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domingo 31 de março de 2024 às 11:33h

Pix dá novo fôlego a boleto como opção de pagamento de contas

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Aos poucos alguns boletos de cobrança, como de energia ou água, começaram a chegar às residências dos clientes com um QR Code ao lado do código de barras, abrindo a possibilidade para o pagamento via Pix, meio de pagamento que rapidamente foi incorporado em transações entre pessoas físicas. A modalidade, que recebeu diversos apelidos — “bolix”, “bolepix”, “bolecode” —, vem crescendo gradativamente, embora ainda represente uma fatia pequena no total de cobranças.

Por ora, sua adoção esbarra em algumas limitações, como a relevância do dinheiro físico no pagamento de boletos. Parte dos consumidores também prefere manter o pagamento da forma habitual, inclusive pelo uso do débito direto autorizado (DDA), que direciona o usuário para uma jornada de pagamento tradicional. Há ainda alguma resistência das próprias instituições financeiras em abrir mão do “float” — ou seja, do que ganham no intervalo entre receber o dinheiro do pagador e repassá-lo ao recebedor.

Apesar dos entraves, seu ganho de mercado é segundo Fernanda Guimarães e Mariana Ribeiro, do jornal Valor, dado como inevitável frente às inovações. Assim, o mercado espera que o uso do instrumento continue em alta, principalmente quando chegar de forma mais disseminada a outras cobranças, como aos boletos de mensalidades escolares e de aluguel.

“O bolepix me parece uma ideia para melhorar o boleto e dar uma sobrevida. Um instrumento com mais velocidade, com simplicidade, segurança e baixo custo, com evidente modernização do meio de pagamento, tende a substituir o antigo”, diz o especialista em meios de pagamento e sócio-fundador da Colink, Edson Santos.

Esses boletos híbridos começaram a ser implementados como uma iniciativa do próprio mercado. Dada a expansão, em julho do ano passado, sua adoção começou a ser acompanhada pela Nuclea, responsável pelo registro e liquidação dos boletos. De acordo com a empresa, 42 milhões de boletos foram pagos via Pix de julho do ano passado até 19 de março. Isso representa só 1,5% do total de liquidações no mesmo período.

Tais dados, no entanto, podem estar subnotificados, explica Rodrigo Furiato, vice-presidente de negócios da Nuclea. Isso porque os bancos ainda estão se adaptando à nova forma de reportar as informações. A empresa não tem dados sobre quantos boletos já foram emitidos como “bolepix”, mas, de acordo com dados coletados pelo Valor com instituições emissoras do instrumento, quando as duas opções estão presentes, até 25% dos pagamentos são feitos via Pix.

Na média, nas cobranças híbridas, aqueles que optam pelo Pix chega a 15%, segundo o diretor de “cash management” do Bradesco, Antonio Daissuke. Esse percentual, contudo, não é homogêneo: entre os que recebem fatura do setor de telecomunicações, por exemplo — as contas de celular e internet — a fatia de quem escolhe o QR Code chega a 25%. Isso porque esses clientes são mais afeitos ao digital, segundo o executivo. No interior do país, no outro extremo, a fatia fica em torno de 5%. A participação fica ainda menor na população idosa, que paga os boletos em agências ou em correspondentes bancários.

Na fintech Efí, 94% dos boletos já são emitidos como “bolix”. Desses, 23% foram pagos por meio do Pix no ano passado, ante 9% em 2022. Segundo o CEO da empresa, Evanil Paula, foi necessário um movimento de educação do cliente em relação à modalidade após o lançamento, mas hoje já houve uma adaptação e a adoção é cada vez maior. Como exemplo, a Caixa disse que, durante as inscrições para o concurso do banco, foram emitidos mais de 1 milhão de boletos híbridos e a liquidação por Pix representou cerca de 40% do total.

“A introdução do Pix dá mais versatilidade ao boleto e aumenta sua capacidade de liquidação no mesmo dia do pagamento”, diz Furiato, da Nuclea. No pagamento via código de barras, o processo completo até a disponibilização dos recursos ao beneficiário pode levar alguns dias, mas o instrumento passou por melhorias recentemente para aumentar sua competitividade. Desde 15 de março, os boletos pagos até as 13h30 passaram a ter liquidação interbancária no mesmo dia — antes isso ocorria no dia seguinte. Já o repasse dos recursos ao cobrador depende do contrato com a sua instituição financeira.

No caso do Pix, a disponibilização dos recursos, ao menos em tese, deve ser imediata. Apesar disso, há uma discussão no mercado sobre se o prazo negociado entre banco e cliente poderia ser seguido nesse caso, afirma Furiato. “Pelo arranjo do Pix, deveria ser imediato, mas esse é um ponto que gera alguma polêmica.”

Segundo especialistas, o espaço de crescimento do pagamento via Pix é grande e ajudará a renovar os boletos, que tem por trás questões culturais importantes e é considerado um comprovante de adimplência. Além disso, é um produto que foi criado também olhando para a população desbancarizada, já que pode ser pago em qualquer instituição financeira ou até mesmo em lotéricas e no caixa de alguns supermercados.

Daissuke, do Bradesco, diz que o banco está preparado para colocar em todos os boletos emitidos o QR Code, mas que essa não tem sido a opção dos clientes. “A empresa precisa fazer uma mudança em sua estrutura de emissão, que é fácil, mas eles afirmam que não precisam porque o cliente não está pedindo”, explica. O executivo afirma que o custo é menor para a empresa no recebimento via Pix, mas que isso só será capturado de fato quando essa mudança for integral — em todos os boletos emitidos pela empresa. Até o momento nenhuma companhia decidiu eliminar o código de barras de suas cobranças. Para as transações B2B, ou seja, entre companhias, a mudança poderá ser mais lenta, visto que muitas vezes as estruturas de pagamentos estão conectadas via o código de barras, acrescenta.

O especialista em inovação financeira e sócio da Spiralem, Bruno Diniz, afirma que a substituição do pagamento do boleto via código de barras pelo QR Code do Pix vai ocorrer à medida que o cliente enxergue mais conveniência, o que poderá ocorrer por meio de incentivos pela escolha, como um desconto ou acúmulo de pontos. Ele lembra que os bancos já têm trabalhado para tornar o boleto mais competitivo, com a redução do prazo de compensação, por exemplo. Para ele, isso foi fundamental para manter o meio de pagamento vivo em tempos de celeridade no prazo de entrega de produtos comprados on-line.

E existe ainda outro fator relevante que vai manter a força do boleto. O diretor do Bradesco lembra que em muitas indústrias ele também é um instrumento de crédito, por meio dos recebíveis. A mudança do peso deverá chegar com o Pix automático, que está programado para ser lançado em outubro deste ano. Quando essa possibilidade se abrir, o cliente poderá optar que a cobrança seja debitada de sua conta de forma recorrente. Para Santos, da Colink, o mercado irá se adaptar com a chegada do Pix automático e é de se esperar o desenvolvimento de algumas soluções, como a antecipação de recebíveis.

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