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quarta-feira 1 de maio de 2024 às 15:03h

O que mudou em um mês de legalização da maconha na Alemanha

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Ainda não há venda liberada, e Justiça ainda precisa fazer triagem de processos criminais passíveis de anistia. Cresce interesse por cultivo doméstico, e prescrição médica está mais fácil.Passado um mês da legalização do uso recreativo da maconha para adultos na Alemanha, não dá pra dizer que muita coisa mudou no país. Não surgiram cafés especializados na venda de cannabis, nem hordas de turistas em busca do baseado liberado. Ao contrário do plano original do governo do chanceler federal Olaf Scholz, ainda não há lojas licenciadas nem qualquer outro meio para vender o produto de forma legal.

A nova lei diz que associações sem fins lucrativos serão as responsáveis pelo plantio e comércio de cannabis. Porém, os chamados clubes de cultivo, ou clubes sociais, só começam a atuar em julho. Qualquer pessoa – contanto que maior de 18 anos e residente na Alemanha – que quiser comprar maconha legalmente deverá ser membro de um clube. Mas não será permitido consumir dentro desses espaços.

Também é proibido fumar na rua das 7h às 20h, assim como nas cercanias de parquinhos, quadras de esporte, escolas e áreas militares.

Dar um pulo na vizinha Holanda, conhecida por ter uma postura mais permissiva em relação às drogas (apesar de não haver uma legalização oficial), e voltar com alguns gramas no bolso tampouco é uma opção legal, pois a importação para fins não medicinais é proibida. Portanto, se houve pessoas fumando nas ruas alemãs no primeiro mês da legalização, foi em grande parte devido ao mercado ilegal de fácil acesso e já existente.

O governo decidiu liberar o consumo e o plantio de maconha sob o argumento de que a antiga política de drogas atingiu o seu limite. Apesar da proibição da compra e posse, o consumo da droga triplicou nos últimos 30 anos, de acordo com dados do Centro Alemão para Questões de Dependência. O mercado ilegal está associado ainda a um risco maior para a saúde, já que não se sabe o teor de THC da maconha traficada ou se há aditivos tóxicos ou impurezas que não podem ser avaliados pelo consumidor, alega a entidade.

A nova lei define que todos os adultos poderão manter até 50 gramas de cannabis em casa e carregar até 25 gramas.

Nessa semana, o prefeito de Berlim criticou o fato de a posse e o consumo serem permitidos, mas a venda e compra não. “Isto significa que no período de 1º de abril a julho, o governo federal está deliberadamente a enviar consumidores de cannabis para estruturas criminosas.” Disse Kai Wegner à imprensa alemã.

Cultivo privado

Para além do que as ruas mostram, a maior transformação nesse período aconteceu no mercado de produtos para o plantio da cannabis. A nova lei autoriza a importação de sementes da União Europeia e o cultivo doméstico de três plantas por pessoa. Nesses casos, só é permitido colher para consumo próprio e não para repassar a terceiros, sob o risco de pena de até três anos de prisão.

Pululam na internet as buscas por métodos de plantio, secagem e processo de cura da maconha. Empresas e start-ups têm apostado alto em sistemas personalizados e prontos para o cultivo em casa. A suíça Mabewo, por exemplo, tem anunciado a venda de uma estufa que por fora tem cara de armário e por dentro conta com irrigação, iluminação LED e controle em tempo real que exige esforço e conhecimento mínimos de plantio.

A Seeds 24, empresa austríaca que vende sementes, a Growmark, com sede em Hamburgo, e outros fornecedores afirmam que há longas esperas pela entrega. A loja online Grow Guru comenta: “Todas as nossas lojas e fornecedores estão atualmente sobrecarregados de clientes”.

Dirk Rehahn, dono de duas lojas de cultivo na Alemanha, falou à DW que espera duplicar suas vendas neste ano e que os estoques dos sistemas domésticos de cultivo prontos para o uso estão esgotados. “As pessoas estão perdendo o medo de cultivar cannabis”, disse Rehahn.

Uso medicinal

A nova lei retirou a cannabis da lista de narcóticos. Dessa forma, está mais fácil para os médicos na Alemanha prescreverem flores secas de maconha ou extratos para seus pacientes.

