Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, protagonizaram nesta última terça-feira (16) um embate de decisões.
O objeto de disputa foi o rumo de uma investigação que mira a disseminação de fake news envolvendo ministros da mais alta corte do país. O imbróglio, apesar de ter tomado grandes proporções nesta tarde, começou há mais de um mês.
Em 14 de março, o presidente do STF, Dias Toffoli, determinou a abertura de um inquérito para apurar fatos relacionados a notícias “falsas, caluniosas, difamantes e injuriantes” que atinjam os magistrados.
Na ocasião, ele afirmou que o procedimento tramitaria em sigilo e o ministro Alexandre de Moraes seria o responsável por conduzir as apurações.
“Tenho dito sempre que não existe estado democrático de direito, democracia, sem um Judiciário independente e sem uma imprensa livre”, disse Toffoli durante o anúncio das investigações.
Logo no dia seguinte à decisão, a PGR pediu esclarecimentos sobre as investigações, alegando que cabe ao Ministério Público realizar tais operações, e não ao Judiciário. Segundo Dodge, os fatos ilícitos, por mais graves que sejam, devem ser processados segundo a Constituição.
Mesmo com a solicitação da procuradora, o STF prosseguiu com as apurações durante todo o mês de março — sem repercussão ou alarde.
No entanto, nesta segunda-feira (15), a censura de uma reportagem do site O Antagonista e da revista Crusoé, reascendeu os ânimos em torno da constitucionalidade das investigações.
Publicada na última sexta-feira (12), a reportagem faz uma suposta ligação do presidente da corte, Dias Toffoli, com a empreiteira Odebrecht. O texto menciona um pedido de esclarecimento da Polícia Federal ao empreiteiro Marcelo Odebrecht, que firmou acordo de delação premiada, para saber quem seria a identidade de um personagem que ele cita em um e-mail como “amigo do amigo do meu pai”. Marcelo disse se tratar de Dias Toffoli.
Em sua decisão, Moraes afirmou que no exercício da liberdade de expressão pode ocorrer a intervenção do Poder Judiciário para cessar ofensas e direitos de resposta. “É exatamente o que ocorre na presente hipótese, em que há claro abuso no conteúdo da matéria veiculada, ontem, 12 de abril de 2019, pelo site O Antagonista e Revista Crusoé, intitulada ‘O amigo do amigo de meu pai’”, disse o ministro.
A censura determinada pelo ministro gerou uma onda de críticas, incluindo de entidades como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), a Transparência Brasil e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Já nesta terça-feira (16), outra fase da operação foi determinada pelo ministro do STF. O magistrado ordenou buscas em dez endereços.
Um dos alvos de buscas foi o general da reserva Paulo Chagas. A investigação suspeita que mensagens publicadas pelo militar estariam difundindo crimes contra a honra dos ministros e pedindo o fechamento do STF.
Caros amigos, acabo de ser honrado com a visita da Polícia Federal em minha residência, com mandato de busca e apreensão expedido por ninguém menos do que ministro Alexandre de Moraes.
Quanta honra!
Lamentei estar fora de Brasília e não poder recebe-los pessoalmente.— General Paulo Chagas (@GenPauloChagas) April 16, 2019
Dodge entra em cena
Após a repercussão da operação, a procuradora-geral da República determinou o arquivamento do inquérito sobre fake news.
Em manifestação enviada ao ministro Alexandre de Moraes, que foi designado como o responsável pela investigação, Dodge alega que as medidas já autorizadas não foram acompanhadas pelo Ministério Público.
“Notícias publicadas em diferentes meios de comunicação, inclusive hoje, anunciam o cumprimento de medidas cautelares penais sujeitas a reserva de jurisdição, sem prévio requerimento nem manifestação determinada por lei desta titular constitucional da ação penal”, afirma Dodge no ofício.
Moraes rebate Dodge
No começo da noite desta terça-feira, Moraes decidiu não arquivar a investigação contra notícias falsas, contrariando a procuradora-geral da República.
“Indefiro integralmente o pedido da Procuradoria Geral da República”, decretou o ministro. Em despacho de quatro páginas, Moraes disse que não há respaldo legal para a atitude da PGR e classificou seu pedido como “genérico”.