A decisão judicial que suspendeu a execução das chamadas “emendas de relator” surpreendeu segundo o jornal Valor o governo federal e deixou ministros preocupados. Proferida em caráter liminar às 20h desta sexta-feira (6) pela ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), a medida interrompe um dos principais instrumentos com que o Palácio do Planalto vem manejando o Legislativo às vésperas de votações importantes.
No Palácio e na Esplanada, a primeira reação foi de susto: “E agora?”, perguntaram-se um ao outro dois ministros momentos após tomarem conhecimento da liminar.
Na visão do Planalto, a paralisação dos trabalhos pode abrir uma “crise geral”, envolvendo empresas e empregados que estão executando os serviços, prefeituras e governos estaduais. A medida também tem potencial para provocar danos políticos aos deputados que “apadrinham” as obras após votar em favor do governo em projetos estratégicos.
Há críticas também quanto ao momento em que a decisão foi tomada: na noite de uma sexta-feira, às vésperas da votação em segundo turno da PEC dos Precatórios, uma proposta de altíssimo interesse para o governo. Se aprovada, ela abrirá espaço fiscal para o pagamento de um Auxílio Brasil de R$ 400 em 2022, quando o presidente Jair Bolsonaro tentará a reeleição.
Em 28 e 29 de outubro, às vésperas da votação da PEC em primeiro turno, o governo do presidente Jair Bolsonaro empenhou R$ 909 milhões em emendas parlamentares, segundo levantamento feito pela ONG Contas Abertas. A PEC foi aprovada com 312 votos dos 513 deputados, apenas quatro a mais que os necessários. Ela precisa ser referendada em segundo turno antes de ir ao Senado, e ainda há dúvidas quanto a se isso de fato ocorrerá.
Mas o Planalto não tem, no momento, disposição para entrar em conflito aberto com o Supremo. Nas palavras de um auxiliar de Bolsonaro, “a decisão não atinge o peito do Executivo, mas do Legislativo”.
Entretanto, caso seja confirmada pelo plenário da Corte, cogita essa autoridade, poderá ser aberta uma crise institucional entre o STF e o Congresso. Assim, o Planalto aguarda as reações do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
As emendas de relator, ou do chamado “orçamento secreto”, somam cerca de R$ 18,5 bilhões no Orçamento deste ano. Em 20 de agosto, Bolsonaro chegou a vetar essas emendas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o ano que vem, alegando “motivos de política fiscal”. Porém, recuou do veto três dias depois.
Essas emendas aumentam a influência de deputados e senadores sobre o Orçamento, em detrimento do Executivo. Por outro lado, têm ajudado Bolsonaro a ampliar sua base de apoio no Congresso, uma vez que custeiam obras nas bases dos parlamentares.
O instrumento enfrenta críticas do Tribunal de Contas da União (TCU), quanto à transparência dos gastos, e também da oposição.
As ações que deram origem à decisão foram ajuizadas em junho pelos partidos Psol, Cidadania e PSB. Eles argumentam que as emendas propostas pelo relator-geral da LOA, senador Marcio Bittar (MDB-AC), e sancionadas em parte por Bolsonaro, não atendem a critérios objetivos, favorecendo aliados do governo e violando o princípio da impessoalidade.
A liminar de Rosa Weber vale pelo menos até que o plenário da Corte julgue o mérito da ação, o que ainda não tem data para ocorrer.
Nela, a ministra diz que são incompatíveis com a Constituição e com a democracia “práticas institucionais que, estabelecidas à margem do direito e da lei, promovam segredo injustificado sobre os atos pertinentes à arrecadação de receitas, efetuação de despesas e destinação dos recursos públicos”.