Ida do ex-juiz para a União Brasil deixou ex-partido dividido sobre rumo e sob ameaça de não cumprir a cláusula de barreira
Após a saída do ex-juiz Sergio Moro, o Podemos avalia como se posicionar nas eleições presidenciais de 2022. Dirigentes da legenda estudam lançar outro nome como candidato da sigla, mas também cogitam apoiar o representante da chamada terceira via ou até mesmo o presidente Jair Bolsonaro (PL) no pleito deste ano.
Uma das opções aventadas internamente é apostar no ex-ministro e general da reserva Santos Cruz na disputa pelo Palácio do Planalto. Ele se filiou à sigla pouco depois de Moro e também é cotado para disputar um cargo majoritário no Rio de Janeiro.
O partido chegou a sondar o coach Pablo Marçal, que tem mais de 2 milhões de seguidores nas redes sociais, mas a candidatura já está praticamente descartada. Recentemente, ele se envolveu em uma polêmica por ter levado um grupo de 32 pessoas a uma montanha sem o devido preparo para isso.
Santos Cruz, por sua vez, é bem visto dentro da legenda e a aposta é que ele conseguiria roubar parte do eleitorado de Bolsonaro, assim como dirigentes do partido imaginavam que ocorreria com Moro.
A avaliação é a de que Santos Cruz tem mais desenvoltura em discursos e debates e mais traquejo político que o ex-juiz. Os perfis são vistos como similares: ambos foram ministros de Bolsonaro e se tornaram críticos do presidente.
Além disso, Santos Cruz também tem trajetória ligada à segurança pública e nunca foi investigado por desvio de dinheiro público, o que permitiria que ele encampasse o discurso de combate à corrupção.
Falta a ele, porém, a popularidade de Moro, o que tem levado o partido a hesitar no lançamento de seu nome.
Por isso, tem crescido em uma ala da legenda a tese de que o melhor caminho seria apoiar a reeleição do presidente Jair Bolsonaro.
Na visão de dirigentes partidários, o Podemos tem bandeiras similares às do chefe do Executivo e uma base eleitoral que dialoga com o bolsonarismo.
Para isso se concretizar, porém, seria necessário vencer uma série de resistências, principalmente na bancada da legenda do Senado, que é crítica do presidente.
Também há o temor de que a legenda não ganhe nada estando no palanque de Bolsonaro porque seria difícil atrair o eleitor mais fiel do presidente nas disputas proporcionais.
Apesar de haver uma ala do partido que defende o apoio a Bolsonaro, a presidente do partido, deputada Renata Abreu (Podemos-SP), descartou, em entrevista à Folha, a possibilidade de endossar o nome do atual presidente, inclusive em um eventual segundo turno contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“Completa neutralidade e isenção. Eu não acredito em nenhum dos dois. Não vou botar minha digital nisso”, disse.
Ela afirmou que a ideia é, de fato, lançar uma candidatura própria. “Nossa vontade é essa. Uma candidatura conceito. Ou o [senador] Alvaro Dias ou outros nomes que estão sendo colocados, que a gente está discutindo”, disse.
Uma corrente do partido também defende encorpar a candidatura da chamada terceira via.
Isso, contudo, ainda depende do nome que União Brasil, MDB e PSDB irão lançar na disputa. As três siglas prometeram anunciar um candidato único em maio. Cada uma delas, porém, quer impor seu próprio candidato.
Nesse campo, estão no páreo a senadora Simone Tebet (MDB-MS) e o deputado federal Luciano Bivar (União Brasil-PE) e no PSDB ainda existe uma briga entre os ex-governadores João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS).
Dirigentes do partido afirmam, porém, que neste momento a sigla está focada em definir a estratégia nos estados após a saída de Moro. O partido perdeu quatro deputados federais após o ingresso do ex-juiz na sigla por serem alinhados a Bolsonaro.
O cálculo era que a presença de Moro no partido valia a pena porque, apesar das perdas, a candidatura do ex-juiz ajudaria o Podemos a ampliar a bancada na Câmara Federal.
Agora, sem os parlamentares e sem o nome próprio na corrida presidencial, o desafio é fortalecer o partido nos estados para garantir o número de votos para, no mínimo, vencer a cláusula de barreira (que exige um desempenho mínimo na eleição para deputado federal), o que, caso não ocorra, pode deixar o partido sem acesso ao fundo partidário, dentre outros benefícios.