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sexta-feira 10 de fevereiro de 2023 às 17:49h

Planejamento Orçamentário Plurianual: apenas um instrumento alocativo?

NOTÍCIAS, POLÍTICA


Constantino Cronemberger Mendes, Doutor em Economia na área de Setor Público (UnB), Técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea e ex-Subsecretário de Planejamento Governamental do Ministério da Economia As informações são do Estadão.

Welles Matias de Abreu, Mestre e Doutor em Administração (UnB). Pós-doutor em Administração Pública e Governo (FGV EAESP). Analista de Planejamento e Orçamento da Secretaria de Orçamento Federal. Professor de Pós-Graduação do IBMEC

Thiago Silva e Souza, Mestre em Estudos de Gestão pela Universidade do Minho (Portugal). Atua como assessor de planejamento, orçamento e pesquisador em Ciências Navais. Já exerceu o cargo de assistente e de coordenador geral substituto de políticas de infraestrutura do plano plurianual no ministério da Economia. Membro da Sociedade Brasileira de Administração Pública

Uma pergunta aparentemente simples, mas que tem grande complexidade quando tratamos de políticas públicas: O planejamento é um esforço coletivo maior do que a soma dos interesses individuais? E mais, como não temer a possível veracidade do modelo anárquico da “lata de lixo” de Cohen, March e Olsen (vide artigo “A Garbage Can Model of Organizational Choice” publicdo em 1972), pois a cada mudança de Governo nos são apresentados, até com grande surpresa, a compreensão de problemas e soluções limitadas, em um aparente sistema (cíclico) de tentativa e erro?

Em nossas reflexões quanto a teoria e prática sobre planejamento e orçamento plurianuais (Texto para Discussão IPEA nº 2674/2021), naquele momento resultado do processo de elaboração e primeiras observações da execução do Plano Plurianual (PPA) 2020-2023 – o primeiro sob vigência do Novo Regime Fiscal ou “Teto de Gastos” – buscávamos jogar luzes à integração de estruturas de governança orçamentária. Em destaque, o estudo do Banco Mundial, denominado “Beyond the Annual Budget: global experience with medium term expenditure framework” sobre os tipos de abordagens ou estágios de planejamento plurianuais de médio prazo, conhecido como Medium-Term Expenditure Framework (MTEF) ou, Quadro de Despesas de Médio Prazo.

O estudo busca apresentar uma alternativa ao orçamento anual, de natureza incremental e que limita a capacidade de (re)priorização de políticas e gastos públicos. Logo, propõe a implementação gradual do MTEF, em três estágios de crescente complexidade e avanço de maturidade: fiscal (MTFF), orçamentário (MTBF) e de performance (MTPF).

O primeiro estágio – MTFF, fiscal – considera a disponibilidade de recursos agregados com as necessidades de despesas, isto é, trata da sustentabilidade fiscal. Já o segundo estágio – MTBF, orçamentário – especifica os limites de gastos setoriais e das despesas agregadas baseados no compromisso entre a disponibilidade de recursos e suas necessidades para financiar os planos setoriais de despesa. Por fim, sua última abordagem – MTPF, performance – propõe alterar o foco de atenção dos insumos e dos recursos para os produtos e resultados das políticas públicas.

Trazendo para o nosso contexto legal, o sistema de planejamento orçamentário brasileiro é composto de três instrumentos instituídos pela Constituição Federal de 1988: o Plano Plurianual (PPA) e as leis de diretrizes orçamentárias (LDO) e do orçamento anual (LOA). Daí, o Banco Mundial avaliou que o nosso sistema orçamentário possui característica de um MTBF (ou seja, com perspectiva orçamentária). Contudo, pode-se considerar, também, que os “tijolos” (building blocks) estão presentes no PPA para a implementação de todos os estágios do MTEF, muito embora não se tenha como considerar o atual PPA como tal. Vide figura ilustrativa abaixo sobre a relação dos instrumentos orçamentários com os respectivos modelos em debate.

Diante dessa possibilidade, vamos à reflexão: a LOA considera apenas o orçamento do ano anterior e o modifica de maneira incremental (sob a clássica “lógica das consequências”, preconizada pelo modelo de “lata de lixo”) que suporta, obviamente, a ótica do MTBF no âmbito do PPA, sendo difícil (re)priorizar políticas e gastos. Neste contexto, a evolução para o MTEF requererá um plano orçamentário plurianual em que os tomadores de decisão olhem para além dos setores, programas e projetos, dessa forma conseguindo compreender como as estratégias de despesas podem (e devem) ser reestruturadas para melhor servir objetivos políticos estabelecidos para o país como um todo.

