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terça-feira 4 de fevereiro de 2025 às 08:14h

O ‘retrofit’ da Arábia Saudita para incluir mulheres na força de trabalho e diversificar economia

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As mulheres representam hoje cerca de 36% da força de trabalho da Arábia Saudita, de acordo com dados oficiais. Um percentual significativo se considerarmos que até 2018 não era permitido que dirigissem e só em 2019 que foram autorizadas a emitir passaporte e viajar sozinhas sem precisar da autorização de um “guardião”, geralmente o patriarca da família.

Há 10 anos, a força de trabalho feminina no país era de 17%. Segundo o governo, o crescimento do grupo é “um passo positivo, mas reconhecemos que há muito trabalho a ser feito”. Mas é um indicador dos esforços que o país tem feito para flexibilizar sua cultura – como quando foi autorizada a reabertura dos cinemas e os mais recentes investimentos no futebol – e em diversificar sua economia, hoje baseada majoritariamente no petróleo, sendo o país o maior exportador da commodity no mundo.

As iniciativas de abrandamento de rígidas regras sociais fazem parte de um plano chamado Visão 2030, em que a Arábia Saudita tem metas de reduzir sua dependência em petróleo e investir em projetos como transição energética e tentar amenizar sua imagem, deixando de ser associados a um país radical, fechado e com leis e uma monarquia muito baseada na religião para serem vistos como um governo – leia-se ‘reino’ – mais “leve e secular”.

No caminho para conquistar essa imagem, o país organizou e sediou em sua capital, Riade, a segunda edição do Global Labour Market Conference, uma conferência que reúne pesquisadores, economistas, empreendedores e autoridades institucionais e governamentais de mais de uma centena de países para debater ao longo de dois dias desta semana (29 e 30) os desafios do mercado de trabalho como desigualdade de gênero (sim), desemprego entre jovens e 50+, desenvolvimento de habilidades e, principalmente, o impacto da tecnologia nesse setor, principalmente da inteligência artificial.

Termos como desafios, oportunidades, desenvolvimento, transformação, aprendizado, competitividade, segurança social e até empoderamento foram citados pelo ministro do Capital Humano e do Desenvolvimento Social Saudita Ahmad bin Sulaiman AlRajhi em seu discurso de abertura.

Como parte do projeto Visão 2030, AlRajhi diz que o setor privado no país abriu mais de 700 mil novas vagas e capacitou mais de 83 mil jovens. O país tem 7,6 milhões de habitantes.

Abertura gradual

A diversificação da economia do país tem um de seus pilares o investimento na divulgação do país como um destino turístico. O plano é que o setor seja o segundo maior empregador até 2030. Em 2023 (consolidado anual mais recente), a Arábia Saudita recebeu quase 30 milhões de estrangeiros. Para efeitos de comparação, em 2024, o Brasil registrou um número recorde de turistas internacionais de 6,6 milhões.

Boa parte dos visitantes que a Arábia Saudita recebe é de peregrinos muçulmanos que, pelas premissas da religião, devem visitar a cidade de Meca pelo menos uma vez na vida. Por conta disso, além dos estrangeiros, o país tem grande turismo doméstico, totalizando 100 milhões de turistas no ano, recorde registrado em 2023, segundo a Organização Internacional do Turismo (WTO), ligada à ONU. A marca foi atingida sete anos antes do previsto.

Os números dão a dimensão do potencial de investimento que o país tem a fazer em infraestrutura e mão de obra. Pela capital, é possível ver muitas obras em andamento, exibindo nos tapumes os projetos, que vão de shoppings (que já são numerosos) a escritórios. Do alto do Bridge Tower, um edifício de 99 andares, e que abriga a mesquita mais alta do mundo, no 77º andar, é possível avistar também grandes terrenos com potencial construtivo.

A capital conta com um sistema de metrô com seis linhas que transportam cerca de 1,2 milhão de pessoas por dias. As estações são bastante limpas e modernas. É possível pagar direto na catraca usando aproximação do cartão ou da carteira digital, ou com o cartão de transporte local. O trecho de 7 estações percorridas pela reportagem custou 4 SAR (Saudi Arabia Rial, a moeda local) ou R$ 6. O valor vale por duas horas. Os vagões são divididos entre primeira classe (custam mais caro), família (mulheres e crianças) e homens.

Riade também tem largas e compridas avenidas que intimidam calçadas e pedestres e deixam fazem a conexão de uma cidade bastante espalhada e percursos que parecem sempre muito longos. Por elas, circulam carros desde a super SUVs a modelos mais populares, mas todos com muita poeira do deserto. Os prédios se revezam entre um maciço monotemático bege (cor de areia) e “ilhas” de edifícios envidraçados.

A paisagem desértica também abriga muitas marcas bem ocidentais. McDonald´s, Pizza Hut, Domino´s, H&M, Starbucks, Subway, Arby´s são bem comuns. A impressão é que são mais lojas Dunkin in Donuts que a média de outras cidades americanas, de tantas vistas por lá.

Outro resultado do movimento que o país tem feito para a flexibilização está na maior naturalidade dos sauditas em relação às mulheres, especialmente as não-muçulmanas. É possível ver as mulheres sauditas trabalhando em diferentes funções, seja caixa do supermercado, atendentes em estabelecimentos, jornalistas ou motoristas. Ainda que estejam trajando o nikab (ou niqab), vestimenta toda preta em que apenas os olhos não estão tapados.

Algumas usam apenas o hijab (véu que cobre os cabelos por cima) ou shayla (véu mais comprido, que cobre todo o cabelo, ombros e parte do torso, mas que ainda deixa o rosto todo a mostra). E também circulam muitas mulheres sem véu ou com roupas comuns, como calça e camisa.

Álcool proibido

Vale lembrar que a Arábia Saudita será a sede da Copa do Mundo de Futebol de 2034. Até lá – e talvez muito antes disso, o país já pode ter liberado o consumo de álcool pelo menos para turistas e não muçulmanos. Por enquanto, a posse e o consumo de álcool no país são proibidos, seguindo as regras do islamismo. Informação que o comandante do avião transmite no momento em que se entra no espaço aéreo saudita e repetida assim que pousa a aeronave.

Nos mercados é possível encontrar cervejas e vinho sem álcool, assim como nos restaurantes, que também servem “mocktails” (coquetéis sem álcool, geralmente com frutas e xaropes).

Mas um “vício” pareceu comum aos sauditas. O celular. Motoristas de Uber não se intimidam por estarem dirigindo e transportando passageiros e seguem falando, digitando ou até mesmo assistindo a vídeos. Segundo professor e pesquisador sobre cultura do Oriente Médio Robert Manning, a Arábia Saudita tem o maior consumo per capta do YouTube.

O cigarro também está bem presente. Ainda há fumódromos nos lugares, frequentados por homens. Ponto em comum dos carros de aplicativo era o cheiro de cigarro em todos eles.

Marca brasileira nas prateleiras

A gigante brasileira JBS é uma das grandes parceiras comerciais do país. A maior produtora de carnes do mundo inaugurou no final de 2024 uma planta no país que consumiu investimentos de US$ 50 milhões e quadruplicou a capacidade industrial da empresa por lá.

Segundo divulgado pela empresa na época da inauguração, a unidade produz empanados de frango e gerou 500 empregos na região. Antes da inauguração da nova fábrica, a JBS já operava uma unidade de processamento na cidade de Dammam, com cerca de 250 colaboradores e com capacidade anual de 10 mil toneladas. Além disso, a companhia mantém oito centros de distribuição no país.

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