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segunda-feira 13 de julho de 2020 às 06:23h

Pandemia acelera o enxugamento da Petrobras

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Estatal reduz funcionários e fecha escritórios. Mudanças afetam de fornecedores a restaurantes

 A pandemia do novo coronavírus acelerou conforme o jornal O Globo, a estratégia da Petrobras de concentrar esforços no pré-sal. A estatal, que já vinha vendendo subsidiárias, anunciou nos últimos três meses planos para reduzir em 34% o número de empregados (de 45.500 para 30 mil), de fechar nove prédios comerciais e deixar metade dos empregados da área administrativa em regime de home office, mesmo após o fim da pandemia.

A mudança segue modelo já adotado por outras grandes petroleiras mundiais nos últimos 20 anos, que buscaram concentrar suas atividades nos negócios mais rentáveis.

A nova estratégia provoca uma verdadeira reorganização no entorno da companhia, afetando desde a cadeia de fornecedores de equipamentos especializados até a rede de serviços, como restaurantes. Deve ampliar a concorrência e abrir caminho para novas oportunidades no setor privado para empresas fornecedoras.

Reabertura sem clientes

Para especialistas, o enxugamento da Petrobras é positivo e começou bem antes da pandemia, após a descoberta dos casos de corrupção revelados pela Operação Lava-Jato.

Na última década, a estatal perdeu mais de 20% do seu valor de mercado, que passou de R$ 380 bilhões para os atuais R$ 298 bilhões. Para os fornecedores, porém, será necessário rever a estratégia e buscar diversificar a atuação em novos segmentos e até procurar alternativas no exterior para continuar crescendo.

Para os prestadores de serviço, porém, a realidade é um pouco mais dura. O bairro da Cidade Nova, no Rio, já foi considerado uma mina de ouro pelos comerciantes. Tem agora ao menos 14 estabelecimentos fechados, afetados pela pandemia e pela perspectiva de um retorno mais modesto, com menos clientes, após o encolhimento da estatal e de outras empresas nos arredores. Ricardo Wandeveld reabriu a OHOS Café Carioca, na Cidade Nova, mas os clientes ainda não voltaram:

— Cinco anos atrás, a Cidade Nova virou a galinha dos ovos de ouro com a chegada da Universidade Petrobras, BR Distribuidora, ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) e do Comitê Olímpico. Mas as coisas começaram a andar para trás — afirmou Wandeveld, lembrando que a BR Distribuidora também fez um enxugamento no quadro de funcionários desde a sua privatização no ano passado.

Luciane Quintal Faria, da Curto Café Rosário, diz que, sem previsão de retorno de grandes empresas, o comércio vai continuar sofrendo:

— Não sabemos como será o futuro. Empresas como a Petrobras sinalizarem que podem adotar home office em definitivo e isso é ruim.

Por trás da mudança de cenário da cadeia de óleo e gás está a venda de ativos da Petrobras, cuja meta é se desfazer de até US$ 26,9 bilhões até 2023. Adyr Tourinho, presidente da Abespetro, que representa 85% dos contratos de bens e serviços em óleo e gás, lembra que foi criado um grupo de trabalho para buscar formas de diminuir o impacto da crise.

Mais concorrência

Ele cita a revitalização de campos menores, que pode ser uma saída de curto prazo para manter a atividade e a capacidade instalada da indústria de bens e serviços:

— Estamos discutindo possíveis soluções em conjunto para um ambiente de negócios mais favorável para o setor de exploração e produção. O momento tem sido complexo e exige esforços conjuntos para superarmos os desafios. Campos do pós-sal e campos marginais necessitam de baixo custo operacional para serem economicamente viáveis. Por isso, entendemos que empresas com estruturas menores tenham melhores condições.

A busca de novas oportunidades, no entanto, é afetada pela redução do preço do petróleo no mercado internacional em razão da pandemia. Estudo da consultoria Wood Mackenzie prevê redução nos investimentos entre 20% e 30% neste ano no Brasil no setor de petróleo. Só na área de exploração, Marcelo de Assis, chefe de pesquisa da América Latina da empresa, lembra que serão US$ 1 bilhão a menos em investimentos, com a redução de perfuração de 21 para 11 poços neste ano:

— A redução da atuação da Petrobras vai criar um ambiente desafiador para os fornecedores. Você tem ainda uma postergação dos projetos para o ano que vem.

Para Marcus D’Elia, sócio-diretor da Leggio Consultoria, o maior desafio para os fornecedores é ter condições de competir com empresas internacionais:

— Os ativos vendidos pela Petrobras vão continuar operando e continuarão demandando serviços e equipamentos. O maior desafio é a concorrência externa. As empresas que tiverem fôlego e capacidade para ao menos se igualar ao perfil das empresas internacionais vão sobreviver.

Marcio Félix, ex-secretário de Petróleo do Ministério de Minas e Energia e presidente da consultoria Energy Plataform (EnP), diz que a venda de ativos da estatal gera oportunidades de investimentos e de negócios para a cadeia de fornecedores. Ele cita os segmentos de refino e de gás. Este último, na esteira da expectativa da votação de um marco regulatório no Congresso:

— Estamos chegando em um novo ponto de equilíbrio. Aquele modelo de a Petrobras carregar todo o setor não existe mais.

Chance para investimento

O especialista e ex-diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) Décio Oddone avalia que é saudável a saída da Petrobras de vários setores, permitindo a entrada de investidores privados em áreas antes dominadas pela estatal. Segundo ele, a Petrobras não tinha condições de investir em todos os segmentos.

— A Petrobras escolheu investir no pré-sal, e corretamente começou a vender campos maduros, refinarias, ativos de gás para que outros possam investir e, com isso, ter uma indústria investindo no Brasil — afirmou Oddone, citando o campo terrestre de gás Azulão no Amazonas, descoberto há 20 anos pela Petrobras que, ao ser vendido há três anos à Eneva, está recebendo investimento de R$ 1,9 bilhão.

Roberto Furian Ardenghy, diretor de Relacionamento Institucional da Petrobras, afirma que a mudança de estratégia não significa enfraquecimento:

— Estamos fazendo uma gestão de portfólio. Ano passado, pagamos R$ 70 bilhões pelo excedente da cessão onerosa com Búzios e Itapu. Estamos investindo mais do que desinvestindo. Estamos mais focados em águas profundas. É natural que os fornecedores acabem sendo beneficiados a longo prazo. Vamos comprar equipamentos e embarcações em cima dos projetos.

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