Antes, era preciso uma receita médica especial para essa finalidade, cuja emissão era controlada pelo governo. A taxa adicional para esta prescrição de narcóticos também foi dispensada.

Como a cannabis ainda não está disponível nos clubes sociais, a única via disponível neste momento ainda é a do mercado ilegal ou sob a forma de medicação.

Clubes sociais

Plantar, compartilhar e cobrar o necessário para cobrir os custos de produção. É com essa premissa que os clubes de cultivo coletivos estão se estruturando na Alemanha.

Ainda não se sabe até que ponto empresas estrangeiras podem apoiar áreas de cultivo ou investidores podem ganhar dinheiro com clubes canábicos. A lei determina, em linhas gerais, que as associações de cultivo coletivo precisam ser organizações sem fins lucrativos com até 500 membros, e proíbe publicidade e patrocínio.

Apesar da regra, anúncios enormes de clubes sociais estampam outdoors e prédios em áreas movimentadas de cidades como Berlim, em busca de novos membros.

Os clubes de cultivo geralmente cobram uma mensalidade, de acordo com o perfil de consumo dos membros. Alguns estão planejando vender o grama por seis euros – em média

Segundo relatório da Whitney Economics, um serviço de análise focado na indústria da cannabis, serão necessários 50 mil quilos de erva para atender à demanda alemã no primeiro ano após a legalização, o que seria viabilizado por até 3.000 clubes sociais. Atualmente, há cerca de 200 dessas associações, estima a consultoria.

Especialistas acreditam que muitos ativistas e grupos de amigos inicialmente se reunirão para formar um clube social, mas desistirão rapidamente devido à complexidade da operação – e então possivelmente se tornarão os chamados produtores domésticos.

A lei é específica nas orientações de plantio e de venda. Detalha, por exemplo, quais fertilizantes os clubes podem usar e que informações precisam compartilhar com o consumidor: peso, data da colheita, prazo de validade, variedade, porcentagem de THC (tetra-hidrocanabinol) e CBD (canabidiol).

O governo terá acesso ao nome completo dos associados, quanto e quando compraram, além do teor médio de THC consumido. Cada clube deverá ter um membro dedicado à prevenção ao abuso de maconha.

Triagem de casos para anistia

A lei em vigor perdoa as penas de prisão ou multas já impostas por condutas que agora deixaram de ser crime. No entanto, o efeito da medida ainda não foi sentido e vai exigir um esforço adicional nos próximos meses dos tribunais e procuradores.

Haverá o trabalho de filtrar manualmente, da montanha de aproximadamente 100 mil processos criminais contra consumidores de maconha, aqueles que já não são puníveis à luz dos novos regulamentos e aqueles que ainda são.

O ministro da Justiça, Marco Buschmann, afirmou à imprensa alemã que a mudança resultante da lei “significa um aumento pontual na carga de trabalho, mas a longo prazo o peso sobre a polícia e o judiciário será aliviado”, criando espaço para resolver crimes mais relevantes.

Segundo Buschmann, a regra antiga colocou um fardo sobre a polícia, o Ministério Público e o poder Judiciário, que no fim das contas não impediu o consumo. “Em vez disso, os consumidores foram levados para as mãos de traficantes com produtos de qualidade inferior e drogas pesadas.”

Cautela

Há muitas críticas ao plano do governo federal em vários estados, por parte de médicos, advogados e policiais. Estados como a Baviera já impuseram limites para o consumo – nesse caso específico, está proibido consumir maconha em festivais folclóricos e cervejarias.

Entre as críticas, está o fato de que os regulamentos são muito complexos e pouco práticos para a polícia. Não está claro, por exemplo, como os clubes sociais devem ser controlados ou como os usuários serão tratados em caso de infrações de trânsito.

O Centro Alemão para Questões de Dependência tem reforçado a importância de financiar medidas de aconselhamento sobre dependência no contexto da nova lei. A cannabis pode prejudicar o desempenho cerebral, sobretudo a uma idade precoce, com riscos psicossociais e de aprendizado, sublinhou a entidade.

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