Alardeado pela extrema-direita no mundo e tema recorrente nos discursos de Jair Bolsonaro mesmo antes de ocupar a Presidência, a hipótese de instalação de um regime comunista preocupa uma parcela dos brasileiros — ainda que a queda do Muro de Berlim, símbolo da derrocada do modelo, tenha ocorrido há pouco mais de 33 anos. Segundo o Ipec, a chance de um regime ao estilo soviético ser instaurado é plausível para 44% dos brasileiros.
No ano passado, ao longo da campanha, Bolsonaro associava o “risco” à vitória de Lula. Nos Estados Unidos, o ex-presidente Donald Trump e outros representantes do Partido Republicano usavam o mesmo expediente contra Joe Biden, vitorioso no pleito de 2020. A pesquisa mostra ainda que, no Brasil, 31% concordam totalmente com a afirmação de que o comunismo pode vigorar no país; 13% dão aval em parte, enquanto 48% discordam total ou parcialmente da possibilidade.
— A maior parte das pessoas associa o comunismo na América Latina com as situações de Venezuela e Cuba, combinações de um regime autoritário com realidades como fome e desabastecimento. Isso esteve muito presente nas narrativas do Bolsonaro — diz a cientista política Camila Rocha, pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).
Em setembro de 2022, em Sorocaba (SP), Bolsonaro chamou Lula de “capeta” e disse que o petista queria “impor” o comunismo no Brasil. Não à toa, a pergunta “o que é comunismo?” foi a que mais cresceu em uma das categorias nas pesquisas dos brasileiros no Google no ano passado.
Os evangélicos são os que mais acreditam na chance de o Brasil virar comunista: 57% concordam totalmente ou em parte. Considerando só os católicos, o percentual cai para 39%. Entre os evangélicos, são 43% os que acham totalmente que essa possibilidade existe com o retorno de Lula ao Palácio do Planalto, enquanto outros 14% concordam em parte que isso é possível. Pouco mais de um terço desse segmento (36%) descarta a afirmação.
O dado dá a medida da desconfiança dos evangélicos, que correspondem a cerca de 40% da população brasileira, em relação a Lula. Durante a campanha eleitoral do ano passado, Bolsonaro contou com o apoio de pastores que espalharam fake news contra o petista e chegaram a pedir votos para a reeleição do então presidente durante cultos — o que é proibido pela legislação. Lula precisou criar estratégias para tentar frear o desgaste junto ao eleitorado evangélico, mas é alvo de críticas de lideranças do segmento até hoje.
No caso da crença no risco de o Brasil virar um país comunista, há também uma discrepância regional: no Norte e Centro-Oeste, 47% admitem a existência da ameaça comunista, 12 pontos percentuais a mais do que no Nordeste, única região onde Lula foi o mais votado no segundo turno da eleição presidencial contra Bolsonaro.
O Ipec mostra ainda que a hipótese de uma guinada ao comunismo é maior entre os brasileiros que avaliam mal o governo Lula: 81% dos que consideram a atual gestão ruim ou péssima concordam com a possibilidade. Esse percentual é de 19% entre os que dizem que a gestão Lula é ótima ou boa.
Os segmentos menos crentes na mudança de regime são os moradores do Nordeste (53% rechaçam totalmente ou em parte na possibilidade) e os idosos (53%).