Conforme artigo de
, na Veja, com seu discurso nesta pré-campanha, o candidato Lula da Silva riscou o chão em relação ao Centrão, o grupo de partidos que apoiou todos os governos desde a volta da democracia, incluindo os do PT. Falando a sem-terras no assentamento Eli live em Londrina, Lula afirmou que “o Congresso Nacional nunca esteve tão deformado como está agora. Nunca esteve tão antipovo, tão submisso aos interesses antinacionais. É talvez o pior Congresso que já tivemos na história do Brasil”.Em um ataque frontal ao presidente da Câmara, Arthur Lira, líder do Centrão e do bolsonarismo, Lula disse: “O Ulysses Guimaraes que foi figura humana extraordinária, presidente da Constituinte e presidente da Câmara, não tinha 10% da força que tem hoje o Arthur Lira como presidente”, em função das regras que permitem ao presidente da Câmara distribuir neste ano mais de R$ 30 bilhões em emendas parlamentares.
É uma declaração de guerra. Até semanas atrás, mesmo dentro do PT se supunha que um eventual novo governo Lula teria como base o apoio dos deputados Centrão, mesmo que hoje eles estejam com Bolsonaro. O discurso indica que o plano de Lula é formas uma coalização centralizada na aliança do PT com o PSB, com a participação do MDB de Renan Calheiros, o PSD de Gilberto Kassab, o PSDB de Tasso Jereissati e até partes do União Brasil, mas sem o núcleo do Centrão formado por Arthur Lira, Ciro Nogueira e Valdemar da Costa Neto.
O que fez Lula romper foi a decisão de Arthur Lira de formar uma comissão de dez deputados para apresentar um projeto à Constituição instituindo o semipresidencialismo, o sistema de governo no qual o presidente é eleito pelo voto popular, mas comanda apenas a Defesa e as Relações Exteriores. O poder de facto é de um primeiro-ministro aprovado pelo Congresso. Pela versão oficial de Lira, a comissão vai criar um projeto para instituir o novo sistema a partir de 2030. Você acreditou? Nem o Lula.
“Não conseguiram aprovar o parlamentarismo com dois plebiscitos (em 1963 e 1993), então vão tentar uma mudança na Constituição para criar o semipresidencialismo. Você elege um presidente, pensa que vai governar, mas quem vai governar é a Câmara, com orçamento secreto para comprar o voto dos deputados, para fazer todas as desgraceiras que estão fazendo”, discursou Lula.
Arthur Lira é um adversário muito mais duro de ser batido que Jair Bolsonaro. Com o poder de decidir qual deputado vai conseguir liberar sua emenda no Orçamento, Lira se tornou de fato o homem mais poderoso do Brasil. São raras as votações que ele se empenha que não tem mais de 300 dos 513 votos da Câmara.
Ao contrário do presidente Bolsonaro, Lira tem uma ótima relação com a elite ilustrada. Nas conversas com donos de bancos, grandes empresas e mídia, Lira se apresenta como o único capaz de segurar “os radicalismos” de Bolsonaro ou de Lula. Afirma que não importa quem for o presidente, ele será reeleito presidente da Câmara e os projetos que forem acertadas com ele serão aprovados. À diferença de outros presidentes da Câmara que diziam a mesma coisa, Lira entrega. Em 13 meses no cargo, ele aprovou a privatização da Eletrobrás (que favorece as usinas termoelétricas), a independência do Banco Central, a prorrogação da desoneração na folha de pagamento, a redução de obrigações no licenciamento ambiental e a mineração em terras indígenas.
Em fevereiro, em entrevista ao Valor, Lira deu um sinal de como pode ser conflituosa sua relação com um novo governo Lula. “O Lula está dizendo que vai fazer um monte de coisa, não só isso, né? Que vai extinguir o teto. São coisas de cada candidato, de cada plataforma política. Só queria lembrar que no meio dos presidentes que estão e que serão eleitos tem o Congresso Nacional. E já deixei bem claro: permanecendo um Congresso de centro-direita, nossa vontade é não retroagir nos avanços que a gente já teve. O problema do Brasil é terminar as reformas paradas”, disse.
Ao mirar em Arthur Lira, Lula se eleito só tem a opção de eleger um outro presidente da Câmara. Se Lira se reeleger mesmo com a oposição de Lula, a guerra entre os dois vai marcar o mandato. É o risco da repetição da briga de Dilma Rousseff com Eduardo Cunha, que terminou com os dois cassados.