Os dados de violência mais recentes divulgados nesta quinta-feira (20) pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram conforme Marco Antônio Carvalho, do Estadão, que o Brasil perdeu 551.455 pessoas para a violência letal ao longo dos últimos dez anos. Nesse período, o País passou por momentos de maior e menor intensificação da violência, sem nunca deixar de vê-la em um patamar considerado elevado na comparação internacional.
O histórico dos últimos dez anos mostra um sobe-e-desce nos registros de homicídios ligado a eventos marcantes, com a guerra entre diferentes organizações criminosas que se espalhou pelo Brasil e fez o indicador de 2017 ser o maior já visto na história do País, por exemplo.
O momento atual, apontam os especialistas, é de estabilização entre os principais atores ligados ao elevado volume de assassinatos: as facções. Esse cenário de queda nos registros é considerado pelo Fórum como positivo. No entanto, ainda há problemas a serem destacados, “sob o risco de a sociedade brasileira ser induzida a acreditar na ideia de que o País resolveu seu dilema civilizatório e agora é uma nação mais segura”. “Estamos longe disso”, destacam Samira Bueno e Renato Sérgio de Lima, diretores da entidade.
A seguir, entenda os acontecimentos ligados às variações em cada período da última década:
2011 a 2014 – Conflito locais se acentuam
Em 2011, o País registrava 47 mil homicídios, patamar similar ao visto em 2022. O que os Estados brasileiros viram nos anos seguintes foram altas consecutivas nos indicadores. Em 2012, os registros já indicavam 54,6 mil homicídios, patamar que chegaria a 59,7 mil em 2014. Especialistas apontam um acirramento entre integrantes dos mercados ilegais, principalmente relacionados ao tráfico de drogas. As disputas se organizavam cada vez mais em torno de facções, além de grupos e gangues locais.
Neste período, as mortes violentas na Região Norte saltaram de 3,3 mil para 6,2 mil. Eram os primeiros indicativos do acirramento da violência na região, que chegaria a níveis ainda mais críticos nos anos seguintes. No Pará, os assassinatos anuais saltaram de 1,2 mil para 3,6 mil. No Nordeste, os homicídios passaram de 19 mil para 23,5 mil entre 2011 e 2014. No Ceará, os casos passaram de 2,7 mil para 4,4 mil.
2015 a 2018 – Guerra de facções toma o País
O ano de 2015 apresenta a última redução nos homicídios antes de um período em que esse tipo de crime iria se intensificar. “A partir de 2015 iniciam-se uma série de reações, ainda locais, para frear a expansão do PCC em território nacional, mas a execução do traficante Jorge Rafaat, atuante na fronteira entre Brasil e Paraguai, foi o ponto de virada que escalonou o conflito”, destacam os diretores do Fórum.
Em 2016, o patamar chega a 61 mil e, no ano seguinte, a 64 mil vítimas, recorde da série histórica. Na Região Norte, os registros chegam a 7,8 mil, enquanto no Nordeste os registros alcançam a casa dos 27,2 mil casos. Foram nessas duas regiões onde a guerra de facções se fez mais presente.
No primeiro dia de 2017, uma rebelião em um presídio de Manaus deixou 56 detentos mortos. O grupo foi executado por membros da Família do Norte, facção local então associada ao Comando Vermelho. As vítimas eram presos ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC).
Esse seria um dos grandes capítulos públicos da guerra que se acentuaria ao longo daquele ano. Rebeliões em Boa Vista e Natal no mesmo mês confirmaram a intensidade e a dimensão nacional do conflito, que seguiria ocorrendo em 2018, embora com menos força.
É a partir de 2018 que o governo federal tenta um movimento de maior protagonismo na gestão da segurança pública. É o ano da intervenção federal na segurança do Rio e também da reforma do Fundo Nacional de Segurança Pública, que tentaria garantir recursos mais volumosos para aplicação dos Estados em políticas estruturadas.
2019 a 2022 – Quedas e uma alta (pandêmica)
O que se viu nos Estados brasileiros a partir de 2019 foi uma queda no indicador de assassinatos. Naquele ano, o nível ficou em 47,7 mil, o primeiro abaixo de 50 mil em sete anos. No Nordeste, que tinha visto os registros chegarem a 27 mil vítimas em anos anteriores, o patamar ficou em 18,1 mil. Só no Ceará, os homicídios caíram de 4,7 mil para 2,3 mil em um ano.
Os crimes caíram em todas as regiões, no que foi encarado como uma acomodação de forças entre as facções, que teriam cessado as disputas mais intensas. Outros especialistas apontam ainda a contribuição de políticas estaduais de segurança e outras políticas locais. Em 2019, o governo federal sob Jair Bolsonaro começava a facilitar o acesso de civis a armas de fogo, medida alvo de críticas e ações judiciais.
Naquele ano, o Fórum destacou a necessidade de se estabelecer uma queda continuada dos indicadores, que poderiam voltar a crescer se medidas mais sustentadas não fossem tomadas. Em 2020, primeiro ano da pandemia, os assassinatos voltaram a crescer para a casa dos 50 mil, principalmente em razão de um novo movimento de recrudescimento da violência no Nordeste. O Ceará viu os homicídios saltarem novamente para a casa dos 4 mil registros, simbolizando o movimento pendular da violência local.
Em 2021 e 2022, o que se viu foi uma tendência mais consolidada de redução de crimes dessa natureza. A Região Sudeste chegou, no ano passado, a 11,9 mil assassinatos, o menor patamar de toda a série histórica iniciada em 2011. Quem destoou do padrão foi a Região Sul, que viu os registros subirem em 2022, mas ainda se manteve como a segunda região com menos crimes, atrás do Centro-Oeste.
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