Legislação que prevê recuperação de ambientes naturais degradados, como florestas, pântanos e rios, é aprovada apesar da forte resistência de setores conservadores e de série de protestos de fazendeiros. O Parlamento Europeu aprovou em definitivo nesta última terça-feira (27) uma lei que permite a restauração de ambientes naturais degradados, considerada fundamental para a conservação da natureza nos 27 países da União Europeia (UE).
A chamada Lei da União Europeia de Restauração da Natureza visa criar as condições necessárias para que habitats possam ser restaurados de modo a retomarem seus estados originais, com ações de reflorestamento, reidratação de áreas pantanosas e recuperação do fluxo natural de rios.
A aprovação impôs uma dura derrota para setores conservadores tentaram bloquear a nova lei, que estabelece a meta de restaurar ao menos 20% do território terrestre e marítimo da UE até 2030, e de todos os sistemas que necessitam de restauração até 2050.
As regras fazem parte das ambiciosas metas ambientais previstas no Acordo Verde Europeu – um conjunto de leis que visa tornar a Europa o primeiro continente do mundo a atingir a neutralidade climática, com a meta de zerar o nível de emissões líquidas de carbono até 2050.
As ações serão financiadas tanto pelo setor privado, quanto pelos orçamentos dos Estados-membros. Alguns programas da UE, como fundos regionais de financiamento, poderão ajudar a cobrir parte dos custos.
Protestos dos fazendeiros
Fazendeiros e produtores rurais europeus veem a nova lei como uma ameaça a setor agrícola do continente. Em julho passado, uma moção para rejeitar a lei fracassou no Parlamento Europeu.
Desde então, agricultores vem realizando protestos em vários países europeus contra as medidas de proteção ambiental, ao mesmo tempo em que se queixam dos prejuízos gerados pelos efeitos das mudanças climáticas. Enormes filas de tratores bloquearam o tráfego em rodovias e avenidas de grandes centros urbanos e capitais em países como Alemanha, França, Polônia, Bélgica e Espanha.
Os fazendeiros se queixam de regulamentações ambientais que consideram excessivas e da competição gerada por países de fora da UE que exportam e comercializam seus produtos a preços mais baixos.
O Partido do Povo Europeu (EPP), a maior bancada no Parlamento, que reúne parlamentares de centro-direita, se uniu aos ultradireitistas para votar contra a lei. Eles avaliam que as novas regras geram obstáculos muito grandes aos agricultores, embora tenham exaltado o fato de o projeto de lei “se parecer muito pouco” com o texto apresentado inicialmente.
“Não queremos novas e mais formas de burocracia e de impor obrigações aos fazendeiros”, disse antes da votação o europarlamentar romeno Siegfried Mureșan, do EPP. “Deixem os fazendeiros produzirem.”
As manifestações dos fazendeiros levaram alguns países da UE a retrocederem de parte de seus planos de proteção ambiental. Nesta segunda-feira em Bruxelas, manifestantes jogaram tratores sobre barreiras policiais e atearam fogo a pneus em um protesto violento durante uma reunião dos ministros da Agricultura do bloco.
“Garantir o bem estar das futuras gerações”
A legislação parecia estar sob sérias ameaças dos conservadores, mas acabou sendo aprovada por 329 votos a favor e 275 contra. A lei somente entrará em vigor após ser aprovada pelos Parlamentos dos Estados-membros do bloco.
“Essa lei não diz respeito à restauração da natureza somente pelo bem da natureza, mas visa assegurar um ambiente habitável que garanta o bem estar das gerações atuais e futuras”, afirmou o comissário europeu para o Meio Ambiente, Virginijus Sinkevičius.
“Hoje é um dia muito importante para a Europa, ao passarmos da proteção e conservação da natureza para a restauração”, disso o europarlamentar espanhol Cesar Luena, um dos principais defensores da lei no Parlamento Europeu em Estrasburgo.
“A nova lei também nos ajudará a cumprir vários de nossos compromissos ambientais internacionais. A regulamentação vai restaurar ecossistemas degradados, ao mesmo tempo em que respeita o setor agrário ao permitir flexibilidade aos Estados-membros”, observou.
A Coalizão #RestoreNature, que inclui as ONGs ambientalistas BirdLife Europe, ClientEarth, EEB e WWF EU, comemorou a aprovação. “A Lei de Restauração da Natureza sempre foi muito mais do que uma lei para trazer de volta a natureza. É um símbolo de que a Europa pode e irá se comprometer a lutar pela sobrevivência de nosso planeta”, disseram as entidades, em nota.
“Estamos aliviados com o fato de os europarlamentares terem dado ouvidos aos fatos e à ciência, e que não tenham cedido ao populismo e ao alarmismo. Agora, pedimos aos Estados-membros que sigam o exemplo e viabilizem essa lei tão necessária para trazer a natureza de volta à Europa”, diz o comunicado.
Segundo dados da União Europeia, em torno de 80% dos habitats do continente estão em más condições, sendo que 10% das espécies de abelhas e borboletas estão ameaçadas de extinção, e 70% do solo está em estado insalubre.