Após quatro anos de preparativos, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN)dará início nesta segunda-feira (12) ao maior exercício aéreo da história da aliança militar: 250 aeronaves – 100 delas vindas dos Estados Unidos –, 10 mil soldados e 25 países participam da ação, que se estende até o dia 23 e tem a Alemanha como centro logístico.
A ação do Air Defender 23 simula uma resposta a um ataque a um dos países-membros da aliança. Por causa do treinamento, haverá bloqueios temporários para a aviação civil em três zonas do espaço aéreo alemão: no litoral norte e nas regiões leste e sudoeste do país. Esse deve ser um dos maiores desafios do exercício, já que essas áreas fazem parte das rotas mais usadas pela aviação civil em todo o mundo, e seu impacto sobre o setor ainda é incerto.
“Estamos mostrando que o território da Otan é a nossa linha vermelha, que estamos preparados para defender cada centímetro deste território”, afirmou o inspetor da Força Aérea alemã e mais alto piloto na hierarquia militar, o tenente-general Ingo Gerhartz, em evento à imprensa em Berlim nesta quarta (07/06). Gerhartz, contudo, frisou que a ação visa demonstrar uma postura “defensiva” em relação à Rússia.
Voos comerciais devem ser mantidos apesar de eventuais atrasos
O tenente-coronel disse esperar que voos comerciais não sejam cancelados, mas não descartou atrasos em pousos e decolagens.
Do lado empresarial, a mesma expectativa foi reforçada pela associação europeia de linhas aéreas “Airlines for Europe”. Além de não esperar cancelamentos, a entidade também minimizou o impacto de eventuais atrasos, mas não descartou maiores inconveniências para os passageiros.
Especialista em tráfego aéreo, Clemens Bollinger ressalta que, diferentemente do que acontece em outros países europeus, controladores aéreos civis e militares já trabalham juntos na Alemanha há 30 anos, justamente porque o tráfego no espaço aéreo alemão é tão intenso.
Segundo ele, enquanto na França é comum que militares interditem zonas inteiras para a aviação civil, o mesmo não ocorre na Alemanha. Mas ele frisa que a experiência e perícia dos técnicos, sozinha, não basta para garantir pontualidade – ainda mais num momento em que o tráfego aéreo no espaço europeu volta a patamares similares aos de antes da pandemia. “Há muitos fatores que podem desencadear atrasos, como temporais, outros eventos climáticos ou congestionamento [do espaço aéreo]”, afirma.
Exercício com manutenção do tráfego aéreo de rotina é sinal à Rússia
Ao optar por realizar o exercício militar paralelo ao tráfego aéreo regular de civis, a Otan envia um sinal político à Rússia, afirma Toben Arnold, da Instituto Alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança (SWP). “Obviamente é uma sinalização clara no sentido de demonstrar, mesmo com um espaço aéreo super frequentado, a prontidão e disposição de defender o território da aliança.”
Gerhartz, da Força Aérea alemã, explica que os exercícios incluem simulações também em terra, como a evacuação a partir de aeroportos – cenário, ao que tudo indica, incluído após as cenas de caos no aeroporto de Cabul com a tomada do Afeganistão pelo Talibã em 2021, após Estados Unidos e países aliados encerrarem suas operações no país.
Outros cenários simulam o apoio a tropas terrestres, batalhas aéreas e a neutralização de foguetes de médio alcance – para essa última missão, os militares americanos enviarão o bombardeiro furtivo F-35, mais moderno caça da Otan. No Mar do Norte também será treinada a defesa contra submarinos e navios, segundo Arnold.
Exercício aéreo da OTAN acontece durante contraofensiva ucraniana
Apesar de muitos associarem o exercício à invasão da Ucrânia pela Rússia, Gerhartz, da Força Aérea alemã, não fez nenhuma menção aos russos durante a apresentação da Air Defender 23 à imprensa em Berlim. A embaixadora dos Estados Unidos na Alemanha, Amy Gutmann, contudo, agiu diferente ao citar o presidente russo Vladimir Putin nominalmente: “Preparar-se e prevenir-se nunca foi tão importante como hoje”.
O exercício da OTAN pode ter efeitos colaterais nem tão indesejados assim: o de desafiar uma inteligência militar russa dividida entre estudar o treinamento e lidar com uma contraofensiva ucraniana cada vez mais intensa no sul e no leste do país.