Segundo artigo de Celso Rocha de Barros, da Folha, esse novo arcabouço fiscal mostrou que Lula-3 não é nem Lula-1 nem Dilma-1. É um governo que reconhece a necessidade de equilibrar as contas, mas vai tentar fazer isso gradualmente. Pode dar certo, pode dar errado, mas não há nada de maluco sendo proposto.
A boa notícia é que, pelos cálculos do economista Felipe Salto, ex-presidente da Instituição Fiscal Independente, a nova regra terá um efeito importante na evolução da relação dívida/PIB nos próximos anos.
Em uma entrevista para o site Brazil Journal, Salto afirmou que, em suas projeções anteriores, a relação dívida/PIB tinha tendência crescente chegando a 95,3% em 2032. Se a nova regra for aplicada, a projeção mostra esse número se estabilizando já em 2026-7.
Isto é, a nova regra, se for aplicada direito, deve evitar que a dívida pública brasileira saia de controle. Em condições normais, isso fará os juros caírem.
A má notícia é que, para cumprir a meta anunciada de zerar o déficit em 2024, serão necessárias medidas para aumentar a arrecadação. Enquanto essas medidas não forem anunciadas, permanecem dúvidas sobre a viabilidade dessas metas.
Resumindo, as chances da dívida não explodir no médio prazo melhoraram, mas as chances de o governo atingir os objetivos que propôs para si mesmo no curto prazo continuarão difíceis de calcular até que o pacote inteiro de medidas seja divulgado.
E as metas de curto prazo são balizas importantes: o governo investiu capital político ao anunciá-las, perderá se não as atingir. Se o PT pretende ser governo mais vezes no futuro, não deve desperdiçar credibilidade, como desperdiçou no primeiro governo Dilma.
Afinal, a proposta do governo Lula é uma boa sinalização para um horizonte mais longo: o governo de esquerda brasileiro está disposto a manter a trajetória da relação dívida/PIB sob controle impondo limites à sua própria capacidade de gastar os ganhos de arrecadação futuros.
Isso é um passo modesto, mas importante, diz Celso Rocha de Barros, da Folha, em direção ao ideal de partidos sólidos que se veem como sócios de longo prazo da democracia. O PT sinaliza que tem algum interesse na saúde financeira do Estado cujo comando pretende disputar, às vezes ganhando, às vezes perdendo, por muitos anos.
Ainda há muito a caminhar nesse sentido, mas o que Lula propôs na quinta-feira foi um bom começo e deve ser visto em comparação com o que fizeram os governos de direita recentes.
A principal diferença entre o arcabouço fiscal de Lula e o teto de gastos de Temer é que Temer não limitou a si mesmo. O teto de gastos foi aprovado para o governo seguinte, que, por ainda não existir, não teve como reclamar na época em que o teto foi criado. Assim que o teto foi aplicado a um governo que existia —o governo Bolsonaro— o teto morreu, com ministro Chicago boy e tudo.
Ao contrário de Temer, Lula está aplicando um limite a si mesmo. Seria surpreendente se o limite aplicado por Lula a si mesmo não fosse mais flexível do que o limite aplicado por Temer a outras pessoas.
A política econômica de Lula 3 vai ganhando cara, para além do ruído dos últimos meses. Não é nem a cara de Antônio Palocci nem a de Dilma Rousseff. A equipe econômica até lembra a aliança PT/PSDB sonhada por Palocci. Mas as circunstâncias políticas são ainda piores do que as enfrentadas por Dilma.