Já a LDO, de forma diferente, estabelece quais as metas e prioridades do orçamento, isto é, trata do problema da sustentabilidade fiscal ao considerar metas fiscais para três anos. Essas metas são cruciais para sinalizar o esforço de ajuste fiscal do governo. A LDO, portanto, é considerada aderente ao estágio do MTFF. Importante ressaltar que na LDO não há referência às necessidades de despesas das políticas orçamentárias setoriais (como se esperaria do MTBF) ou a preocupação com resultados de performance (de MTPF).

E quanto ao PPA? Entendemos que o desenho para o MTEF apresenta uma necessidade de aperfeiçoamento uma vez que ainda não contempla a estratégia nacional, de maneira que essa lacuna se apresenta como obstáculo potencial para a efetividade do PPA. Em outras palavras, não se questiona a proposta de atingir níveis de maturidade no gerenciamento da despesa pública, por meio da (i) disciplina fiscal agregada, (ii) da eficiência alocativa; e (iii) da eficiência técnica. Ou seja, o MTEF traduz os objetivos macrofiscais e as restrições de recursos dentro de um amplo agregado orçamentário e de planos de despesa detalhados, guiados por prioridades estratégicas de despesas. Entretanto, há que se destacar que, em especial em um contexto continental como o do Brasil, apesar de se tratar de problemas alocativos e de equilíbrio fiscal, o PPA não trata dos relevantes problemas distributivos como se espera de um MTEF efetivo.

Revisitando nossa Constituição, compete ao PPA estabelecer, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada. Dessa forma, não há que se discutir que o PPA é um instrumento que trata da abordagem institucional do plano de despesa e de investimentos (no caso, de quatro anos ou mais) e que deve conciliar os limites de recursos plurianuais com as necessidades de despesas setoriais. Ademais, vislumbrando a premente necessidade de evolução, como último estágio da adoção de um MTEF, desta forma o PPA pode servir como uma estratégia nacional baseada em resultados (inclusive incorporando a lógica de performance do MTPF).

Para tal, encontra-se para parecer conclusivo na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Congresso Nacional o Projeto de Lei (PL nº 9.163/2017) que institui a premente Política de Governança da Administração Pública Federal, com destaque ao artigo 7º, que define como instrumentos de planejamento do desenvolvimento nacional (i) a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Nacional – ENDES; (ii) os Planos Nacionais, Setoriais e Regionais; e (iii) o Plano Plurianual – PPA.

Portanto, sob tal prisma, o PPA precisará tratar do problema distributivo nacional (o que ainda se vê carente), na medida em que os problemas da sociedade sejam transformados em programas estratégicos para atuar sobre as causas detectadas. Assim, buscaria conciliar a estratégia nacional de médio prazo, presente na agenda prioritária de governo, com a eficiência alocativa (LOA) e a estabilidade fiscal (LDO).

Não por acaso, entre os vários mecanismos de promoção do alinhamento entre o orçamento e o planejamento estratégico, observamos que em 14 países que compõem a OCDE se encontra em uso a abordagem de médio prazo do MTEF. Logo, entendemos que o PPA, para sua maior efetividade, deveria atuar dentro de uma abordagem MTPF (ou seja, incorporando a perspectiva fiscal), porém atentos às dificuldades sobre o precário modelo MTBF (orçamentário), por não ser baseado na conciliação entre os limites ou restrições de recursos agregados plurianuais com as estimativas das necessidades de despesas das agências. Na verdade, o PPA define os programas da administração pública e as metas estratégicas principais, servindo apenas como uma abordagem institucional do planejamento orçamentário plurianual.

Com mais esse “tijolo” nessa grande construção chamada administração pública, esperamos que o Planejamento Orçamentário Plurianual que se pretende seja implantado no Brasil, em breve, considerando uma abordagem estratégica de futuro (médio prazo) estabelecendo prioridades e alocando recursos plurianuais, levando ao nível e à composição da despesa pública determinadas à luz de necessidades emergentes na sociedade, com o PPA atuando como integrador da abordagem fiscal (LDO/MTFF) com a abordagem plurianual de despesa (LOA/MTBF), e, do ponto de vista estratégico, o médio prazo (PPA/MTPF) dialogando com o planejamento de longo prazo.

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