disciplina: a sexologia espacial.
Definida como “o estudo científico da intimidade e sexualidade extraterrestre”, essa nova área do conhecimento quer discutir os riscos e benefícios de qualquer forma de expressão sexual ou íntima fora da Terra. O objetivo é estabelecer um framework de pesquisa baseado em três dimensões fundamentais: biológica, psicológica e social. Essa estrutura conceitual orientaria uma abordagem interdisciplinar para o tema.
Sexo é tabu nas agências espaciais
Apresentando seu artigo no periódico The Conversation, os autores afirmam que, “na prática, a ciência de foguetes pode nos levar ao espaço sideral, mas serão as relações humanas que determinarão se sobreviveremos e prosperaremos como uma civilização espacial”. Embora já tenha enviado ao espaço, sem saber, um casal recém-casado em uma mesma missão em 1992, a Nasa assegura categoricamente que nenhum ser humano jamais fez sexo fora da Terra.
Oficialmente, a agência espacial norte-americana, assim como suas análogas ESA e Roscosmos não proíbem explicitamente o sexo no espaço. A questão, porém, é tratada com tanta discrição que o assunto raramente é discutido em público. Uma das razões historicamente alegadas pela Nasa é que uma eventual atividade sexual no espaço complicaria a dinâmica da equipe, com surgimento de ciúmes, conflitos interpessoais e até influência nas hierarquias,
As poucas referências a sexo no espaço se limitaram até hoje a estudos dos impactos da radiação e da micro ou hipergravidade na reprodução animal, mas apenas de roedores, anfíbios e insetos. Para Simon Dubé e seus colegas, liberar o erotismo extraterrestre poderia melhorar a saúde mental dos astronautas, ajudá-los a se adaptar à vida espacial e promover o bem-estar dos habitantes de futuros assentamentos em outros planetas.
Indo onde ninguém mais já esteve
Em seu artigo no The Conversation, os autores lembram que a sexualidade humana transcende a simples função reprodutiva, e abrange um conjunto de aspectos psicológicos, vínculos emocionais e interações interpessoais. Lembrando que amor e sexo também são buscados por diversão e prazer, o estudo defende que a exploração espacial tenha a coragem de abordar as necessidades íntimas dos humanos de forma honesta e holística.
Uma vez que a vida nos habitats poderá impactar as funções reprodutivas e sexuais dos astronautas e impor novos protocolos de abstinência e higiene íntima, pouca atenção está sendo dispensada à questão sexual, afirmam os autores. Mas, “para avançarmos, as organizações da área devem parar de evitar os tópicos sexuais e reconhecer por completo a importância do amor, do sexo e das relações íntimas na vida humana”, defendem os cientistas no The Conversation.
Para além dos aspectos técnicos ou científicos, argumentam, a sexologia espacial pode ter um impacto positivo em alguns problemas persistentes na ciência e nas forças armadas, como sexismo, discriminação e violência/assédio sexual. Finalmente, por serem canadenses, os pesquisadores propõem que a agência espacial do país, a CSA, assuma o pioneirismo do tema, e vá “onde ninguém jamais esteve”, como a tripulação da série Jornada nas Estrelas.